Capítulo (7)

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A sexta-feira chegou.

Faltam apenas dez dias.

A situação não poderia estar pior. Selina pegou o marido me olhando de uma forma nada legal, e ao invés de ficar brava com ele, está no meu pé. Tenho que fazer tudo impecavelmente, ou serei demitida.

Hoje é dia de entrega de mantimentos. Eu odeio isso. Os caras que trazem esses mantimentos, acabam almoçando por aqui, e são criaturas grosseiras e asquerosas.

O restaurante estava mais movimentado do que nunca. Minhas pernas latejavam de tanto andar de um lado para o outro.

- Ei boneca, trás mais vinho para nós. - Um dos entregadores pediu. Eles são entregadores, não deveriam estar bebendo.

Os olhares dos homens ao redor da mesa percorriam meu corpo. Isso me dava muita raiva e nojo, mas eu não podia fazer nada.

Respirei fundo e fiz sinal de positivo. Fui em direção a cozinha, mas minhas pernas empacaram no meio do caminho.

Miguel estava entrando no restaurante... tão lindo com os cabelos molhados, um terno que evidenciava seu porte e o corpo escultural que deixa todas as mulheres do recinto o olhando com cara de bobas - inclusive eu.
Mas do seu lado direito uma mulher loira me chamou a atenção. Ela estava segurando o braço dele com bastante intimidade. A odiei por isso.

Será que ela não teme ser a próxima vítima?

Eles passaram por mim e Miguel lançou apenas um olhar sem emoção para onde eu estava.

Balancei a cabeça e segui para a cozinha. Deixei alguns pedidos e providenciei o vinho para aquelas criaturas.

- O vinho que pediram. - Disse colocando encima da mesa a garrafa. Cortesia de Selina. Ela deveria estar adorando me ver tão sem graça, e desrespeitada.

- Obrigado delicinha!

Ignorei o comentário e fui para a mesa ao lado onde Miguel fitava os entregadores com cara de poucos amigos.

- Boa tarde. O que desejam? - Procurei não encará-los no rosto.

- Apenas uma salada para nós dois Isabela. E o vinho que tomei da última vez. - Disse Miguel.

Ele me irritava por ser um homem sem coração, mas um lado meu ficava encantada por ele, por seus olhos azuis escuros, quase negros.

O almoço continuou e os apelidos e brincadeiras idiotas daqueles homens estavam me tirando do sério.

- Quero você como sobremesa. - Um dos homens segurou meu braço. Eu puxei, mas ele apertava meu pulso com muita força. Do nada uma cadeira foi bruscamente arrastada e Miguel apareceu ao meu lado.

- Sugiro que largue ela agora. - Disse entre os dentes.

Sua expressão era ameaçadora.

- Eu não pedi suas sugestões granfina. Sei que Bela é uma delícia, mas vimos ela primeiro. - O homem de cabelos já brancos disse.

Em uma velocidade impressionante Miguel o atacou. Os outros homens  levantaram-se  juntando a briga. Dava para ver a fúria nos socos de Miguel.

Me apavorei com a situação.

Todos olhavam a cena boquiabertos, mas não faziam nada para ajudar.
Era uma covardia três contra um.

Em um momento de coragem - ou burrice. Peguei a bandeja e bati na cabeça de um deles, mas diferente dos filmes, o cara não desmaiou e ainda por cima se virou vindo em minha direção, e então usei o golpe que meu pai chama de "deixar os homens aos seus pés" . Ou seja, chutei com toda força entre as pernas dele.

Alguns funcionários enfim chegaram e terminaram a confusão.

Os cabelos de Miguel estavam bagunçados e o canto de sua boca sangrava levemente, diferente do cara que me segurou que estava com o rosto todo ensanguentado.

- Miguel, o quê deu em você para brigar por conta de uma garçonetezinha? - A loira perguntou indignada.

- Ex- garçonete. Está demitida Bela. - A voz de Selina ecoou em meus ouvidos.

Fechei os olhos com força, absorvendo a dor que aquelas palavras causaram.
Ah não, demitida não.

- Demitida? Posso saber o porquê? Aqueles homens estavam a desrespeitando e vocês não fizeram absolutamente nada para ajudá-la. E fui eu quem arranjou a confusão.

Porque Miguel está tão bonzinho e me defendendo?

- Essa foi só a última gota d'água. Já estava querendo a demitir a muito tempo. Não irei mudar de opinião. Agora pegue suas coisas e vá embora. - Selina apontou para a rua.

- Eu preciso desse emprego Selina....- comecei a dizer.

- Rua! - Gritou me cortando.

Ignorei os olhares e peguei minhas coisas.

Não me despedi de ninguém. Só queria sair daquele lugar.

Estava com muita raiva, triste, desolada. As lágrimas tomavam conta de meu rosto. Tudo isso é culpa do idiota do Miguel.
Chutei uma latinha que estava na rua, na tentativa de amenizar minha raiva.

Avistei um ponto de ônibus vazio e me sentei lá. Precisava me acalmar antes de chegar em casa. Coloquei os pés encima do banco, abracei minhas pernas e afundei minha cabeça nos braços.

O que será da minha família agora?

- Isabela?

Eu sabia muito bem quem era, e isso me irritou mais.

- Isabela olhe para mim. - Ordenou impaciente.

E como uma idiota o obedeci.

- O que você quer? Já não bastava estar querendo tomar minha casa, agora você me fez perder o emprego. O que vai fazer agora? Me matar? - Falei com toda raiva existente em mim.
Fiquei de pé e o encarei.

- Você é uma má agradecida. Eu apenas fui te defender e ainda me trata assim. - Me olhou tão raivoso, que me senti ainda menor do que já estava me sentindo em comparo com sua estatura.

Sei que ele me defendeu, mas isso não apaga o fato de que ele poderia aumentar um pouco o prazo de nossa dívida e não fez isso por pura maldade.

- Quer que eu agradeça? Tá bom. Obrigada por me defender e me ajudar a perder o emprego.

- Você consegue me tirar do sério.

Me sentei novamente e comecei a enxugar os olhos. Ficar chorando não vai resolver meus problemas. E como assim eu tiro ele do sério? Ele é que me tira do sério.

- Você Isabela é uma garota insuportável, irritante e má agradecida. - Começou a andar de uma lado para o outro na calçada passando a mão por seus cabelos negros. Seus insultos me irritaram e me deixaram muito magoada. Nunca ninguém falou assim comigo.

Não tenho forças para devolver os insultos, até porque tenho uma lista bem grande de coisas que deveria falar para ele, e não quero passar o resto do dia aqui. Levantei do banco, o ignorando.

- Posso saber onde vai? - Perguntou de forma autoritária.

- Vou para casa, aproveitar que você ainda não me tirou ela, como fez com o meu emprego...

Ele não retrucou. E nem sei como ficou sua expressão assim que terminei de falar, pois não me dei o trabalho de virar para olhá-lo.

Bela e  FeraWhere stories live. Discover now