Part. 13

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Três dias depois...

Já eram onze da noite, eu e Letícia combinamos de descer para a parte abandonada do hospício à meia noite, o pessoal normalmente ia dormir umas dez e meia, mas às vezes os enfermeiros e os seguranças caminhavam, então meia noite era mais seguro para nós descermos, as probabilidades de encontrar alguém neste horário era bem menores. Peguei um casaco e comecei a ler, esperando Letícia bater à minha porta.

Meia-noite e quinze

Letícia abriu a porta do meu quarto e então bateu nela.

- Vamos? - disse Letícia

- Eu podia estar pelado, sabia?

- Ah, sim, porque faz todo sentido você me esperar pelado...

Reagi com um riso quando ouvi aquilo, me levantei e saí do quarto com ela, assim como eu tinha feito com Pedro, eu e Letícia descemos fazendo o mínimo de barulho possível. Quando entramos no porão, eu e Letícia começamos a conversar baixinho.

- Diego, você sabe o que aconteceu com o Pedro? Desde que ele saiu da solitária, ele está com um jeito diferente.

- É, eu também percebi isso e toda vez que ele vê aquele enfermeiro ele fica com medo e aquele enfermeiro quando olha pro Pedro, dá um sorriso malicioso. Me dá nojo.

- Será que o Pedro...

- Não.- disse interrompendo-a.- Não, ele disse que não, também tenho minhas dúvidas, na verdade, mas ele disse que não, disse que quando estava na solitária ele ficou lembrando de uma amiga que morreu de câncer.

- Entendi... Por que não tenta colocar ele contra a parede e te contar?

- Porque eu não quero ficar lembrando ele e quero que ele confie em mim.

Disse e então entramos na parte abandonada. Letícia sorriu quando viu o quarto e começou a explorar o quarto.

- Eu não imaginei que isso fosse tão magnifíco quando você me falou. Isso daqui é lindo.

- Achei que eu fosse o único que achasse coisas desse tipo bonita.

- Não... Eu amo essas coisas, lugares assim são lindos, envelhecendo com o tempo, mostrando a realidade, sempre tem alguma coisa bonita por trás da morte... É como uma poesia.

- Você achou alguma coisa bonita por trás da morte do teu filho? - Letícia respirou fundo quando ouviu a pergunta e olhou pra mim com um pouco de raiva, depois sorriu.

- Meu filho se suicidou porque essa sociedade de merda não aceita nenhum tipo de diferença. Porque ele sofria por ser negro, mas o lado bonito na morte dele, é que ele finalmente está em paz, não está mais sofrendo. Se ele estivesse vivo, talvez estivesse apanhando na escola...

Eu assenti, não sabia o que dizer sobre aquilo, nunca perdi ninguém importante pra mim.

- Como se sentiu quando matou sua mãe, Pedro?

Ela perguntou enquanto saíamos dele quarto e íamos para o outro, onde eu encontrei o caderno.

- Aliviado, por quê?

- Curiosidade... Ela era muito rude com você?

- No início não, depois ela começou a gritar comigo e me bater...

- Por isso se sentiu aliviado?

- Sim... Mas também a matei por ciúmes, eu gostava do meu pai de um modo fora do normal.

- Ah, é. Você dava pra ele né? - eu ri com aquilo e respondi que sim.

Letícia passou a mão por cima da frase "você só está aqui, porque o mundo te rejeita" e abaixou a cabeça. Eu fiquei apenas observado, olhei para o lado e vi que a frase"se você não quer morrer saia logo daqui", não estava mais ali.

- Letícia, vamos ver os outros lugares?

- Você lembra quais eram os lugares?

- Sim. A solitária e a sala de tratamento de choque. Isso se você não quiser ver os quartos.

- Vamos indo e o que me atrair a gente vê.

- Tudo bem.

Fomos andando, entramos num quarto que não tinha porta, tinha roupas jogadas no chão, os corpos já não estavam ali, devem ter levado os corpos antes de fecharem o sanatório.

O quarto fedia, aliás, toda essa parte abandonada fedia, mas o cheiro aqui ainda mais forte, Letícia começou a procurar por mais coisas, mexendo nas gavetas, eu fiquei observando ela. Então ela achou um canivete enferrujado, ela me olhou e sorriu, guardou no bolso o canivete e continuou procurando por mais coisas, mas não achou nada, então saímos de lá. Eu a perguntei porque ela tinha pego o canivete e ela disse que era pro caso dela precisar, que ela guardaria com ela pro caso de tentarem estuprar ela de novo, não entramos em mais nenhum quarto, encontramos a solitária, a chave ainda estava lá, Letícia abriu a porta e o cheiro que saiu de dentro era mais forte do que o cheiro do quarto anterior, a solitária estava toda preta por conta do fogo, ainda tinham ossos ali, então imaginei que não devem ter investigado o caso, até porque se investigassem, eu não teria pego o caderno. Mas o que poderia ter acontecido com os outros corpos? Talvez o antigo proprietário não comentou sobre o caso com ninguém e enterrou os outros corpos, mas pelo cheiro ser muito forte, deixou os corpos na solitária e depois fechou o sanatório, isto era a única coisa que eu conseguia imaginar, Letícia fechou logo a porta e nós fomos a procura da sala de tratamento de choque, não demoramos para encontrar ela. Nós entramos na sala, por incrível que pareça, o corpo do Dr. Wood continuava em cima da mesa. Letícia tocou o corpo, eu não entendi o porque de ela estar mais estranha que eu, ela queria tocar nos corpos, encontrar mais coisas e eu, que gosto de matar pessoas, queria ficar longe daquilo. Talvez fosse algo psicológico, ou talvez eu estivesse com Pedro preso no meu subconsciente ou Letícia é mais louca que eu e eu não sabia disso. Que seja. O corpo do Dr. Wood estava podre e mofado, Letícia saiu de perto quando ouviu um barulho ao tocar na agulha que tinha nos olhos do doutor. Saímos de lá e voltamos para os nossos quartos, quando entrei no meu quarto, Pedro estava deitado na minha cama, guardei o caderno que eu havia achado no dia anterior, tirei minha calça e deitei ao lado de Pedro que já estava dormindo.


SanatoriumWhere stories live. Discover now