Te esquecer

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Via a lua, as estrelas e o sair do sol.

Os astros continuam seu curso sem interrupções, mais uma vez me dou conta de que tudo continua igual... Menos eu. Mas isso não importa para ninguém, e como o sol sai a cada dia eu devo continuar com a rotina que uma vez me protegeu.

Eu o perdoei, então irei esquecê-lo. Porque perdoar é deixar para trás o que o transtorna. O que faz mal...

Apesar das frases banais que minha mãe usou para deixar a mostra sua preocupação por mim, eu decidi que voltaria para a livraria. Estava ansioso demais e entediado ao mesmo tempo naquele quarto. Minha entrada no mundo da pintura estava cada minuto mais perto, me fazendo estremecer de ansiedade, mas preso entre quatro paredes pintadas de azul marinho.

Elizabeth se comunicava comigo constantemente, e me visitava sempre que podia. Acertávamos detalhes para a exposição e sorria ao ver meu nervosismo. Mas, como reagir perante o cumprimento de um sonho que deveria ser impossível?

Quando finalmente cheguei ao estabelecimento a dor de cabeça parecia mais intensa, mas não pensava em dar o braço a torcer a Anne para que, aparecendo detrás da porta, me dissesse com um sorriso zombeteiro "eu te disse", então, como o bravo que não sou, continuei a abrir a livraria aguentando as pontadas de dor que sentia em minha cabeça.

Comecei limpando estantes e reacomodando livros em ordem alfabética. O lugar estava limpo, dentro do possível, então quando peguei a vassoura, foi uma tarefa fácil varrer o pouco de pó acumulado.

Em pouco tempo dei vida ao letreiro, indicando o estado do local como aberto, e comecei minha adorável rotina. Detrás do balcão vi as pessoas passarem através da grande janela e esperando algum cliente que ainda acreditasse no poder dos livros.

Pouco a pouco corpos com rostos desconhecido entraram na livraria. Os olhava bisbilhotas através das estantes, e lentamente os martelos golpeando minha cabeça iam se afastando.

O que em continuação aconteceu foi em câmera lenta. Ou ao menos assim eu senti quando lhe vi atravessar a porta. Usava jeans azuis desgastados e rasgados no joelho. Uma jaqueta preta com um desenho vermelho no peito. O cabelo perfeitamente bagunçado e nos olhos azulados uma tristeza que julguei ser verdadeira.

Seus lábios estavam tensos, formando uma perfeita linha reta, e suas mãos estavam escondidas dentro dos bolsos da calça. Para trás ficou o orgulho e em seu lugar entrou pela porta, fazendo soar a irritante campainha, um homem decaído e miserável.

Talvez ver meu desgastado calçado o deteve. Seu corpo estava próximo. Tão próximo que o meu permanecia imóvel tentando conter a respiração.

Durante minutos nossos olhos mantiveram batalhas silenciosas, ganhando aquele que tivesse o olhar mais patético. Aquele que se rendesse primeiro, que negava a vista aos seus irmãos melancólicos, seria o perdedor.

E eu voltei a perder.

Não podia olhar o brilho se apagar a cada segundo. Os redondos olhos estavam rodeados por uma grossa capa de cor violeta, e a pele mais branca que o de costume. Por que não fala? Por que não falo?

De que adiantariam agora as palavras?

O silencio era melhor para nós. Melhor para mim. Fora do alcance de palavras que ferem ou frases mentirosas que só acolhem a esperança. Tinha fé de não voltar a vê-lo, jamais. Ao enfrenta-lo voltava o covarde e patético Harry de sempre. E não quero ser o estúpido que acredita.

Mas ele está em frente a mim. É ele, o homem, o locutor, e o possuidor do nome que me dá calafrios.

— O que você quer?

F R A G I L E » larryOnde as histórias ganham vida. Descobre agora