29. Reticências

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Duas coisas não faziam sentido na minha cabeça. Uma era o fato de aquele serzinho estar falando com o meu Ian. A outra era por que eu já não tinha ido lá e dado uma facada nela.

Em um momento da conversa, a idiota da Mel se empolgou demais e, por motivos suicidas, colocou a mão no peito dele. No entanto, não precisei voar no pescoço dela, pois no mesmo instante em que pôs a mão lá, Ian só fez segurar o pulso dela com dois dedos e jogar de volta como se fosse algo contagiante.

Ela perdeu a graça e saiu rebolando. Ian me viu quando eu já estava perto. Ele fechou o armário e se encostou nele, me olhando com aquele ar seguro que só ele tinha. Ele sabia que era lindo.

— Fica empinando esse nariz, depois que levar uma queda não vai querer que eu dê risada — disse ele, me acompanhando.

— E você fica de conversinha com piranhas de marca maior, depois que morre vai chorar.

Chegando ao cruzamento de corredores, Ian segurou o meu braço e falou perto do meu ouvido:

— Cuidado.

— Cuidado com o qu...

Meu corpo foi puxado para o outro corredor e pressionado contra a parede. Senti as mãos de Ian em minha cintura. Ele se inclinou na minha direção e...

— Jake, acorda! Levanta a cabeça. Ai meu Deus, Jake! JAKE FALA COMIGO! VOCÊ ESTÁ VIVA?!

Pulei na cadeira, sobressaltada.

Não demorei a perceber que estava sonhando. Só fiquei em dúvida se o sonho foi a parte de Ian ou a parte em que DÉBORA GRITOU NO MEU OUVIDO E ME DEIXOU SURDA.

— Pra que essa gritaria? — perguntei irritada.

— Vim buscar você para almoçar! Estamos te esperando faz um tempão!

Abaixei a cabeça nos braços novamente a fim de continuar dormindo. Não para voltar para aquele sonho com Ian, óbvio que não, mas porque estava morrendo de sono.

Não consegui dormir direito, na casa dos meus avós havia muitos pernilongos. Além do mais, toda vez que pegava no sono, Ian atormentava os meus sonhos.

Ontem, no momento em que ele deliberadamente disse que era "louco por mim", fiquei paralisada como uma estátua sem saber o que falar.

— Senhorita Dallas! — Aí o segurança apareceu.

A voz grave me arrancou do modo estátua. Saí correndo e Ian me acompanhou.

O segurança me gritava lá atrás, minha cabeça a mil. Entrei na escola pela escada da frente feito uma barata tonta, não tinha ideia do que estava fazendo. Felizmente — ou infelizmente — Ian estava comigo e tomou o controle da situação.

— Aqui — me puxou para dentro da biblioteca.

Havia algumas pessoas sentadas nas mesas e uma funcionária focada demais no computador para reparar em nós. Mesmo assim, diminuímos os passos para não parecermos suspeitos. Ian estava segurando meu pulso então não pude fazer outra coisa além de segui-lo pelas prateleiras de livros.

Ele me arrastou até o corredor da letra Z, o último. À esquerda havia uma plaquinha na porta com letras em glitter azul escrito: "Clube de Leitura".

Até onde eu sabia, as reuniões do clube aconteciam nas sextas depois da aula. Quem é doido de ficar depois da aula em uma sexta-feira? Que fossem ler seus livros em casa. Ou discutir a leitura em um café. Gente sem criatividade.

Entramos sorrateiramente e logo vi como a sala era pequena. Havia vários pufes vermelhos em formato de saco de lixo dispostos em círculo sobre a chão de tatames coloridos.

Em posição de oposiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora