O efeito do vinho

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ISABELLE ORSINI

Dimitri Petrovis sempre tinha o efeito de me deixar entorpecida e insegura sobre minhas próprias reações a ele. Ele conseguia ser o tipo de homem que me deixava insegura e ao mesmo tempo sabia estar protegida. Eu deveria odiá-lo. Odiar o seu nome, a sua família e a sua origem, mas por mais que tentasse, conseguia enxergar apenas o delegado que parecia querer me proteger de todos.

O que estava acontecendo comigo?

Eu realmente não sabia.

Ajudá-lo a comprar um colchão foi algo que acabei fazendo por impulso, talvez gratidão e agradecimento por ele ter cedido a sua cama para mim. Entretanto, assim que saímos da loja senti que fui longe demais. Dimitri guardava a nota fiscal após conferi-la pela quarta vez depois de entrar no carro e percebi uma estranha realidade. O herdeiro dos Petrovis parecia preocupado demais com dinheiro para alguém cuja família era milionária.

— Posso lhe perguntar algo? – Perguntei com a voz baixa ao colocar o cinto de segurança. O escutei concordar despreocupadamente – Como é a sua relação com sua família? – Dimitri demorou um pouco mais do que eu esperava para responder. Ele poderia estar ponderando sobre o que responder, formas de falar ao ponto de me manter ao seu lado ou simplesmente temia a minha reação, como eu temia a dele quando descobrisse a minha verdade. Quando ele descobrisse o quão impura eu era.

— Não somos próximos. Eles suportam a minha existência por eu ser o único filho deles – Revelou sem possuir tristeza. Ele poderia estar mentindo ou acostumado a ser tratado daquela forma ao ponto de ter se tornado natural. Não poderia saber a verdade, já que ele parecia indecifrável. – Na vila, imagino que tenha sido solitário. A minha vida foi um pouco pior que a sua. Não podia sair de casa sem permissão, conversar com outras pessoas, a maior parte dos meus estudos foi na minha casa. Meus pais temiam que eu contasse para alguém sobre essa religião doentia. Pode não parecer, mas os homens quando crianças também são castigados – Vi o seu sorriso entristecido enfeitar a sua face como se recordasse de momentos desagradáveis – Temos que ser perfeitos, Isabelle, e eles não se importam com o preço a pagar por isso.

— Não entendo – Murmurei realmente confusa – Escutava o meu avô falar sobre como era abençoado nascer homem. Como Deus abençoava os homens e amaldiçoava as mulheres. Nosso único meio de ser amadas por Deus seria servindo aos nossos maridos – Repeti o que tanto escutara nas poucas visitas que tive do meu avô, o ancião da religião. Nas poucas vezes que ele ia, escutava sobre como as mulheres deveriam ser submissas e inferiores aos homens. Sobre como Deus nos odiava e nos punia. Tudo era realmente deturpado.

— Ele pregava o que lhe era conveniente – Deu de ombros ao ligar o carro – Apanhei muitas vezes, algumas eram mais dolorosas do que deveriam ser. Apanhar não deve ter sido nada do que crescer escutando que deveria se submeter as vontades de alguém que não conhecia.

Não poderia falar nada. Apanhar era doloroso. Eu sabia disso, mas não poderia falar para ele. Falar sobre as marcas e sobre a dor.

Não queria que ele me olhasse com desprezo.

— Está tudo bem? – O escutei perguntar hesitante. Ele parecia ter medo de mim. Sorri sem graça ao concordar. – O que acha de comer em algum lugar?

— Não me importo – Falei tentando soar despreocupada quando sentia a felicidade me corroer. Fugir durante anos conseguia deixar a pessoa presa a hábitos e rotinas e uma delas havia sido nunca comer em um lugar aberto e cheio, pois a possibilidade de aparecer alguém seria maior. – Para que tipo de lugar vamos?

— Gosto de pizza. O que gosta de comer?

Miojo, algo alcoolico forte para esquecer tudo o que passei na minha fuga e talvez uma salada.

Império [Degustação]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora