18

2.5K 430 21
                                    

Estávamos em Sazar, na parte perto da fronteira com Vanalius.

Eu corri, com os dois em meu encalço, e sentia cada vez mais e mais como se pudesse ver e tocar a linha imaginária que me ligava àquele desconhecido.

O fogo em minhas veias pareceu queimar, como se chamasse pelo próximo elemento. Vi que a ponta dos meus dedos ficava escura, com veias alaranjadas.

Corri mais rápido, colocando toda a minha resistência física naquele esforço e ouvi Collen e Heyden ficando para trás.

A floresta se abriu e revelou o topo do monte em que estávamos. A descida não era tão grande mas eu sabia que era perigoso escorregar dali. Lá embaixo, havia uma pequena vila.

Que estava cercada por um ciclone.

O vento ameaçava levar os telhados e as árvores em seu caminho. Eu conseguia ouvir as pessoas gritarem.

Forcei os olhos e o vi. Um pontinho no meio de tudo aquilo, que parecia inabalável em pleno caos.

Eu sabia que demoraria demais usando o caminho convencional e calculei minhas chances. Não eram exatamente boas mas eu tinha que arriscar.

"Heyden! Me dê sua faca. "Eu gritei ao vê-los se aproximar.

Ele a jogou para mim, que caiu a um metro dos meus pés. Arranquei-a do chão e tomei um fôlego profundo.

Então me joguei da beirada, virando no tempo certo e cravando a espada e a faca no corpo do monte.

Apoiando os pés nas saliências, desci rapidamente pela parede. Quanto mais me aproximava, mais vento eu sentia.

Então meus pés tocaram o chão e eu guardei as armas no cinto.

Corri como louca pelas casas e o vento me castigava. Sabia das pessoas assustadas ao redor mas eu tinha que parar o ciclone.

Aqueci o ar a minha volta, que facilitou meu caminho.

Eu o sentia, sentia sua proximidade.

Tive que cobrir o rosto e tatear às cegas, seguindo apenas a intuição. Então senti tecido sob minha mão e fechei o punho.

Olhei para cima e vi o desespero em seus olhos. Ele não fazia ideia do que estava fazendo e estava apavorado.

"Pare. Você consegue parar. Eu sei que consegue. " Eu gritei para ele.

Ele fechou os olhos. Seu rosto estava meio desfocado por causa do vento mas eu conseguia ver cabelos ruivos e pele sardenta.

Aqueci minha palma e toquei seu rosto. Ele relaxou e pouco a pouco o vento diminuiu até não sobrar mais nada.

Ele fraquejou e eu o segurei pela cintura quando seus joelhos tocaram o chão terroso.

A cabeça dele pendeu em meu ombro e ele respirava com dificuldade.

"Quem...Quem é você?" Ele perguntou, ainda fraco.

"Meu nome é Anaya. Está tudo bem, eu vou cuidar de você. "

"Sou Thierry. "Ele disse e fechou os olhos.

Eu sabia o que era aquilo, aquela sensação. Fraqueza e cansaço e tontura.

Heyden me alcançou e eu ouvia Collen acalmando os outros.

"Ele está bem?" Heyden perguntou.

Eu assenti, acariciando os cabelos ruivos espetadinhos de Thierry. "Só precisa de alguns minutos para descansar. "

Heyden tirou da mochila seu cantil e entregou para Thierry. Ele bebeu avidamente.

Atrás de nós eu podia ouvir Collen com sua calma e voz firme acalmando todos e instruindo-os a irem para suas casas.

Ao final de alguns minutos, ele se sentou na minha frente. Thierry reuniu força para se afastar de mim e procurou ao redor, então pegou os óculos do chão e limpou a lente.

"Tudo bem. Quem são vocês e porque são os únicos que não simplesmente fugiram de mim?" Ele perguntou.

Eu troquei olhares com os meninos e vi que eles silenciosamente me instruíam para que fosse eu a contar para ele.

"Sabe meu nome e estes são Collen e Heyden. Eu sou de Vanalius, eu era uma das campeãs e a escolha preferida para futura rainha. Heyden era caçador em Sazar e Collen era um guarda na propriedade de um nobre em Galisha. "

Eu tomei fôlego enquanto o deixava digerir aquelas informações. Esperto, sua sobrancelha se ergueu, me dizendo que ele sabia que ainda faltava uma resposta.

Eu estendi a mão e lhe mostrei uma bola de fogo. Deixei que minha pele esquentasse e se dividisse nos feixes magmáticas. A pele em meus dedos era negra como breu e brilhava com o fogo sobre meus ossos.

Os olhos de Thierry se arregalaram e ele olhou para os outros, parecendo querer saber se aquilo era real. Collen lhe mostrou uma bolha de água, com fios externos que dançavam sobre a superfície. Heyden fez uma fenda se abrir do chão e uma flor sair dali. Eu não sabia como exatamente ele havia feito aquilo mas a flor era linda, azul e verde como nenhuma outra.

Thierry entendeu o que aquilo significava e estendeu sua mão, deixando que uma bolha de ar dançasse sobre sua palma.

Sorri para os outros, vendo a beleza na junção de nossos poderes.

"Como...Como é possível?" Thierry perguntou, maravilhado.

"Ninguém sabe. "Heyden disse. "Nós só...Somos assim. "

Collen então contou a história, sobre como ele achou Heyden, Heyden me achou e eu achei Thierry.

"Talvez demore alguns dias, mas achamos que você nos levará para onde precisamos ir. " Eu disse.

Thierry ajeitou os óculos e assentiu.

"Precisamos ir. Talvez tenha caçadores chegando. " Collen disse e se levantou.

"Você luta?" Eu perguntei.

Thierry arregalou os olhos e rapidamente negou com a cabeça.

"Sou um homem de livros e não de espada. "

Eu ri com sua frase de efeito. "Cuidaremos disso depois. É bom que saiba cortar no lugar certo se precisar. "

Thierry engoliu em seco mas assentiu.

"Precisa pegar alguma coisa em casa? Se despedir talvez?" Heyden perguntou, dando-lhe a chance que nenhum de nós teve:dar adeus.

Mas Thierry recusou a oferta, dizendo que não tinha ninguém em casa que valesse a pena ou que se importasse com sua partida.

No caminho, ele contou que morava com o pai e mais cinco irmãos, todos mercenários e brutos que o renegavam por sua falta de instinto para a violência.

Partimos então, nós quatro, fechando o ciclo. Partimos sem rumo, apenas precisando nos movimentar, até que Thierry começasse a sentir um impulso.

O que não demorou muito.

A Ruína da RainhaOnde histórias criam vida. Descubra agora