Capítulo 5

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Após algumas horas de serviço – que pra Luzia pareceu ser a eternidade – todos os operários foram para o seu horário de almoço. Havia um refeitório no pavilhão, com mesas gigantescas dispostas paralelamente entre si onde Gustavo, Luzia, Gean e Rick se sentaram após servirem seus pratos. A comida do dia era a mesma de sempre: um mingau sem graça que continha artificialmente todas as vitaminas que precisavam.

Luzia mexeu no prato com o garfo que lhe foi dado e embora sentisse seu estômago roncar pedindo por alimento, não tinha vontade nenhuma de levar a gororoba cinza à boca. Pegou o copo de água que também lhe foi entregue e bebeu longos goles. O que não daria por um pedaço de pizza? Ou uma refeição em seu restaurante favorito? Só de pensar chegava a salivar.

Tentando mudar de ideia e esquecer a fome, olhou para os companheiros em sua frente: o casal de namorados amigo de Gustavo pareciam não ver problema com a comida.

— Tudo por aqui é cinza? — perguntou ela, virando-se para o garoto negro ao seu lado.

— Como? — perguntou Gustavo.

— Aqui na sociedade de vocês? Tudo tem que ser cinza? — E notando que ele não compreendeu ainda completou. — Esses macacões que vocês usam são cinzas, os prédios são cinza, toda outra peça de roupa ou utensílio é cinza. E até a comida! Isso é tipo uma regra?

Gean sentado em frente a ela, não conteve o riso ao beber um gole de água e cuspiu a bebida sobre a mesa. O homem ao lado dele também tentou conter o riso, e até mesmo Gustavo tinha um olhar divertido ao responder:

— Nunca tinha reparado nisso — Gustavo deu de ombros e engoliu uma garfada do mingau.

— Não? Mas vocês não sentem falta das cores? Das boas comidas?

— Eu cresci nesse mundo. Pra mim tudo é assim. Não tem nada que eu possa sentir falta.

— Tá, mas e a comida? Porque vocês sabem que existem melhores. Você mesmo fez uma comida boa ontem à noite.

— Já me acostumei — ele deu mais uma garfada em seu prato. Já chegava ao fim, enquanto Luzia nem havia tocado em sua refeição. — Você deveria comer. Eles não aceitam desperdício e não deixam sair sem terminar toda a refeição.

Os olhos de Luzia se arregalaram e ela procurou por uma confirmação dos outros. Todos acenaram com a cabeça.

— Eu tô falando sério. Experimente. Não é tão ruim.

Os três pararam e encararam a menina levar o garfo pela primeira vez à boca. Demorou eternos segundos para que ela mastigasse e engolisse.

— Isso é horrível! — falou ela, levando a mão na boca como se fosse vomitar. E em seguida bebendo um longo gole de água. – Como vocês conseguem?

— Não é tão ruim assim, Luzia. E você vai ter que comer de uma forma ou de outra. — A menina encarou os profundos olhos negros como se implorasse para que lhe livrasse dessa, mas ele apenas deu de ombros, apontou para seu prato e voltou a terminar sua própria refeição. — E você tem menos de 5 minutos pra fazer isso. Tá acabando nosso intervalo.

A moça, então, se obrigou a tentar de novo. Dessa vez, porém, não mastigou e fez o possível para apenas engolir o mingau sem sentir seu gosto. Mas, ainda assim, a papa sem cor tocou em sua língua e ela teve vontade de vomitar. Era um gosto que nunca sentiu antes, uma mistura de salgado e azedo, que lhe lembrava cera de ouvido.

A Liberdade que LimitaWhere stories live. Discover now