C i n c o

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Pérola








Chegar no trabalho hoje foi quase uma tortura. Tive que me despedir de Sam com minha cara de arrependida e inchada de tanto chorar e chorar como uma idiota que sabe o mal que fez.

Sei que o machuquei com minha ação impensada, com meu impulso pré-suicida. Foi difícil para nós dois nos desgrudarmos hoje pela manhã, queria poder apagar a memória dele sobre o que aconteceu ontem e apagar a minha também mas isso é impossível, acho que sempre me lembrarei desse dia...foi a pior coisa que fiz desde minha adolescência delinquente.

Olho ao redor da minha sala e para minha mesa lotada de procedimentos como: inquéritos, autos de Investigação por atos infracionados, termos circunstanciais e o cacete.

Tenho sessenta registros de ocorrências em menos de 24 horas desde ontem para serem analisados hoje mesmo e se é preciso a tomada de medidas cautelares urgentes ou é só uma hipótese sem fundamento...e ainda tem as porras dos procedimentos em atrasos!

As vezes me pergunto por que diabos escolhi essa profissão e então me lembro que foi uma promessa que fiz a mim mesma quando tinha dezoito anos. Tenho um puta doutorado em direitos humanos e uma especialização em códigos penais.

_E ainda tenho direito a armas de uso civil restrito!

Bato palmas e giro na cadeira olhando pelas persianas o movimento constante na minha delegacia. A gente não para nem na véspera de ano novo, temos que aguentar os babacas dos militares virem aqui trazendo casos inúteis já que levam tudo ao pé da letra...

Pego meu celular e vejo uma mensagem acabando de chegar no chat. Meu bobo coração acelera e erra batidas sem motivos. É do meu ursinho!

_Faz muito tempo que ele não me manda mensagens...esse idiota.

"Pérola, vamos jantar na minha casa hoje. Vá direto pra lá e, sério, não me ignora. Preciso falar com você sobre ontem...sabe que precisamos.
_Seu Sam."

Respiro fundo sentido um bolo se formar em minha garganta ameaçando sufocar-me. Droga! Eu sabia que ele não esqueceria isso sem uma maldita conversa!

_Ele me chamou de Pérola! Pérola? Merda...ele está sério demais. Ele só me chama assim quando está zangado, triste ou...magoado. Será que vamos começar esse ano com o pé esquerdo? Não!

Me ergo da cadeira confortável do meu gabinete e coço a sobrancelha.
O que eu fiz...?
O que faço para me desculpar? Deus!

De repente me sinto nervosa e fria. Ando pela sala espaçosa em busca de alternativas viável e possíveis.

_Quem poderia me ajudar?
Mãe Mari me daria o sermão da montanha só por achar que briguei com Sam quando tudo estava indo bem... tia Samantha? ham...Não. Ah, sim! A Clarezinha...ela vai saber o que fazer.

Vou para a tela de discagem e digito seu número novo já que o celular dela caiu dentro da banheira dos bebês e queimou o chip. Chama três vezes e a impaciência me faz bater a sola da bota preta no piso de porcelanato líquido. Enfim sou atendida.

_Olá, você ligou para Clare, quem fala?

Sorrio achando graça com sua educação burguesa do outro lado da linha.

_Eu sei que é você, Clarezinha.

_Pry? Me desculpe, mas é que estou tentando dar mama ao Andrew sem que ele vomite tudo...posso pôr no viva-voz?

Ouço um chorinho rapido e baixinho. Coço a sobrancelha.

_Voce está sozinha? Digo, tem mais alguém além dos gêmeos ai com você?

Te Enlouquecendo (Concluído)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora