V i n t e e U m

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Pérola






_Vamos querida, você consegue!

Grito de dor quando piso em uma poça e caio no chão lamacento do quintal da cabana.
Ouço sua bota bater contra a lama fazendo estalos abafados pela chuva.

_Me deixe em paz, seu mostro!

Minha voz falha, meu peito e meus músculos doem se contraindo de dor e frio. Levanto depressa mal vendo para onde vou. Minhas lágrimas se juntam as gotas de chuva. Não posso deixá-lo me alcançar.

_Isso, corra, o vovô adora brincar de pega-pega. Está comigo e eu vou pegar você.

Sua risada aumenta meu desespero. Corro o mais rápido que posso, escorregando e caindo mas corro. Seus passos e minha respiração ofegante é tudo que escuto. Está tão perto! Não...

Vou para trás com força ao sentir-me ser puxada pelos cabelos furiosamente. Gemo de dor, sua respiração ruidosa em meu pescoço. Esperneio mas seu aperto é doloroso. Não, por favor...

_...po-por...fa...vor...

_Ah, já está implorando, anjinha?

Meus dentes batem de medo, de frio, de dor, desespero, indignação. O sinto em minhas costas, sinto nojo. Tanto nojo que vomito.

_Shi...respire. Ainda pode piorar. Você nunca irá conseguir fugir de mim, querida. Eu sempre encontrarei você.

Nego com a vista embargada pelas lágrimas e a chuva.
Passos apressados chegam perto.

_Pegou essa coelhinha filha da puta, pai? Essa desgraçada arrancou um pedaço da minha bochecha!

Tremo ao sentir uma bofetada forte no rosto. Sinto o gosto do meu sangue desta vez. Ofego.

_Você desfigurou o meu filho, anjinha. Vamos, está frio aqui e meu pau quer muito um lugar quentinho para se abrigar, e nada é mais quente que você, princesinha.

Sou arrastada de volta para o lugar mais repugnante e medonho que já estive em todos os meus dezesseis anos. Grito e tento me soltar mas só escuto suas risadas horrendas e coisas nojentas...Não!

_Não! Não! Sai, me solta! Eu te odeio! Por favor...Não!

Tento soltar meus pulsos e me debato chutando. Não vou deixá-los fazerem aquilo comigo de novo! Nunca mais!

_Pérola! Amor, para! Foi só um pesadelo, ei? Abra os olhos. Abra os olhos!

Essa voz...ainda que ofegante eu reconheceria em qualquer lugar. Abro os olhos confusa e me deparo com duas esferas azuis doces e preocupadas.

_Sam...?

_Sim, sou eu. Sou eu.

Tento controlar minha respiração e o solto. Há marcas de arranhões recentes pelo seu pescoço, peito e braços. Engulo minha agonia.

_Eu...eu não sei o que...

_Está tudo bem, todos temos pesadelos. Mas não sou uma ameaça, está segura.

Só quando seus dedos percorrem minhas bochechas percebo estar chorando. Assinto e o puxo para mim. Abraço meu porto seguro, minha tábua de salvação, meu salva-vidas, meu amor, meu tudo. Choro mais em seu peito.

_Shiii, está tudo bem. Tudo bem.

Sussurra acariciando meus cabelos e costas. Seu cheiro é reconfortante e me traz paz. Esfrego o nariz em sua pele para ter um pouco mais dele. O aperto mais.

Te Enlouquecendo (Concluído)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora