TWO

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A boca seca ansiava por qualquer líquido que pudesse a umedecer. O cantil quase no fim me fazia engolir em seco, mas precisávamos racionar o último fio de água até que não suportássemos mais o deserto aflorando nos meios dos lábios.
    Os filetes do amarelar acentuado que trinchava o céu refletia o calor no tecido que se grudava à minha pele. Porém, o que mais preocupava-me era a falta de gasolina que, agora, deixava-nos vulneráveis não apenas aos mortos-vivos, mas aos humanos. É verdade que não éramos os únicos sobreviventes e, se fôssemos, seria um triste fim para dois irmãos.
    Disse a Taehyung: não havia motivo para o desânimo. Chegaríamos, mesmo que o destino ficasse um pouco mais distante por termos que seguir a pé.

Bem-vindos ao apocalipse. Esbocei um riso tentando desbravar meus conhecimentos sobre física na busca pela possível temperatura extremamente calorenta.

Recolhemos o que podíamos carregar e caminhamos seguindo a vegetação que margeava a estrada. O ar puro enchia meus pulmões, fazendo-me rememorar o contato vívido e direto que tinha com a natureza. Os picos de sopros tórridos chacoalhavam as folhas e algumas se desprendiam da copa, tocando o chão.
   Os galhos repartiram-se, pisoteados brutalmente, sequer me importando com o rastro deixado para trás.

Onde estão os monstros?

— Olhe, Jungkook — meu irmão sussurrou. O dedo indicador apontou para um lago relativamente grande a poucos metros; em contrapartida, quatro mortos o rodeavam.

— Pegarei os da direita e você… — Taehyung interrompe-me.

— Sem armas de fogo — disse, notando a busca pela pistola que tínhamos encontrado ao fundo do porta-luvas.

Retirei a mão do coldre, embora quisesse apenas explodir os crânios para o alto a fim de talvez acordar do que imaginava ainda ser um sonho. Seguimos, furtivamente, esgueirando-nos pelos troncos ocos, revestidos de musgos que nos escondiam enquanto meu irmão finalizava dois mordedores.

— Cuidado! — Lancei a faca, que tirara do coturno, na direção de Taehyung, que encontrou o cadáver. Ela bateu em um estalo úmido próximo a seus ombros, perfurando o crânio do desalmado e penetrando no lobo frontal dele. As pernas arrastadas despencaram, como os sacos de lixo que eram descartados pelo caminhão nos dias de quarta-feira. A massa acinzentada escorreu pelo rosto decomposto e acumulou-se abaixo do corpo.

— Obrigado. — Fitou-me, esboçando um riso assustado.

A água transparente permitia que víssemos as pedras bem alinhadas ao fundo do lago.
Nunca passou pela minha mente o quão prazeroso seria deleitar-me de um cantil de água, mesmo que em temperatura ambiente. O líquido corria livre na garganta. Sentia-me tomando a melhor bebida que já existira, o que, tecnicamente, era uma verdade.
Enchemos o objeto para que pudéssemos continuar. Todavia, aquele parecia ser um bom local para um acampamento.

Passos regulares e distintos do costumeiro do outro lado do lago cruzaram minha mente, fazendo-me pensar se a ideia era realmente boa. Sobreviventes? Cerrei os olhos e pude distinguir cinco silhuetas, sendo que uma delas possuía fios louros que brilhavam na escuridão junto a um sinal de fogo que se mostrava: uma fogueira.
    Os homens, assim como nós, faziam apenas uma pausa ante seu destino.

— Taehyung! — Abaixei-me, puxando meu irmão para atrás de uma pedra larga que beirava o lago. Um dos indivíduos apontava-a em nossa direção, buscando, talvez, por informações. AWM: arma boa demais para ser encontrada tão facilmente.
   Um morto-vivo buscava-me junto às passadas bastante lentas, quase análogas às de uma senhora de idade avançada.

Alvorecer Mortal  »  JK + JMOnde histórias criam vida. Descubra agora