FOUR

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Passamos longas duas horas caminhando pela margem estreita, que consideraria sombria em tempos gélidos como aquele em uma noite costumeira daquela localidade. Poucas foram as vezes em que precisei apunhalar desalmados à deriva da autoestrada, blindado pelos veículos sem vida e possibilidade de uso, somente barricadas cruas. O medo de pausar os passos para saciar a fome pontuada na boca do estômago passou a ser uma realidade cruel, fazendo-nos desprezá-la. A cada trinta minutos, quatro de nós carregavam Seulgi, que permanecia desacordada e suando frio, deixando no ar alguns delírios providos das dores e ausência de medicações.

— O que será de nós? — Taehyung disse e se colocou ao meu lado. Chutou um punhado de neve para evitar que os pés afundassem o bastante para dificultar seus passos. 

— Isso é uma ótima pergunta da qual não sei a resposta — eu respondi, observando Jimin cruzar os braços em frente ao corpo e arrastar as mãos trêmulas para tentar se aquecer. 

O frio beirava o impossível de suportar, esse sequer poderia diminuir com as vestimentas que estávamos trajando, pois não eram apropriadas para aquela ocasião. Embora fosse um amante da temperatura baixa, aquela parecia vir diretamente de minhas imaginações, da história de um dos meus romances, os quais nunca saíram do papel. 

Lembrei de como me empolgava quando lia as belas frases, que havia escolhido delicadamente, em voz alta. Taehyung, alinhando o queixo sobre as mãos e semicerrando os lábios, esperando para dar uma sincera opinião sobre a temática que usei em um novo livro, após estudar corretamente tal assunto. 

Observando por entre os galhos em formato de escamas pontiagudas, esbocei um sorriso. O lago congelado me fazia flutuar para os trechos mais vividos que pude descrever na obra que nomeei como Remember me. Obra, esta, que pareceu fluir rápido o bastante para ser finalizada durante uma das inúmeras viagens de trabalho de meu pai.

— A princípio procuraremos um abrigo para nos aquecer — voltei a dizer, salientando o tremor dos demais sobreviventes. — E buscaremos por mais suprimentos, acredito que há lugares bons por aqui. 

— Principalmente medicamentos, pessoal — Hoseok evidenciou a urgência. — Não sei quanto tempo a garota conseguirá resistir — o médico sussurrou próximo a mim.

— Um passo de cada vez — Seokjin deu passos largos para nos alcançar, após Jonghyun o substituir no transporte da menina que, pela primeira vez, se debateu bruscamente e emitiu um gemido um pouco mais alto.

De acordo com as coordenadas que Yoongi havia visualizado nos mapas espalhados nas interestaduais e cabines telefônicas, existia um vilarejo a seiscentos metros de onde estávamos e, mais do que nunca, não pretendemos parar até alcançar sabe se lá qual for nosso destino.

Entretanto, eu continuava intrigado com os pontos de ônibus aos quais passamos, visto que estavam cobertos pelo amontoado de cartazes de desaparecidos, e um deles tinha leve familiaridade para mim. Os bancos metálicos estavam deteriorando o suficiente para que a ferrugem se estendesse por tudo, contrastando com os galhos secos de umas árvores que não conseguia distinguir.

— Como consegue fazer isso? — Sehun indagou, caminhando junto a mim. Suas mãos, ao contrário dos demais que buscavam aquecê-las, pressionavam as alças da mochila maior que si mesmo, enquanto os orbes serpenteavam para além da autovia à nossa frente.

— O que? — Fitei-o brincar com a fumaça saindo de sua boca, puxando e soltando o ar repetidas vezes.

— Ser um líder nato — ele disse, diminuindo os passos. Apesar de possuir um semblante expressando medo, o garoto tinha um sorriso de uma ponta a outra das bochechas peroladas pelos filetes com baixa iluminação.

Alvorecer Mortal  »  JK + JMOnde as histórias ganham vida. Descobre agora