Capítulo 5

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Ah seu Zé, seu Zé Joaquim...

Seu filho me chega todo esbaforido pra dizer que a pressão do homem subiu de novo e que dona Lourdes se apavorou. Eu não respondi nada, já tinha me colocado à disposição, mas ainda me pergunto: "e se eu não tivesse em casa?" Estou doido, mas é com meu pai agora. Cadê esse caboclo?

Dormi duas horas e meia, foi o que dormi naquela manhã antes que minha mãe me chamasse pra atender o jovem Arielzinho, nenê da dona Lourdes.

Ariel poderia ter ligado, mas sua disposição o fez vir de bicicleta até minha casa. Seu pai não estava passando tão mal assim, porém a pressão deveria ser observada pelos médicos conforme a orientação recebida.

Todo envergonhado, ele não entra sem que eu o convide...

— Entra meu rapaz. Senta aí. Então quer dizer que o véio resolveu assustar a família? — brinco pra ver se ele afrouxa os ombros e para de espremer os dedos.

— Parece que sim, Paulo. AH! Olha que fofo! Dois bezerrinhoooos.... — O rapaz olha pela janela e faz a voz mais melosa do mundo quando vê dois funcionários carregando cada um dos bezerrinhos pra dentro da estrebaria.

— Quer ver eles, Ariel?

— Outro dia... hoje eu...

Eu ofereci porque acho que as coisas ficaram bem resolvidas entre nós. Ele sabe que eu (não) tenho namorado e agora lida com isso... E o comportamento mais atirado melhorou muito. Parou de me secar e fazer caras sensuais. Tadinho, se a família não fosse tão fora da casinha, eu chegava ali.

— São fofinhos os boizinhos?

— É fofo sim. Só que infelizmente a mãe dos dois morreu horas depois do parto.

— AH! Jura?

Não, não e não.

Ele começou a chorar. O que eu faço? Abraço? Ignoro? Mando embora ou ofereço um copo de água?

— É... infelizmente. Eu fiquei muito mal porque foi rápido. A vaca era saudável e na hora do apavoro, nem lembrei do veterinário. Ali nem ia adiantar e se esperasse até ele chegar talvez perdesse os três. Mas venha ver os dois.

— O meu pai...

— Ah, teu pai o quê? Ele que não venha achar que tô de malícia pra cima de ti que eu passo o fio de luz nos cambitos dele também...

— Mas ele tá passando mal.

— Opa! Esqueci, desculpa. — Eu ameaço sair correndo pra tomar pelo menos um banho de dois minutos, só pra tirar o suor do lombo e das partes de baixo, mas fico pensando que dois minutos podem significar o fim da existência do vizinho véio. Quase empurro o Ariel pra dentro do carro e me taco na estrada pra fora do sítio.

— Não trancou a casa? — ele observa.

— Não faz mal, minha mãe tá aqui em casa.

— Ah dona Isa! Ela sempre foi tão boazinha comigo. Eu escapava pra cá quando era pequeno e ela me levava junto na horta, quando morava aqui.

— Lembro disso. Parece que foi esses dias.

— Parece mesmo. Paulo... um dia quando tiver mais sossegado, só como amigo mesmo... podia me levar no centro? Assim, pode ser quando tu for comprar ração, pagar coisa no banco... eu levo umas "fichinhas" e deixo nos lugares pra ver se consigo um emprego.

Meu coração dá aquele aperto doloroso porque já sei que não vão deixar o rapaz fazer isso. Nem estudar. É absurdo sim, concordo. Mas não posso fazer nada. Ajudo como puder e de um jeito que não prejudique ninguém.

O Centauro e o Caranguejo (Em Pausa)Where stories live. Discover now