Capítulo 7

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Acordei num susto quando ouvi a chave virando na porta da sala.

Levantei num salto e descobri que eram meus pais. Eles não moram mais comigo, mas estiveram ali no dia anterior e voltaram de surpresa. Não tenho problemas com eles, pelo fato de às vezes ter companhia de outro homem em casa. Só que naquele caso, éramos Ariel e eu na mesma cama. E pra piorar, estávamos "pelados em Santos"...

Minha mãe não abriria a porta do meu quarto, mas deve ter visto um par de tênis e se lembrar que o menino veio comigo pra casa na tarde anterior. Depois quando subir, vai notar que os três quartos estão abertos e eu, com minha cara de pau, vou tentar explicar como dá que não aconteceu nada demais.

Meu pai tava no banheiro e ela só disse:

— O seu Zé já tá em casa e o Horácio, ele disse que tu não o atendeu.

— Merda isso. Eu acabei de retornar, só que agora ele que não atende.

— Por isso eu acordei teu pai bem cedo, pra vim te avisar, olhe, se prepara que vem chumbo grosso. Segundo dona Lourdes, eles tentaram até cansar no teu número e Hernandez tá fora do estado. Restou o Horácio, que tava numa festa pra essas bandas. E ele me "soltou os cachorros". Me dá uma raiva dele às vezes.

— Nem me fale... Mas olha, eu não fiz nada com o rapaz.

— Por mim... não digo nada. Eu respondi que tu teve de "plantão" nesses dias e que devia estar cansado. Mas aquela gente é estranha

— Me dá pânico disso. E... é que ele dormiu lá comigo, já falo porque...

— Ah Paulo, não me interessa, tu é adulto e ele também. Não quero saber de coisas que fazem entre quatro paredes, não sou tão pós moderna assim. Minha preocupação é outra.

— Olha, que nojo dessa véia, pós moderna — dou uma risada, abraço minha mãe e encho a cara dela de beijos.

— Leva o Ariel o quanto antes pra casa dele, que é pra não ouvir coisas de lá.

— Ali é complicado mesmo. Eu sou bem franco em dizer pra senhora que gosto de uma coisa mais madura, menos cobrança, sem esse nhenhenhém...

— Então não ilude o rapaz.

— Eu fiz de tudo pra ele se tocar, mas dei uma escorregada ontem. Ai mãe... eu gosto dele...

— O que que eu te digo, Paulo? A vida é tua, só não prometa nada se não quer se envolver e deixa claro. Se fizer o rapaz sofrer, as famílias vão se desentender, ele pode ficar mal falado e esse é o pior terror praquela mulher pelo que notei. Já notou que ele foi criado diferente? Eu não sou tão burra que acha que um menino se torna gay porque é criado "diferente"... ela mesma disse que queria uma filha, quase morreu no parto da única menina que teria e quando Ariel nasceu, ela já tava meio variada.

— Isso acontece na vida real? Pra gente que é aqui do interior, isso parece coisa de cidade grande que vemo pela TV.

— Na vida real se chama depressão pós parto. Um dia pergunta pro Ariel como é o quarto dele. Eu já fiz muita coisa de crochê encomendada pela Lourdes e até um vestido de boneca pra "filha" dele, a Laura.

Isso só pode ser um pesadelo! Tô com medo de acordar amarrado como naqueles filmes de pessoas obsessivas... ou me deparar com Laura caminhando... preciso de férias, ir pra longe daqui.

— Eu quero vender tudo e ir para os Estados Unidos, mãe.

— Ah larga de ser cagão, Paulo, é só uma boneca. Já cansei de te pegar brincando de loicinha com minhas panelas, talheres e loiças antigas. Não faça tempestade em copo d'água.

O Centauro e o Caranguejo (Em Pausa)Wo Geschichten leben. Entdecke jetzt