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   A galeria está cheia. Meu sorriso está vazio. Cansado e um tanto forçado. Meus olhos evitam contato visual mesmo que eu os obrigue. Nem sequer cheguei a notar as obras da exposição. Ando tão dispersa. De alguma forma, as cores vivas ao meu redor estão sendo substituídas por um tom obscuro. Por quê não consigo aprecia-las? Onde está aquela sensação indescritível de ver a marca que as pessoas conseguem deixar no mundo com a arte?

- Maya?- Uma voz conhecida me acorda de meus devaneios.

   A irmã de Vernon aparece na minha frente, usando um vestido preto e o cabelo penteado para trás, preso em um coque. Sorri alegremente e ainda confusa. Um homem se aproxima da mesma e minha memória afirma que seu rosto é familiar.

- Pai, está é Maya.- Faço uma reverência e ele sorri.- Aquela que te falei que o Hansol gosta.- O plano de sussurrar foi por água a baixo e meu rosto é contido por uma leve ardência concentrada especificamente na maçã do rosto.

- Sofia!- O pai a repreende rindo ao notar minha reação completamente sem graça e surpresa.- É um prazer conhecê-la, querida.

- O prazer é todo meu.- Sem duvidas minha tentativa de semblante simpático sai mais como uma careta ao ver o garoto se aproximando.

   Eu ignoro as coisas que passam em minha mente para não ficar mais nervosa com sua presença depois do que escutei. Mas é impossível ignorar o fato de que ele está lindo. O blazer preto combinando com a calça social. A blusa branca que perde toda sua clareza quando seus dentes de marfim aparecem. O cabelo ondulado ainda maior sobre o rosto. E quando me nota ali, suas sobrancelhas são arqueadas levemente e as bochechas se colorem.

- Então é aqui o seu outro emprego?- Consegue dizer e confirmo com a cabeça.- Que coincidência... Quer dizer, a exposição de hoje é do meu pai.

- Sério?- Pela primeira vez na noite consigo realmente verdadeiramente completamente me animar.- Eu não sabia que ele era pintor.- Isso explica porque não me é estranho.

   Sofia e Sr. Choi nos observam de uma maneira desconfiada. A filha puxa o pai para longe ao dizer que precisam resolver algo importante. Deixo de lado o nervoso de estar "a sós" com o colega de trabalho que gosta de mim. Fico fascinada quando me conta que sua mãe também é uma artista plástica e que dá aulas. Que os dois se conheceram em New York graças à arte. A história fica cada vez mais interessante e eu me desfoco até do trabalho. Mas nossa conversa é interrompida quando a voz soa no microfone.

- Acho melhor me posicionar lá na frente para ouvir o discurso dele antes que eu leve uma bronca.- Rimos.- Desculpe por te atrapalhar...

- Não me atrapalhou.- Nego fazendo gestos exagerados com as mãos.- Pelo contrário... E te agradeço por isso.

   Abaixa a cabeça sorridente e eu o observo. Ele se afasta e olha para trás novamente enquanto eu disfarço fingindo não estar fitando seu jeito de andar ou como fica atraente de costas.

   Pude então notar os quadros. Suas cores voltam aos poucos. O mais próximo de mim, contém tons de azul. Um quadro que apenas com um olhar me dá inspiração. Me dá vontade de escrever. De pintar. De desenhar. De criar. Guardo a imagem para mais tarde, na ideia de colocar toda satisfação e sensação em prática.

   Quando não tenho mais pessoas para cumprimentar, eu quero sorrir. Quero um abraço... uma troca de olhar... porquê? Minha instabilidade emocional ainda irá me matar ou me deixar louca... já que cheguei a um ponto onde nem mesmo sei como me sinto.

   Vejo a família de Vernon se despedir de todos gentilmente. Não fazem diferente comigo. Dou um sorriso fechado para ele que até acena. Mas que pouco depois de passar pela porta de vidro, volta eufórico e para na minha frente.

- Você gostaria de sair esse final de semana comigo?- Minha respiração é presa e dou um passo para trás já que estamos próximos demais. Tão próximos que sua voz mesmo saindo baixa, consigo escuta-lá claramente e seus olhos que são mel esverdeado mostram a pupila dilatada.

- Sim...

   Respondo como se estivesse ofegante depois de alguns segundos. Ele morde os lábios atraindo meu olhar e logo se aproxima depositando um beijo molhado em minha bochecha que de certo está pelando. Me olha tão próximo depois do ato, que seu nariz quase encosta no meu. E corre antes mesmo de minha mente conseguir formular uma frase ou digerir a situação. Pisco diversas vezes. O que acabou de acontecer?

(***)

Alcancei o diário e fechei os olhos tentando focar na obra e não no filho do artista da exposição. E tudo me faz transbordar novamente.

Estávamos à beira do rio
Você me levou para aquele lugar frio
A água descendo
Baixo baixo
A água caindo
Para baixo
Clamei por ajuda
Alguém me acuda
Eu estava me afogando
E você observando
Esperando que eu aprendesse a nadar
Mas afundei sem ar
No silêncio pude lembrar
E mesmo que não fosse durar
Foi bom ter conseguido te amar.

Sky. {Mingyu} EM MUDANÇAOnde histórias criam vida. Descubra agora