Parte 15

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A rotina no palácio era monótona e em nada transparecia a importância do lugar. O tempo transcorria de forma lenta, caminhava como passos embaixo da água. Talvez fosse uma magia que envolvia todos os humanos, fazia com que noventa anos parecessem uma eternidade e suas vidas não tão curtas.

Ara não tinha nada para fazer. Vigiou a porta do salão por pouco mais de uma hora e, quando a conversa entre Ghrèin e Zaras terminou, ficou sem tarefas para o resto do dia. O elfo se retirou, informando que ficaria no quarto cuidando de certos assuntos com a ajuda do filho, e só. Estavam em um local seguro, não era necessário vigiar o corredor dos aposentos dos convidados, onde vários guardas já circulavam, então Ara se pôs a caminhar pelo palácio. Ficariam lá até a tarde do dia seguinte, por motivos que desconhecia por completo, então havia bastante tempo para conhecer o local.

Descobriu que o pátio central era o ponto mais movimentado — visitantes, criados e outros tipos de trabalhadores não paravam de cruzar de um lado para o outro. Era bonito, com um gramado extenso, algumas poucas árvores e canteiros floridos. Haviam bancos, uma fonte com uma estátua de mulheres dançando em um círculo, e os caminhos delineados em pedra. Ara ficou um longo momento ali, apreciando a luz do sol, sentindo saudades da floresta. Teve vontade de tirar as botas para sentir a grama sob os pés, mas achou que não seria muito bem visto.

Alguns humanos a olhavam com curiosidade, mas ninguém lhe dirigia a palavra. Conseguiu ver mais do palácio do que de fato poderia, uma guarda-costas não teria permissão para adentrar certas áreas, mas sua presença causava estranheza, os soldados não sabiam que tipo de visitante era, apenas que acompanhava um Duque elfo, e assumiam que era mais importante do que de fato era. Não reconheciam em seus trajes a roupa de uma guerreira — e piorava que Ara se vestia da mesma forma que o filho do "Duque" — tampouco percebiam as adagas escondidas por debaixo da capa. Para os guardas, ela poderia muito bem ser uma elfa da nobreza, não sabiam que isso inexistia, pelo menos em Lannuaine.

Depois de aproveitar um tempo de sol e o contato com ao menos um pouco de natureza, Ara resolveu voltar ao palácio. Passou pelo portão principal, por onde havia entrado com Ghrèin, e subiu a escadaria de pedra que levavam para o segundo andar. Logo adentrou um cômodo que lhe era proibido, passando por outra enorme porta de madeira entalhada; era o salão de baile. Pela primeira vez, achou a decoração feita pelos humanos bonita. Uma das paredes do salão era composta de janelas altas, que se erguiam quase até o teto, e a luz dourada do fim de tarde iluminava o ambiente. O chão era de madeira, sem o amontoado de tapetes que os homens tinham mania, o teto era todo pintado com cenas de natureza, homens e mulheres dançando, festejando, crianças brincando. Haviam figuras humanas com asas nas costas, que ela não entendeu, mas percebeu que eram especiais de alguma forma. Um gigantesco candelabro de cristal descia do centro da imagem, os raios de sol refletiam nas pedras criando reflexos iluminados na parede.

Encontrou outros cômodos bonitos, uma sala de jantar, alguns quartos desocupados, e descobriu que humanos conseguiam criar algo interessante, se não exagerassem nos ornamentos. No entanto, o que realmente a impressionou foi a pequena construção de pedra que ficava atrás do palácio, ainda dentro dos muros. Era simples, apesar de ter uma altura considerável, tinha uma torre baixa na parte da frente, com uma cruz no topo e um sino de bronze no interior. O que encantou a elfa foi o lado de dentro, não por estátuas sofisticadas, castiçais de ouro ou as tapeçarias caras. Ali não havia decoração nenhuma, apenas a parede de pedra, bancos de madeira, uma mesa de mármore no fundo, e as janelas.

As magníficas janelas de vidro colorido, Ara perdeu o ar quando as viu. Lembrava a casa dos Holimion.

A maneira em que a luz passava pelo vidro lhe pareceu mágica, e os desenhos formados eram encantadores. Atrás da mesa ao fundo, uma janela redonda mostrava o que parecia ser uma flor, as das laterais, no entanto, retratavam cenas de uma história que ela não conhecia. Era uma versão da criação do mundo, na qual uma figura humana criava a terra, o sol, o mar e todas as criaturas. Os homens vinham primeiro, depois os seres semelhantes, como anões, elfos e halflings. As outras raças, de formas mais diferenciadas dos humanos, vinham em seguida, e então os animais. A última janela era dividida em três partes, mostrava o primeiro homem nos céus, junto ao sol, acompanhado dos humanos de asas. Na segunda parte, a terra, estavam os seres criados pela figura humana, e embaixo, no subsolo, as criaturas consideradas malignas se aglomeravam.

Livro 1 - A Elfa, O Homem e a Ordem [completo]Where stories live. Discover now