REINO AURALLYN

77 24 3
                                    

      Ao dar seu último suspiro, Primus evocou uma forte ventania que carregou as sementes de sua alma para os mais diversos canteiros de Literatus

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Ao dar seu último suspiro, Primus evocou uma forte ventania que carregou as sementes de sua alma para os mais diversos canteiros de Literatus. A primeira das sementes a germinar foi a de Aurallyn. De seu broto, cresceu por cem anos uma colossal árvore, cuja altura era precisamente setecentos e setenta e sete metros. De tronco branco como a neve e folhas douradas durante o dia e prateadas à luz das estrelas e do luar, sua áurea era inevitavelmente apaguazigadora. Ao caírem, suas folhas flutuavam por um bom tempo, pois eram quase tão leves quanto o próprio vento e quase intangíveis quanto uma prece suspensa ao céu. E pairando no ar, as folhas brilhavam como pequeninas estrelas a orbitar a frondosa e mais sagrada árvore de Literatus e sua beleza e dádiva eram inquestionáveis.

      Com o passar dos séculos, homens e mulheres em busca de um sentindo último e maior para a existência foram atraídos por esta Grande Árvore, e assim fundaram o Reino de Aurallyn, o mais pequeno dos quinze reinos

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Com o passar dos séculos, homens e mulheres em busca de um sentindo último e maior para a existência foram atraídos por esta Grande Árvore, e assim fundaram o Reino de Aurallyn, o mais pequeno dos quinze reinos. Com sua geografia predominantemente constituída de vales e modestas montanhas, sua população era campesina, criando gados caprinos e frutas silvestres como principal atividade agrícola. Na sua arquitetura, não ostentavam suntuosas moradias, mas viviam em comunidades de partilha, geralmente por vínculos familiares, e mantinham uma economia de solidariedade entre seus habitantes, de modo que fome e necessidades extremas eram acontecimentos raríssimos entre os aurallí.

Para além de sua vida simples e sóbria, os aurallí eram famosos por sua incomparável natureza respeitosa. Exaltavam todos os seres viventes e sua ligação com o transcendente. O maior símbolo de seu reino era a convivência harmoniosa entre inúmeras crenças e expressões de fé. Em Aurallyn, eregiam-se templos para cada religião ou prática espiritual presente em Literatus. Cada aurállia mantinha um mantra em comum, independe da crença que seguisse:

"CONTEMPLAR DEUS EM TODAS AS COISAS E TODAS AS COISAS EM DEUS".

      Obras aclamadas como sagradas, orientações aos homens e às mulheres de todos os tempos e lugares nasciam na expressão literária dos aurallí e suas palavras carregavam o alento da cura interior ou da chama da interioridade e sabedoria humana,...

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Obras aclamadas como sagradas, orientações aos homens e às mulheres de todos os tempos e lugares nasciam na expressão literária dos aurallí e suas palavras carregavam o alento da cura interior ou da chama da interioridade e sabedoria humana, pois acreditavam num bem palpável e além dos olhos. Seus reis e rainhas eram famosos por sua prática diplomática com os demais reinos e sua profunda sensibilidade humana, nunca permitindo que os conflitos do continente ruminassem nas terras de Aurallyn.

Contudo, as monarquias vizinhas se envolviam em tramas e batalhas sangrentas e notícias de guerra, morte e horrores batiam as portas das fronteiras de Aurallyn. E a catástrofe sobreveio. Como o Reino de Aurallyn está incrustado na fronteira entre os Reinos Invenitus, Talesia, Herodeas, Barduk e Margilus, muitos feridos e migrantes fugindo da fome, perseguição e extermínio se refugiavam em Aurallyn e cada aurállia não negava socorro, pois suas confissões de fé imprimiam tais valores que lhes eram inalienáveis, a caridade e misericórdia eram suas constituições existenciais. Porém, o Rei incentivara e protegia tais práticas de socorro e acolhimento em segredo, pois Aurallyn, por ser considerada uma terra sagrada, desfrutava de um acordo de não ataque por parte dos outros reinos, desde que não interferisse de modo algum nos rumos da guerra.

 Porém, o Rei incentivara e protegia tais práticas de socorro e acolhimento em segredo, pois Aurallyn, por ser considerada uma terra sagrada, desfrutava de um acordo de não ataque por parte dos outros reinos, desde que não interferisse de modo alg...

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Aconteceu, para a tragédia final de Literatus, que o Rei de Margilus descobriu a rota de fuga e o auxílio dado por Aurallyn aos migrantes e refugiados. Os cincos reinos vizinhos somaram força e retaliaram a intromissão dos aurallí e não há fábula capaz de narrar, nem nas mais tristes alegorias, o que foi o pecado daqueles que pisaram em solo santo para infringir sofrimento e destruição. Com os habitantes rendidos e os estrangeiros feitos prisioneiros, as "Tropas Anti-Deuses" - como ficaram conhecidas na história - invadiram o Templo Central e encontraram Shalo-a, Rei de Aurallyn, de joelhos rezando aos céus:

"Dá, Senhor, à nossa vida a sabedoria da paz. Que o nosso coração não naufrague na lógica de tanta violência disseminada ao nosso redor. Que os sentimentos de dor ou de despeito não sufoquem a necessidade dos gestos de reconciliação, a urgência de uma palavra amável que rompa as paredes do silêncio, o reencontro dos olhares que se desviam. Dá-nos a força de insinuar no inverno gelado em que por vezes vivemos o ramo verde, a inesperada flor, a claridade que é esta irreprimível e pascal vontade de recomeçar".

Após pronunciar sua última prece, O Rei de Aurallyn foi traspassado por uma lança e, pela primeira vez na história, o solo sagrada de Aurallyn conheceu o sangue do homicídio. E neste instante, nas bases mais profundas do continente, a consciência de Primus despertou e se encarnou na figura da Grande Feiticeira. Ela se levantou e diante das Tropas Anti-Deuses fez a luz da Grande Árvore Aurallyn, a primogênita, apagar e sua folhagem secar, juntamente com as faces dos soldados que se transmutaram em árvores secas e escuras, as quais só voltariam a germinar quando a paz nos reinos fosse restabelecida e novos governantes seguissem o último pedido de Shalo-a.

Durante a convocação dos conselheiros, devido a suma importância de Aurallyn, a Grande Feiticeira escolhera dois Guardiões, Taís e Menkell, para a tarefa de encontrar os próximos governantes do Reino da fé, esperança e caridade. Literatus permanece em luto depois de muito tempo de batalhas sem propósito e justiça, mas a cada dia os aurallí acendem suas velas na certeza de que a luz da Grande Árvore de cada reino logo voltará a brilhar.

 Literatus permanece em luto depois de muito tempo de batalhas sem propósito e justiça, mas a cada dia os aurallí acendem suas velas na certeza de que a luz da Grande Árvore de cada reino logo voltará a brilhar

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

Escrito por: Menkell Rodrigues (menkell)

Ilustrações desse capítulo:
Antônia Masud

Concurso Reinos LiteratusWhere stories live. Discover now