CAPÍTULO 29 - EM SESSÃO (I)

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Em plena quinta-feira, no meu último horário, enfim, após três tentativas de marcações, Sanches e Marinho conseguiram vir à sessão… vinte e cinco de outubro.

Eles são um casal de homens, aparentemente latinos, ou descendentes de latinos… O Marinho ainda possuía etnia misturada com outro povo europeu que eu não lembro. Ele era branco, alto, loiro escuro, cabelos médios e um porte bossal… Não se sentou em nenhum momento da sessão… Já o mais novo, Sanches, parecia ter algo de hispânico ou italiano, cabelos castanhos, encaracolados e desgrenhados  - que Marinho passava o tempo inteiro reclamando de seu cabelo… Aliás, Marinho reclamava de tudo, enquanto o mais novo ficava sentado, apertando as coxas e olhando para baixo, flutuando entre ódio, culpa e submissão.

Estão juntos há meses… Marinho possui 32 anos, enquanto Sanches, 18. Moram juntos há quase um mês, mas oficialmente há aproximadamente 15 dias, e o motivo da busca pela terapia seria: conflitos.

A queixa

Marinho relata que a busca por ajuda profissional é para ajustar as diferenças de ambos, pois elas estão causando conflitos que “cresceram exponencialmente” a um nível que “está prejudicial a ambos”, aparentemente não estava prejudicial a ele, inicialmente, pois pude identificar quem ativamente gerava mal estar de forma abusiva. O Sanches apenas confirma, mas indica que notara que precisava de atendimento há mais tempo que Marinho percebera, pois era difícil de lidar com “seu chefe”. Ambos estavam brigando muito, inclusive no sexo, e o status do afeto era de “indefinível”, pois nenhum dos dois sabia o que realmente sentiam um pelo outro.

A demanda

Ambos demandavam ajustamento… Marinho queria que Sanches entendesse que as coisas não são “do jeito que ele acha que devem ser”, que eu deveria focar meu trabalho nesse aspecto, e Sanches, por sua vez, apontava que Marinho era muito abusivo, desde que era seu “chefe”, e ele não entende o quanto isso é prejudicial para a saúde mental de todos em sua volta - ele queria que Marinho entendesse isso.

-Vocês já disseram isso, um para o outro? - perguntei.

-Eu não preciso falar nada, ele deveria já saber antecipadamente - disse Marinho.

-Sanches?

-Eu… nunca di… nunca tive oportunidade de falar, ele não deixa! - disse o rapaz.

Info: Eu iria construir o genograma do casal, mas nesse primeiro momento achei por bem acolher, pois não havia nenhum indício de que ambos permaneceriam em processo terapêutico.

-Você é o chefe, Marinho? - perguntei.

-Senhor Marinho - corrigiu ele - Eu era o chefe dele, ele era meu estagiário, mas eu o demiti, readimiti, e…

-Um momento, MARINHO - dei ênfase ao seu nome sem o “senhor”, indicando de quem pertence a chefia nesse momento - Sanches você pode me contar como se conheceram?

Marinho ficou furioso, seu rosto estava vermelho de raiva. Ele se apoiou à janela, e ficou vendo o céu. E Sanches começou a contar a história deles.

A história

Sanches, interrompido por Marinho sempre que possível… - e eu o cortando, sempre que possível - Montou o cenário. Ele estava sem o pai há um ano, e sua mãe, a viúva, que faleceu há pouco tempo “por culpa de Alex”, precisou muito de um estágio para trazer rendimentos para casa, pois sua mãe não estava conseguindo lidar com a morte de seu pai, com as contas de casa e com seu vício.

Info.: em um momento cogitei a ideia de perguntar sobre o laço com Marinho, a relação dele com seu pai, e coisas do tipo; mas julguei que poderia ser apenas inferência minha, essa associação de Sanches com Marinho e a figura de seu pai falecido.

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