Capítulo 1

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Os homens desejam nos entender, mas só em um sentido muito abstrato. Segundo eles, a volatilidade de nossas emoções nos converte em criaturas muito complicadas para poder nos compreender totalmente. Devo admitir que até certo ponto eles tem razão. Os homens enfrentam à vida de um modo muito direto. Algo que nos convém lembrar em nosso proveito. As mulheres, por sua vez, entendem-se muito bem entre si.

"Do capítulo intitulado Sua realidade frente a nossas ilusões"

O sol da tarde penetrava através das cortinas e seus raios caiam sobre o luxuoso tapete. As vidraças estavam abertas para os jardins e o aroma das rosas em flor perfumava o ar. Rebecca Marston, sentada na frente de Brianna, levantou uma sobrancelha.
—Parece estranha, Bri — disse com ar suspeito. — Está escutando a conversa pelo menos?
—Eu penso o mesmo — interveio Arabella Smythe, condessa de Bonham. Pequena e bonita, ela estava sentada em uma poltrona de tapeçaria requintada, com sua cabeleira de ébano preso em um recatado coque na nuca e a mesma pergunta escrita em seus encantadores olhos escuros. — Parece muito distraída.
—Serio? — para Brianna pareceu impossível fingir inocência e pôs-se a rir. Suas amigas, reunidas na sala informal de Arabella para tomar o chá e conversar, tinham muita razão. Já fazia um tempo que perde a o fio do bate-papo sobre as últimas tendências da moda.
A noite anterior havia sido um. Êxito. Ela inclusive a qualificaria de revelação. Como diabos podia pensar nisso sem sorrir?
Bem, era impossível.
—Sim. Estranha como um gato que comeu o canário. —Rebecca se sentava ereta, em um sofá de brocado. Era uma morena alta e esbelta com feições femininas e uma figura invejável. Era muito comum que os cavalheiros confessassem estarem apaixonados por ela, mas apesar da insistência paterna para que se casasse logo, ela ainda não havia encontrado ninguém que a conviesse. Esta era sua segunda temporada, e isso a transformava em uma espécie de desafio para os jovens da alta sociedade. —O que aconteceu? — perguntou.
As três sempre foram muito boas amigas desde meninas, e embora Brianna tentasse adotar uma expressão séria, não conseguia.
—O que as faz pensar que aconteceu algo?
As outras duas trocaram um olhar e depois voltaram a olhar novamente para ela.
—Só uma suposição — disse Arabella com secura. —Nós duas a conhecemos e eu já a vi antes com essa expressão. Recorda-me a vez que fomos explorar a abadia em ruínas a meia-noite esperando encontrar fantasmas e nos apanharam ao voltar. E você inventou uma estória e conseguiu fazer com que minha governanta acreditasse, não sei como. — E acrescentou: — Mas nós sabíamos muito bem que na realidade éramos culpadas por termos infringido as normas.
Brianna se recordava e murmurou com humor enquanto agarrava a xícara de chá:
—Sim, mas consegui que não nos castigassem, não é?
—Tinha muita lábia — comentou Rebecca. —Mas não tente aplicar esse ardil conosco. Diga-nos por que olhava pela janela com esse peculiar sorriso de deleite?
Brianna não estava muito certa se deveria contar a elas a verdade. Era um segredo tremendamente escandaloso. Não obstante, confiava em suas duas amigas mais que tudo no mundo.
—Bri? —disse Rebecca.
—Voltei e comprei — confessou ela.
Suas amigas ficaram com as xícaras de chá suspensas entre as mãos, perplexas. Deu-lhes mais detalhes.
—Voltei para aquela pequena livraria e comprei Os conselhos de lady Rothburg.
Arabella abriu a boca, atônita, e Rebecca se engasgou.
Brianna levantou a palma da mão em um gesto de súplica.
— Antes que digam algo, deixem que explique que funcionou. Os conselhos que o livro dá não têm preço. Li o primeiro capítulo e foi dos mais instrutivos. Deveriam ter visto Colton. Acredito que a metade da ópera deixou de olhar o cenário e passou a prestar atenção em mim. Bem, em certa parte de mim, de qualquer forma.
—Que parte? Santo Deus, Bri, que demônio está fazendo? —Arabella quase não prestava atenção a sua xícara de chá que estava a ponto de derramar o resto do conteúdo. —Tem ideia de como meu marido ficaria indignado se eu estivesse em posse desse livro? E perdoe-me pelo comentário, mas acredito que Andrew é mais tolerante que Rolthven.
Era provável que o marido de sua amiga fosse mais tolerante, mas Brianna não pôde evitar se recordar da impetuosa paixão de Colton na carruagem. Parecia incapaz de reprimir-se e esse era o efeito preciso que ela desejava.
—A princípio se assustou muito, mas então diria que. Adaptou-se.
— Adaptou-se a que? —Perguntou Rebecca com um brilho em seus olhos verdes. — Deixe já esse maldito mistério e comece a nos contar.
Brianna arrumou suas saias com decoro.
—Bem, o primeiro capítulo sugere que um enfeite discreto é muito apropriado se deseja assistir a um serviço religioso ou a reunião social de uma tia-avó, mas se o que alguém pretende é atrair o olhar de seu marido, deve ser um pouco atrevido.
— Atrevido como? —perguntou Arabella.
— Bastante atrevido. —Brianna notou que ruborizava. —Meu decote era muito atrevido, reconheço-o, mas embora Colton se zangasse porque trajava um vestido muito decotado, notei que também estava intrigado e o que ocorreu mais tarde confirmou. No começo estava indignado, mas já era tarde para me levar arrastada para casa e com isso provocar comentários de todo mundo, e sabem que ele odeia esse tipo de coisa. Devo dizer, no entanto que. Estimulou-o bastante a ideia de um vestido que facilitava tanto seu acesso.
—Deve estar de brincadeira. O duque é sempre muito correto e comedido. Quando falamos de Rolthven, o qual acontece frequentemente, porque todos nós sabemos que seu marido é um homem importante, sempre o fazemos com o máximo respeito por seu controle.
— Bem, pois ontem à noite o deixou de lado pela primeira vez. — Brianna baixou um pouco a voz. — Quando voltamos para casa na carruagem, tomou-me desenfreadamente e eu apreciei cada segundo. Embora deva dizer que foi um pouco embaraçoso descer da carruagem em evidente desalinho — acrescentou, recordando que seu marido só teve tempo de abotoar as calças e ajudá-la a se vestir com pressa, antes que o cocheiro abrisse a porta e provocasse um ardor ainda maior nas faces. Tinha o cabelo solto e a capa continuava caída no chão, de modo que não havia dúvidas sobre o que estavam fazendo.
Arabella depositou a xícara no pires com tanta brutalidade que ela oscilou. Estava com os olhos muito abertos.
—Na carruagem? O duque? Oh, céus.
—Foi maravilhoso — disse Brianna com franqueza. —Colton aparenta ser muito decente e convencional, mas essa não é sua verdadeira personalidade. Acredito que sempre pensou que eu me escandalizaria se ele expressasse sem disfarces sua natureza apaixonada. E mais, sei que o educaram com a crença de que seria duque e que sua elevada posição social exigia certo decoro. Quando me cortejou, deu-me apenas um par de beijos castos, embora eu soubesse que ele desejava mais, muito mais. —Baixou um pouco as pestanas e acrescentou: — Há algumas coisas que um homem não pode esconder com essas calças apertadas tão em moda hoje em dia.
Arabella suspirou, recostou-se novamente na poltrona e ajustou a manga de seu leve vestido azul.
— Andrew jamais pensaria em algo assim, como fazer amor em nossa carruagem.
— Colton tampouco, a menos que o incitasse a isso, acredite. — Brianna se inclinou para frente. —Mas é bom ser capaz de incitá-lo. Estou descobrindo que o livro de lady Rothburg é bastante oportuno. O que as mulheres consideram romântico e a definição que tem esse mesmo termo para os homens são duas coisas muito distintas. Colton é cumpridor de seus deveres, me dá de presente joias, flores e coisas assim. No entanto, estou convencida de que o assombraria muito saber que me agradaria mais com um sorriso carinhoso ou um beijo terno do que com um broche de diamantes. Nem sequer imagina isso, simplesmente.
—Como sou a única solteira, esta conversa me parece fascinante. Você vai educá-lo, conforme entendi? — Rebecca arqueou uma sobrancelha. —Ainda não tenho marido, mas começo a compreender como funciona tudo isto. São como inimigos que vivem no mesmo acampamento e, além disso, estão obrigados a serem aliados.
—Mais ou menos — confirmou Brianna com uma leve gargalhada. —Digamos que existe um território comum, que vou trabalhar para que Colton e eu o descubramos. Se os homens como diz o livro, definem o romance como uma troca sexual, penso em me assegurar que ele saiba que sou muito romântica. Eu me recuso que meu marido olhe para outra por me considerar aborrecida na cama.
— É uma idealista sem esperança. Homens como Rolthven não caem de joelhos e se declaram loucamente apaixonados. —Arabella meneou a cabeça. — Não precisam Bri.
Brianna tinha descoberto que o mundo privilegiado em que se educou e que seu marido se movia apresentava certos problemas. Por isso a aquisição secreta.
— Minha irmã e o marido dela têm um matrimônio muito feliz — disse esperando não expressar melancolia. —Deveriam vê-los juntos. Às vezes se limitam a trocarem um sorriso, mas o afeto é óbvio. Henry a adora e Lea se casou com ele apesar dele não ser mais que um advogado. Meus pais não queriam, mas minha irmã estava apaixonada e a verdade é que seu modesto lar é um dos meus lugares favoritos para visitar. Eu gostaria que em minha casa houvesse o mesmo calor.
Era um tanto inadequado dizer que a mansão londrina de Colton era uma casa. Uma residência palaciana talvez, mas uma casa ou um lar. Bom, não. E Rolthven, a propriedade campestre, era maior ainda.
Talvez Brianna fosse uma idealista.
—E que outras coisas diz lady Rothburg? —Parecia que Rebecca tinha mais que um interesse superficial.
—Asseguro que é nada do que nós deveríamos ler e muito menos repetir. Esse livro — afirmou Arabella, apontando Brianna com a colher de forma eloquente — é algo que duvido que seu lindo, mas respeitável marido gostaria que tivesse. Parece-me incrível que o encontrasse nessa loja pouco confiável e muito mais que o comprasse.
Era verdade. A obra de lady Rothburg havia sido proibida há uns dez anos atrás, quando se publicou pela primeira vez. Brianna ficara intrigada com aquele exemplar maltratado, e assim que o abriu soube que essa compra secreta tinha sido uma decisão acertada.
—É dos mais instrutivos e está em benefício exclusivo de nosso matrimônio. Por que deveria se importar que eu o leia? —perguntou com muita calma.
—Porque é escandaloso, trata somente de sedução e de comportamento indecoroso, e está escrito nada menos que por uma notória cortesã — disse sua amiga com melindres.
Aquilo era certo. Colton ficaria indignado se soubesse que ela possuía aquele livrinho e se limitaria a ordenar que se desfizesse dele imediatamente.
Impassível, Brianna se inclinou para pegar um bolo de limão de uma bandeja do carrinho de chá.
—Pode ser que sim, mas pelo visto gostou do conselho que dá o primeiro capítulo. —Deu uma mordida no doce, mastigou com muito refinamento, engoliu e acrescentou: — E deveriam ver o que sugere o segundo capítulo.

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