Capítulo 14

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Quando você e seu amante estiverem familiarizados com os desejos e necessidades mútuas, terá chegado o momento de surpreendê-lo, de confundi-lo, e de fazer com que perceba que conhece somente uma parte de sua mulher. Toda vez que tentar algo novo descubra seu desejo oculto mais profundo, ou satisfaça uma fantasia concreta. Porque os homens as têm, talvez mais do que as mulheres.
Do capítulo intitulado «Utilizar os segredos em seu proveito»

O destino devia estar divertindo-se as suas custas, pensou Robert abatido. Havia feito aquele comentário cínico sobre as senhoritas inábeis com o piano e agora estava ali, escutando uma das interpretações mais sublimes, de uma jovem muito bonita e com um enorme talento.
Não podia afastar os olhos de Rebecca, inclinada sobre o teclado com o rosto sereno. Como estava entre o público, tinha uma desculpa perfeita para estudar a elegante postura de seu corpo torneado, o perfil simétrico de seu nariz, e a suavidade de seu cabelo negro e brilhante.
«Maldição.»
«Extraordinário» era a palavra que tinha utilizado na conversa com sua mãe. Ao ouvir Rebecca pela segunda vez tinha percebido que isso não a descrevia completamente. O seu dom era incomum, uma habilidade única que cativava o auditório como todo mundo na sala, incluindo o mais ignorante e inepto para a música, todos tinham deixado de respirar. Ninguém tossia, nem pigarreava e nem sequer se moviam na poltrona.
Até a esse ponto era boa.
Robert se obrigou a lembrar de qual era a situação real. Rebecca acabaria casando-se com algum homem afortunado e talvez, se ele permitisse, tocaria de vez em quando para um público reduzido como o presente, o mundo nunca teria o prazer de apreciar sua genialidade.
Era uma pena, na opinião de Robert, mas o certo é que ninguém tinha perguntado sua opinião sobre o assunto.
Tinha reconhecido todas as obras que Rebecca tinha interpretado durante a noite, salvo as duas últimas. Para estas não tinha utilizado partituras, e sua expressão passou de serena a contemplativa, e suas mãos graciosas se deslocaram sobre as teclas como se acariciassem um amante.
Tinha que acabar com esta imagem imediatamente e esta comparação, disse a si mesmo com veemência, quando ficou de pé ao terminar os aplausos, e se virou sem olhar, para oferecer o braço à mulher que estava ao seu lado.
Descobriu que era a senhora Newman, que lançou-lhe um olhar provocante com as pálpebras entreabertas e apoiou uma mão em sua manga.
— Foi muito agradável, não foi?
—Genial — disse ele com sinceridade.
— Você parecia absorto com a interpretação.
Robert falava, mas estava observando lorde Knightly. Esse tipo maldito escoltava Rebecca, e dizia algo que a fazia rir. Controlou-se, escutou o que a mulher que levava no braço acabava de dizer e fingiu um sorriso, esperando aparentar indiferença enquanto passavam pela sala de jantar.
—Parece que todos nós estávamos.
—Não tão absorto como você. —Ela pronunciou essas palavras com delicadeza, mas o inquiriu com o olhar. —Parecia um menino frente à cristaleira de uma loja de guloseimas.
Robert estava pouco habituado a ocultar o interesse — não, até aquela data nunca tivera que ocultar que uma mulher o interessava o que pelo visto não fazia muito bem.
—A senhorita Marston possui uma beleza rara. Tenho certeza de que todos os homens da sala a apreciaram.
Tinha certeza. E isso o incomodava.
— Talvez sim. —Loretta Newman levantou as sobrancelhas apenas para observá-lo, e ao chegar à mesa, com uma perspicácia maior do que Robert esperava e que o surpreendeu, disse: — você vai ter que tomar uma decisão. Vai me interessar ver qual.
Para que se incomodar em tentar negar?
— Interessará a mim também — murmurou, enquanto puxava-lhe a cadeira.
O jantar consistiu em uma variedade de pratos ainda mais esplêndidos que o habitual nos aniversários de Colton. Foi um banquete sofisticado e sem afetação, e se Robert estivesse com humor para apreciá-lo, teria aproveitado mais. No final, comeu com moderação, bebeu mais vinho do deveria e esperou com impaciência que tudo aquilo terminasse. Uma vez que as senhoras se retiraram e se serviu o Porto, relaxou um pouco. A angústia de ter Rebecca sentada do outro lado da mesa e justo na sua frente por infelicidade, fez com que o banquete parecesse interminável.
Quase não participou da conversa geral, e esteve bebendo o Porto com uma avidez perigosa. Talvez a noite terminasse logo se conseguisse aturdir-se. Sim, talvez no dia seguinte pela manhã não estivesse em forma, mas que demônios, agora mesmo tampouco era todo sorriso e felicitações.
Quando chegou o momento de passar para a sala de estar e se reunir com as senhoras, desculpou-se.
— Acho que vou ler um pouco.
—Ler? —perguntou Damien com uma risada cética. Inclusive Colton parecia confuso. Lorde Bonham levantou uma sobrancelha surpreso.
—Por todos os diabos, a julgar por sua reação diria que nunca tinham ouvido falar desse passatempo — resmungou Robert. —Estou cansado e gostaria de me retirar com um bom livro. Há algo errado?
— Absolutamente nada. —Damien sorriu. —Talvez encontre algo romântico nas estantes. Algo escuro, melodramático e gótico, de acordo com a expressão fúnebre de seu rosto.
A favor de Robert é preciso dizer que se absteve de incrustar o punho na mandíbula de seu irmão. Em vez disso, girou sobre os calcanhares e saiu da sala de jantar. Por sorte, o pai de Rebecca já tinha abandonado a sala e não presenciou a briga. Robert tinha a sensação de que se tanto Damien como Loretta tinham notado que estava interessado em Rebecca, talvez o seu pai também. Desde que sir Benedict e ele tinham chegado ao acordo tácito de evitarem-se, não houve o menor comentário, mas a outra noite no terraço, Robert tinha captado com perfeição a mensagem que Rebecca era território proibido.
Damien o seguiu. Ele entrou na biblioteca alguns minutos depois, e ao ver que Robert ia direto à garrafa de conhaque e não para as estantes, seu olhar adotou um ar mordaz.
—Embebedar-se não resolverá seu dilema.
—Eu tenho um dilema? —Robert despejou uma dose generosa em uma taça de cristal. —E se tivesse, seria assunto seu?
Seu irmão mais velho fechou a porta.
—Não, suponho que não. —Damien se aproximou para examinar um exemplar e passou o dedo sobre a capa poeirenta. — Talvez você devesse ler alguma tragédia grega. Ou uma obra de Shakespeare. A verdade é que age como o personagem de um drama infeliz.
—Já li quase todas, obrigado. Acredito que você também foi a Eton. E não tenho ideia do que está falando.
—Sim, ali costumavam incrustar os clássicos em nossos obtusos cérebros, não é?
Robert soltou um grunhido neutro. Estava um tanto bêbado, isso era certo. Dois bons conhaques deveriam ajudá-lo a manter a distância apropriada.
—Robbie, por que não a corteja? —Damien se virou, meneou a cabeça e cruzou os braços. — Por certo ouviu falar de cortejo. Flores, visitas no meio da tarde, um passeio a cavalo pelo Hyde Park com uma acompanhante, talvez um delicado poema com floridos louvores à deliciosa cor de seus olhos.
—Você se importaria de me dizer a quem diabo se refere?
Damien lhe lançou um olhar de aparente comiseração.
—Irritar-se comigo não resolverá nada e ambos sabemos de quem falo maldito seja.
Certo. Robert emitiu um suspiro entrecortado, e passou a mão livre pelo rosto, enquanto com a outra agarrava a taça de conhaque como se fosse uma tábua de salvação.
—Eu não desejo cortejar ninguém — disse pesaroso.
—Embora isso só o tempo dirá, no momento acredito em você. —Damien escolheu uma poltrona confortável perto da lareira e se sentou. Cruzou as pernas na altura do tornozelo e franziu o cenho. —Não deseja. Bem. Ao menos está disposto a admitir que pensou. É um bom começo. Sente-se e falemos disso.
—Há algum motivo para que o façamos? —Não obstante Robert se deixou cair na poltrona com uma expressão mal-humorada e magoada. —Se por acaso não

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