Capítulo 22

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Os mal-entendidos são inevitáveis. Quando menos o esperam, sairão à luz e confundirão a ambos. A forma como enfrentam cada um deles lhes dará a medida de seu afeto mútuo.
Do capítulo intitulado: «A arte da discussão»

Ele estava ali. Parecia incrível, mas a estavam seguindo.
De fato, a silhueta rondava a soleira da loja de tabaco, do outro lado da rua. Brianna, muito irritada e chateada, entreabriu os olhos e se perguntou se devia informar às autoridades. Afinal de contas, seu marido era um homem rico, e devia ficar alerta se por acaso alguém quisesse sequestrá-la.
Era o terceiro dia consecutivo que o via, e cada vez estava mais convencida de que esse estranho homem com um boné marrom xadrez a estava seguindo. A primeira vez que o viu foi quando esqueceu o moedeiro na carruagem; virou para sair correndo e com pressa, e quase tropeçou nele. Naquele momento não lhe deu importância, mas no dia seguinte havia tornado a vê-lo.
E ali estava novamente no outro dia, embora estivesse vestido de outra forma. Quando Brianna o localizou pela terceira vez, sua curiosidade se transformou em alarme.
Voltou a entrar na loja e perguntou à esposa do chapeleiro, uma mulher corpulenta que trabalhava na parte dianteira do estabelecimento, se havia uma saída traseira que pudesse utilizar. A vendedora se mostrou surpresa, mas lhe mostrou a porta traseira e aceitou umas moedas em troca de enviar um funcionário à rua, depois de uma hora mais ou menos, para dizer ao chofer da duquesa que retornasse para casa com o veículo. Na expressão da mulher, Brianna leu que os caprichos dos nobres e dos poderosos deviam ser aceitos com resignação, e saiu às escondidas do beco que havia atrás da loja, livre graças ao seu estratagema.
Não sabia se o artifício era necessário, mas estava grávida e a vida do filho que levava em seu ventre, mais real à medida que o tempo passava, era o mais importante do mundo. O prudente era ser cuidadosa.
Fazia um dia muito agradável, talvez um pouco frio, e no alto do céu azul celeste coberto levemente por nuvens. Quando já tinha andado bastante pela rua, esquivando-se de pilhas de resíduos imprecisos, Brianna entrou pela porta traseira da loja de tabaco, pediu desculpas ao sobressaltado proprietário e saiu novamente à rua.
Arabella vivia perto, junto a Rua St. James e o tempo já estava bom, seria agradável dar um passeio até o domicílio dos Bonham. Ao chegar ela soube com alívio que lady Bonham estava em casa. Depois de alguns minutos a conduziram a uma sala privativa no primeiro andar, e sua amiga ficou de pé para recebê-la.
—Bri, estou contente que tenha vindo.
Brianna forçou um sorriso.
—Sinto aparecer de repente, mas me pareceu conveniente.
—Conveniente? —Arabella apontou uma poltrona e franziu o cenho. —Que palavra curiosa.
Brianna se sentou. Embora já tivesse se acostumado aos enjoos, de vez em quando tinha náuseas.
—Poderia pedir que me trouxessem uma xícara de chá leve?
—É obvio. —Arabella chamou com o sino. —É o menino? Por Deus, de repente ficou pálida. Precisa se deitar?
—Um pouco de chá me fará bem — assegurou Brianna. Quando chegou a infusão, bebeu com vontade, depois esperou que a náusea passasse e disse com um sorriso algo chorosa: — É que estou um pouco chateada. Ainda bem que está em casa.
Durante o passeio tinha tido uma suspeita muito desagradável, e precisava falar com alguém.
Arabella parecia preocupada.
—Qual é o problema? Isto não é próprio de você de maneira alguma.
—Nem sequer sei por onde começar. Nem se devo começar.
Aquilo fez com que sua amiga pestanejasse.
—Por favor, escolha um jeito. Está fazendo rodeios.
—Não é o que pretendo, mas pelo visto é assim que está minha vida ultimamente. —Brianna deu outro gole e se sentiu bastante revigorada para deixar a xícara do lado. — Disse ao Colton que vamos ter um filho.
Arabella fez um gesto de aprovação.
—Imagino a felicidade de seu marido.
—Era de se esperar que se mostrasse feliz.
A condessa de Bonham franziu o cenho.
—O que significa isso? É feliz, não é verdade?
—Ele disse. —Brianna olhou para uma das janelas com painéis e reprimiu o pranto. —Ele diz que sim. Mas eu não estou certa. Trata-me de um modo diferente. E agora isto.
—O que quer dizer com «isto»? —perguntou Arabella, depois de um momento.
—Estão me seguindo. Pelo menos eu penso assim. Um homem horroroso com um boné marrom. Eu o vejo de vez em quando, e embora seja verdade que as coincidências ocorrem na vida, não acredito que seja isto.
—Não entendo.
Brianna meneou a cabeça.
—Eu tampouco entendo, mas digo que não me surpreenderia que Colton tivesse algo a ver, considerando o mau humor que está estes dias. Tem feito umas perguntas muito estranhas, e se comporta como se estivesse encantado com o menino, e ao mesmo tempo não. Ah, não o estou descrevendo bem, mas basta dizer que não sei o que fazer com tudo isto. Por que meu marido mandaria alguém me seguir?
Arabella abriu a boca para responder, mas ficou assim um momento e a fechou de repente. Logo se ruborizou, desviou o olhar e ergueu os ombros.
Brianna observou o processo com interesse. Continuava com o estômago revolto, provocado por sua agitação interna.
—O que foi? —Perguntou com a franqueza e a familiaridade de uma velha amiga. —Se souber de alguma coisa diga-me, por favor.
—Eu não sei de nada, e suponho que não me surpreende que não tenha ocorrido a você, porque tampouco me ocorreu, mas talvez possamos nos aventurar a uma conjectura. —Arabella virou-se, com expressão decidida. —Rebecca me emprestou o livro quando terminou, sabe?
Brianna assentiu. Não era necessário esclarecer ao que se referia com «o livro». Os conselhos de lady Rothburg.
O livro.
—Continuo sem acreditar que nós três o lemos. Nossas mães morreriam de susto. Mas. Eu. Ai, querida, não há uma forma delicada de dizê-lo, eu.
—Bela, adoro você, mas fale de uma vez antes que eu grite.

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