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Ícaro

E aí Dona Laura? — entrei na casa da minha mãe e ela estava vendo novela na sala.

— Que milagre tu aqui — me olhou por poucos segundos e voltou sua atenção para tv.

— Tem comida por aqui? — fui para cozinha e as panelas estavam recheadas, me servi e voltei para sala onde minha mãe está.

Comi enquanto ela assistia a sua novela, nem dava atenção pra mim e eu ria disso, minha mãe sempre foi assim, toda preocupada comigo mas fingi que tá pouco se fodendo pra mim! Ela teve que me criar sozinha, engravidou cedo, 15 anos, e o babaca que deveria ser meu pai fugiu das responsabilidades, tudo que eu sei é que ele era um vapor aqui no morro há muito tempo atrás, viu a novinha e logo se engraçou, mas quando engravidou não foi capaz de assumir, minha mãe foi expulsa de casa, seu pai era um homem filho da puta que não queria filha envolvida com bandido muito menos grávida, mas minha avó entendia sua filha, e mesmo fora de casa ajudou ela, escondida do marido, dava comida e dinheiro para ela pagar a casa onde minha mãe foi morar quando saiu da casa dos pais! Mas quando eu nasci ela precisou arrumar um emprego, sem escola ela só conseguiu trabalhar fazendo faxina, sempre trabalhou duro, para pagar as contas e nos sustentar! Quando eu completei 11 anos entrei pro tráfico, eu precisava ajudar minha mãe, não ia ficar parado vendo ela sofrer sozinha, eu larguei a escola e comecei como aviãozinho, sempre fui dedicado e consegui subir até Gerente-geral da Maré, acima de mim só o dono, que agora é o Barão.
Entrei pro tráfico por necessidade e porque é isso que eu cresci vendo no morro, é esse o destino que eu aprendi desde cedo, a falta de condições e o preconceito fora do morro sempre me mostrou que o melhor era seguir por aqui, e eu não me arrependo, esse é quem eu sou! Minha mãe odiou a ideia desde o início, mas com o tempo ela se conformou, hoje consigo dar uma vida digna para ela, e isso é tudo que eu queria! Minha mãe é a pessoa mais importante da minha vida, minha rainha, única pessoa que eu tenho no mundo! Sem esquecer o Gui, meu parça desde sempre, é como um irmão pra mim, começamos juntos e subimos juntos, sempre foi nós, no lixo e no luxo.

Sobre uma fiel? Não, não tenho, não quero e nunca terei, esse negócio de amar só acaba com a gente, tu se apaixona e a pessoa acaba com tu, faz merda, como o filho da puta do meu progenitor fez com a minha mãe, por exemplo, ela se entregou e ele fez o que fez. Então meu lema é pegar e não me apegar, assim todo mundo sai ganhando! Eu transo e pronto, esse negócio de amor só dá certo em novela!

[...]

— Tô indo hein — depositei um beijo rápido na testa da minha mãe.

— Se cuida menino — olhou pra mim por um instante e eu assenti saindo.

Meu destino era minha casa, precisava dormir e descansar, amanhã é outro dia, preciso estar novinho em folha! Decidi morar separado da minha mãe por segurança, sempre tem alguém cuidando dela 24 horas por dia, eu vou pra lá sempre que posso, mas é bom que ela esteja no seu canto para evitar que alguém tente fazer mal a ela para me atingir, poucos conhecem minha mãe, no caso só o Barão e o Gui. O Gui é como um irmão pra mim, meu parceiro há muitos anos, mas o Barão também sempre foi um grande amigo, não me virou as costas nunca, quando eu precisava ele sempre me apoiava, sabe de onde eu venho, conhece minha história e sempre me deu força, diferente de mim ele sempre teve tudo, herdou isso aqui do pai dele, o antigo dono do morro.

— Lar doce lar — disse baixo me jogando na minha cama que aguardava por mim.

Quando me deitei na cama minha mente ficou viajando até que apareceu nela a imagem daquela mulher, a tal de Iara, oh vadia gostosa do caralho.
Balancei a cabeça para tentar espantar esses pensamentos, não sou homem de ficar pensando em vadia, tenho mais o que fazer, mas que ela senta pra caralho disso não há dúvida, e eu vou querer repetir, até me cansar! Mas não será nenhum esforço mesmo, elas sempre vem atrás, ainda mais que eu não dei grana pra ela na primeira vez, ela virá atrás para conseguir algum benefício, são todas assim, ficam com os mais poderosos por grana e status, e eu não vou negar, não vou dispensar uma boa transa! O que são 200 ou 300 reais comparados a uma noite de sexo, e dos bons.

[...]

Tive insônia, não consegui dormir a noite toda, quando dei por mim já eram 5 da manhã, tentei dormir mesmo assim, se eu fosse pra boca assim não adiantaria de nada, eu não iria conseguir trabalhar! Consegui e dormi por umas 4 horas, acordei e tomei um banho rápido, me arrumei e saí, vou tomar café da manhã na rua, moro sozinho e não sei cozinhar, então se não vou na minha mãe como no cantinho da dona Jú, ela faz umas comidas gostosas e o local é até bem famoso por aqui.

[...]

— Saiu cedo ontem — Gui me olha curioso.

— Tava resolvendo uns negócios — continuei vendo as contas.

— Esses negócios aí usam calcinha nem viado — riu e eu olhei pra ele, balancei a cabeça em negação mas também acabei rindo, na verdade não há como não rir, é cada merda que sai da boca desse maluco que só Deus mesmo.

— Me deixa trabalhar, e tu devia fazer o mesmo — continuei fazendo meu trabalho, na verdade tentei, porque ele não deixava.

Depois que sai da churras ontem acompanhando Iara acabei não voltando mais e fui na minha mãe, e eu não sou de sair tão cedo da casa do Gui por isso ele estava estanhando, mesmo ficando com alguém, eu sempre volto pra festa, nem sei porquê acabei levando aquela garota pra casa!

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Eu, Você e o MorroWhere stories live. Discover now