Capítulo Treze

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Victor Decker:

Passaram-se dois dias desde a visita à informante de Grimalkin, e a maior parte desse tempo foi gasta tentando, sem muito sucesso, ir além das palavras dela.

Ainda sentia como se estivesse deslizando superficialmente pelas sombras, incapaz de alcançar a profundidade oculta do mundo. Isso tornava difícil aprender como navegar, como lutar e como explorar as nuances do mundo sombrio que estava à minha volta.

Agora, estava no porão do prédio de Caroline, praticando esgrima há horas com Caleb, que parecia perdido em pensamentos.

Ambos tínhamos segredos. Ele não sabia sobre os meus poderes do mundo das sombras, e eu não tinha certeza de quanto ele sabia sobre sua própria herança. Isso estava nos separando cada vez mais.

— Caleb, o que você acha que a Magnólia queria dizer com "ver através das sombras no momento certo"? — perguntei, procurando respostas mesmo que já soubesse do que se tratava.

Ele suspirou e me olhou com uma expressão neutra.

— Havia rumores de que era possível controlar objetos, ver o que estava oculto nos mundos e manipulá-los livremente através do reino das sombras, ou seja, o mundo oculto criado pelas sombras em cada lugar. — Caleb explicou, e sua espada desapareceu enquanto ele parecia mergulhar em pensamentos profundos. — Alguns diziam até que meu pai possuía essa habilidade, mas eu nunca consegui confirmar se era verdade.

Olhei para ele com atenção. Seria mesmo possível? Ambres, o Rei das Sombras, poderia ter o poder de controlar os próprios elementos sombrios do mundo? Isso abriria possibilidades sombrias e terríveis, como criar exércitos feéricos sombrios que surgiriam no meio da noite, prontos para espalhar caos e destruição. Um pesadelo que eu nem gostaria de imaginar.

— Isso seria algo aterrorizante — murmurei, sentindo um arrepio percorrer minha espinha, enquanto tentava empurrar esses pensamentos sombrios para longe.

— Bem, era apenas um rumor, afinal. — Caleb disse, dando de ombros.

— Então, não podemos afirmar com certeza se isso era verdade ou apenas uma especulação vazia. Tudo é possível nesse mundo. Afinal, existem até fadas que podem tocar no ferro. — Comentei. — Talvez seja possível, e você tem a capacidade de realizá-lo. Afinal, você é filho do Rei das Sombras, deve possuir inúmeras habilidades.

Ele pareceu atordoado e me encarou com espanto.

— O que você acabou de dizer? — ele perguntou, e, dessa vez, a confusão era minha. Caleb balançou a cabeça. — Deixe pra lá.

Ele se virou e saiu, me deixando confuso e frustrado.

— Você falou como se fosse o próprio Rei das Sombras — ele murmurou e riu secamente. — Isso é quase uma loucura.

Eu não respondi.

Nos últimos dois dias, eu tinha conseguido, de alguma forma, tocar nos pensamentos de Ambres. Era mais intenso durante a noite, mas durante o dia, tudo o que eu recebia eram lampejos ocasionais que duravam apenas alguns segundos. Era como se cada pensamento de Ambres se tornasse uma versão distorcida dos meus próprios pensamentos.

Eu podia ouvir sua voz em minha mente, o jeito como ele falava sobre Caleb, as imagens e sensações das inúmeras vidas feéricas que ele destruíra e aniquilara. No fundo, havia um sentimento de pavor de que seu plano poderia não dar certo, como se soubesse que, ao me trazer para este mundo, ele estava selando seu próprio destino. No entanto, ele escolhera seguir esse caminho, apesar dos riscos.

Também vi flashes das suspeitas de Caleb de que Ambres e Conrad planejavam matá-lo para que ele pudesse assumir o trono das sombras. Para Ambres, Caleb era alguém disposto a ferir qualquer um para alcançar seus objetivos.

Parte de mim sabia que Caleb estava errado, mas uma pequena voz no fundo da minha mente me dizia para tomar cuidado com ele. Seria possível que Caleb pudesse me trair?

— Como está se sentindo vivendo no mundo humano? — perguntei a Caleb, tentando manter minha mente afastada de pensamentos sombrios.

— Para ser sincero, odeio este lugar — Caleb disse com um suspiro. — Victor, não quero dizer nada, mas tudo aqui é terrível. As pessoas são obcecadas por esses dispositivos móveis, as roupas são desconfortáveis e excessivamente brilhantes, e tudo é sufocante. — Ele suspirou e me olhou com intensidade. — Tenho certeza de que nunca vou me acostumar a este mundo. Parte de mim deseja voltar para Nevernever e viver como uma fada selvagem, mas há uma parte de mim que começou a se apegar a este lugar, e sei que, se for embora, nunca mais verei você.

Seus olhos estavam fixos em mim enquanto ele falava, e havia algo na intensidade de seu olhar que me deixava um pouco triste ao perceber o que ele estava começando a sentir.

— Caleb... — Comecei a dizer.

— Vamos apenas manter o foco na missão — ele interrompeu. — Agora preciso encontrar alguém com quem tenho contatos.

Ele se afastou sem dizer mais

nada e desapareceu nas sombras, me deixando sozinho com minhas próprias dúvidas sombrias.

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Quando saí do porão, Caroline veio ao meu encontro animada.

— Que tal irmos a uma festa esta noite? Você realmente precisa disso, e Caleb também. — Caroline disse, exibindo um convite elegantemente decorado com seu nome.

— Quem em sã consciência daria uma festa na situação atual? — perguntei, cético. Ela sorriu de maneira igualmente cética.

— Feéricos são realmente imprevisíveis — ela respondeu e apontou para o local onde a festa seria realizada no convite. — E adivinha? Não é o mesmo lugar onde ocorreu o ataque!

— É verdade. Parece ser uma boa ideia. — Concordei, começando a enxergar a entrada da festa através do convite. — Vou fazer o que a magnólia disse e encontrar o local. Vou chamar Pauline, hoje vamos nos divertir, e você pode procurar a entrada da toca.

Caroline me arrastou para fora do elevador, animada, talvez acreditando que era uma boa forma de aliviar a tensão. Mas antes de qualquer coisa, eu precisava dominar meu controle sobre os poderes das sombras.

Passei o resto do tempo no meu quarto, praticando. Fechei as janelas e criei uma luz mágica, permitindo que as sombras dos objetos preenchessem o ambiente. Concentrei-me, deixando a magia fluir pelo meu corpo, permitindo que a aura das sombras se fundisse comigo. Minha mente se tornou um turbilhão de pensamentos, com as memórias de Ambres e seu poder invadindo meus pensamentos, ameaçando tirar meu controle.

Vi as imagens de Ambres conspirando contra qualquer feérico que não fosse do reino das sombras, tirando informações de sua própria corte, agindo com crueldade quando alguém falhava em suas expectativas, sem um pingo de remorso pelos corpos que caíam sob seus pés. Cada criatura enganada e morta sem qualquer vestígio de compaixão.

Abri os olhos com força, ofegante, vendo a luz mágica cintilar e depois se apagar abruptamente, deixando-me encarar a escuridão vazia. Tentei novamente, esvaziando completamente minha mente, lutando para manter afastados os pensamentos de Ambres que ameaçavam se infiltrar. Os poderes eram meus, não deles.

Na escuridão, as sombras se moldaram conforme minha vontade. Dirigi-me ao guarda-roupa, concentrei-me e alterei sua forma para a de um pequeno urso de pelúcia.

Com os olhos abertos, vi o guarda-roupa encolher e assumir a forma de um urso de pelúcia. Repeti o processo e puxei a sombra até mim, fazendo-a se materializar em minha mão.

Coloquei-a de volta no lugar e a reverti à forma original. Pulei de alegria. Havia feito tudo o que precisava fazer.

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Até a próximo 😘

Anjo das sombras | Livro 2: Mistérios de CambridgeWhere stories live. Discover now