2 Ser asqueroso

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Sabrina e Micaella eram pessoas incríveis, em apenas um dia conseguiram me deixar feliz, sentia que já as conhecia a anos. Elas fizeram do meu primeiro dia de trabalho, o melhor que já vivi em muito tempo, nem dava vontade de voltar para casa e dar de cara com Henrique.

- A gente pode trocar número de telefone, pra bater um papo e ver status, o que acha?- Sabrina perguntou mas já puxando o aparelho que estava na minha mão.

- Acho ótimo.- sorrir para ela.

- Então está aqui,me manda um oi pra eu salvar o seu também.

- Claro.

- Você é casada não é?

- Sim.

- Mas você parece ser tão nova, quantos anos você tem?

- Dezenove.

- Nossa, ainda é mais nova que eu.

- Casei com quinze anos, mas se tivesse dado ouvidos aos meus pais nunca teria feito isso.- Meio que desabafei com a minha colega.

- Entendo, mas nunca é tarde para seguir bons conselhos.- ela piscou um olho para mim e saiu.

O único lado  ruim do emprego era ter que lidar com todo o tipo de pessoa. Nem todas eram amigáveis e simpáticas como o Pedro, algumas faziam questão de me encarar de cima abaixo e serem esnobes, como se isso fosse uma qualidade. Mas eu colocava um sorriso no rosto e dava o meu melhor no atendimento, aquilo não era pior do que o inferno que vivia em casa.

- Hora do almoço gente.- Mica chamou indo em direção quando voltou da área externa da loja, pois havia ido buscar as marmitas.- Débora, você gosta de filé de peixe empanado? Era pra eu ter perguntado antes, mas esqueci.

- Gosto sim.

- Ótimo, então vamos comer pra dar tempo de descansar um pouco.

- Isso mesmo chefinha .- Sabrina se aproximou toda saltitante.

Dona Célia,mãe de Mica se juntou a nós em seguida. A mais velha era doce assim como a filha, logo quando ela chegou a loja, me deu um abraço e apertou minha bochecha.

- Que foi isso no seu pulso?- dona Célia era bem observadora, tinha que tomar cuidado com ela.

- Me machuquei em casa.- tentei esconder as manchas, colocando meus braços embaixo da mesa. Mas isso entregou minha mentira, porque as outras duas mulheres me olharam desconfiadas.- É sério gente, sou um pouco desastrada.

Elas fingiram não se importar mais, porém notei que hora ou outra me olhavam com certa pena e encaravam minhas marcas roxas. Ah se elas soubessem que tenho mais marcas, mas essas não podem ser vistas a olho nu.

O restante do dia fora agradável, as oito horas fechamos a loja, mas ainda ficamos no local para fazer a limpeza e esperar Mica fechar o caixa. Sabrina e eu fomos juntas para o ponto de ônibus,onde cada uma esperaria o seu.

- Isso é hora de você chegar? Quase dez da noite!- Henrique estava irritado e com certeza bêbado.

- A loja fecha às oito e ainda tive que limpar, esperei o ônibus que você sabe que demora.

- E por causa desse empreguinho de merda, eu fiquei sem jantar?

- Você têm mãos e com certeza deve ter dinheiro,já que mal paga as contas de casa tem um tempo.

- E daí? Você é a minha mulher, você tem que cozinhar.

- Eu sou a sua mulher, não a sua escrava, mas fica tranquilo, vou fazer seu jantar.

Não queria discutir de novo e muito menos ficar marcada dos machucados que ele poderia fazer mim. Tinha que seguir com meu plano que era esperar meu primeiro salário e meter o pé.

- Isso mesmo, é pra isso que você serve.

- Com certeza, posso saber onde você estava ontem a noite e essa manhã?

- Não é da sua conta Débora.

Apenas lavei as mãos e fui para a cozinha. Coloquei o arroz na panela e procurei na geladeira se havia alguma mistura e parece que ele tinha ido ao mercado, pois havia alguns pratinhos de carne ali.

- Quero suco também, tem polpa no congelador.- Henrique gritou da sala.

- Tudo bem.- respondi.

Não sei porque me sujeitei a isso tanto tempo, viver com um cara que nem me dava valor e me tratava mais como uma empregada do que como esposa.

- Já que começou a trabalhar, vamos dividir as despesas de casa.

Tava demorando.

- Certo .- concordei.

- A energia, água e compras do mês são com você.

- E você paga o quê?

- O carro já me dá muitas despesas.

- Isso não é justo e meu salário não vai dá pra pagar tudo.

- Se vira, não quis arrumar emprego? Agora vai arcar com as despesas da casa.

Engoli seco e preferi não dizer nada, era inútil discutir com ele.

É nessa hora que agradeço por não termos casado no papel, só imagino o quão burocrático seria pra tirar o nome desse ser do meu.

- Qualquer dia desse passo no seu trabalho pra ver se está trabalhando mesmo.

- Vai me vigiar mesmo?

- Vou.

Henrique se levantou da mesa de jantar e foi para a sala deixando toda a bagunça da cozinha comigo. Uma lágrima grossa escorreu de meus olhos, molhabdo minha bochecha. Estava cansada disso tudo.

Arrumei tudo e já deixei o jantar do outro dia adiantado, para que não me cansasse tanto quando chegasse do serviço.

Tomei um banho gelado, molhando da cabeça aos pés,relaxando meu corpo por inteiro, para talvez assim ter uma noite de sono um pouco tranquila.

- Você tá precisando emagrecer um pouco, tá tomando conta da cama quase toda.- Lá vem ele com essas piadas ridículas sobre o meu peso.

- Legal.

Sempre fui gorda, acho que desde que me conheço por gente, quando ele me conheceu, eu já era assim e mesmo assim ele quis ficar comigo, dizendo que gostava de mim do jeito que eu era. Mas no segundo ano de casamento, as piadas infames começaram, junto com toda a violência psicológica. Acho que se meus pais aceitassem falar comigo novamente, me livrasse de Henrique de uma vez por todas.

- Eu falo sério e você age como se fosse brincadeira, mas talvez tenha sido a sua gordura que tenha matado nossa filha.

Tinha vários pontos fracos, mas falar de Mariana, era como se tivesse enfiando uma faca em mim. Minha filha era tudo de bom que eu poderia ter na vida,e a perda dela era tão recente que doía muito. Henrique nao tinha o direito de falar de uma criança que nem tinha vindo ao mundo com vida.

Peguei meu lençol, um travesseiro e fui dormir na sala, no velho sofá. Era melhor que dividir a cama com aquele ser asqueroso.
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Segundo capítulo postadinho, só para saberem um pouco mais da vida da nossa Débora.

Deixem uma estrelinha e um comentário, ajuda no incentivo e no crescimento da obra.

Salvação// Pedro Guilherme✅Where stories live. Discover now