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- Vó?! - chamei vovó, com o coração super acelerado. Se eu não falasse naquele momento, eu perderia a coragem.
- Vovó? - será que ela não estava em casa ?
Fui andando até a cozinha, até que comecei a escutar vozes entusiasmadas.
- Oh, que coisa maravilhosa. É claro que eu vou! Quem? Jade? Ah, não se preocupe padre. Jade já completou 18 anos, vai se virar bem sozinha, mesmo que seja um período longo. Eu me sinto honrada por ter sido escolhida, padre.  Sim, sim, irei fazer os preparativos. Mais uma vez, obrigada.
Vovó estava igual a uma criança ; dava pulinhos e falava sozinha andando de um lado para o outro na cozinha. Quando apareci no batente da porta, vovó deu um gritinho de susto.
- Jade, você não vai acreditar querida ! - ela me olhou esbaforida, como se tivesse corrido uma maratona. Os olhos verdes estavam arregalados, os cabelos grisalhos desfeitos do coque, que serviam só pra emoldurar seu rosto fino. Vovó era bem morena, herança mistura de nossos antepassados  mexicanos e americanos,  e tinha uma estrutura magra, mas era forte.
- O que? Ganhou na loteria?
- Não querida. O Padre Colin selecionou as 10 irmãs de Cristo mais fiéis da igreja para ir visitar a Basílica de Nossa Senhora Aparecida, no Brasil. Não é fantástico? - Contou vovó com os olhos marejados.
- Nossa vó, parabéns! Isso se deve a todo o seu empenho à nossa igreja e à sua fé. Que orgulho da senhora.
- Sim querida . Parece que a igreja ganhou uma grande doação de um senhor muito rico, em prol da nossa obra, e ainda por cima onze passagens de ida e volta para a excursão.
- Nossa, que... caridoso. - As vezes, algumas pessoas de idade ricas não tinham ideia do que fazer com seu dinheiro. - Que Jesus abençoe a essa senhor grandemente.
- Amém.  Vamos ficar  por lá seis meses.
- Seis meses ?! É uma excursão ou a sra vai se mudar de vez para lá ? Por que todo esse tempo ?
- Porque vamos passar pelo Rito de Purificação, uma verdadeira comunhão com Deus.
  O Rito de Purificação era um ritual que existia em nossa igreja. Durante seis meses, a pessoa jejuava de seis da noite até às seis da manhã, nesse mesmo período se rezava todos os dias o pai nosso e ave Maria com um terço, pedia perdão frequentemente aos irmãos, e fazia caridade em forma de projetos sociais.
- A senhora vai ficar seis meses no Brasil?
- Oras, você vai ficar bem. Nossa cidade é super segura, e você tem a pensão de sua mãe.
Eu até pensei em debater, mas quando liguei os pontos, de que vovó estaria seis meses fora, e eu não iria precisar inventar alguma história doida do que eu faria em todas as sextas, pelo menos por seis meses, eu até a encorajei.
- Vovó, receba esse chamado do senhor. A senhora foi privilegiada.
- Sim querida, eu sei.
- Quando a senhora vai ?
- Na próxima sexta, às cinco da tarde.
Que coincidência.
- hum, ok. A senhora quer ajuda para arrumar as malas ?
- Não não querida, pode deixar comigo. Não posso esquecer absolutamente nada, então vou começar os preparativos.
Vovó subiu as escadas correndo, igual a uma criança muito empolgada com seu brinquedo novo.

                               ~ 🐍 ~

A sexta chegou, e com ela , de um lado o entusiasmo da minha vó, e do outro , o meu nervosismo. Pesadelos constantes me atormentavam, junto com a ansiedade. Hora eu estava com medo, achando que iria acontecer alguma coisa muito ruim comigo, como tráfico de pessoas ou até o pior; hora eu estava ansiosa para que chegasse a sexta. Uma espécie de adrenalina percorria meu corpo, e os pensamentos mais pecaminosos brotavam em minha mente. Como será beijar o Andy? Será que ele vai tomar a iniciativa ? Será que ele vai me convencer a fazer sexo com ele? Ou será que ele vai me sacrificar em um altar para alguma entidade maligna? Eu estava passando por uma avalanche de emoções, tanto boas quanto ruins. Como tive educação religiosa, sentia que traía a Deus tendo esses tipos de pensamentos. Eu namorei apenas um garoto na minha vida, com 16 anos ; o nome dele era Justin. Ele até era uma boa pessoa, mas éramos ambos inexperientes, e eu tomei trauma de sexo, fim. Eu realmente achei que só voltaria a fazer quando me casasse com um homem temente a Deus, que me amasse e respeitasse, e que seria muito carinhoso. Agora, para ser mais precisa, desde o meu aniversário, eu só penso em uma coisa : ele. Imaginava a todo momento em como seria o sexo entre nós, aquelas mãos longas passeando pelo meu corpo, em como seria sua língua... lá. Urgh, estou parecendo uma adolescente fantasiando coisas. Às 15h, levei vovó até a igreja, e de lá ela tomou um ônibus até o aeroporto. Todos nós rezamos com o padre Colin ,pedindo a Deus uma boa viagem, e que a purificação dos membros que estavam indo ocorresse de forma sincera. Eu estava feliz pela vovó, dava pra ver a felicidade estampada no olhar dela. Me despedi demoradamente, eu a amava. Voltei para casa às 18:30h , tomei um  banho e sentei de frente ao espelho. O que vestiria? Batom vermelho ou um mais suave ? Com perfume ou sem ? Enfim, emoldurei os cachos soltos em volta do rosto; hoje eles estavam do jeito que eu gostava, com volume e os cachos bem definidos caindo em cascatas pelas costas. Optei pelo batom vermelho sangue, apliquei duas vezes um rímel nos cílios para dar a impressão de que eram mais longos, fiz um delineado gatinho para destacar meus  olhos verdes.  Dei um pouco de cor às bochechas com um blush e uma pincelada de leve com iluminador.  Eu tinha um vestido midi justo com mangas de tule bufantes de cor preta que nunca havia usado, ainda com etiqueta da loja guardado no armário. O vesti e o caimento ficou muito bom, terminava logo acima do joelho, abraçando minhas curvas igual a um amante. Finalizei com um salto preto de tiras que cruzava em meus tornozelos.  O resultado ficou : Uau!! Eu não estava me reconhecendo. " Acho que o batom vermelho ficou demais ", encarei meu reflexo, pensativa, mas acho que combinava com a ocasião. Às 20h em ponto eu estava aguardando, olhando pela janela da sala pra ver se algum carro ou alguém chegava. 20:10h ninguém havia chegado, e Andy me falou que nao tolerava atrasos, portanto acho que ele tinha desistido da ideia, pensei com uma mistura de alivio e decepção. 20:20h desisti de esperar e me levantei para trocar de roupa quando um Bentley de cor negra estacionou na calçada. Dava pra escutar as batidas do meu coração a duas quadras da minha casa. Encarei fixamente, sem acreditar(ou sem querer me iludir). Desligaram os faróis do carro como se estivesse me esperando. Fui em direção a porta e encostei na maçaneta da porta, pensando seriamente se eu iria fazer aquilo mesmo. Eu não era Kayla, eu era a Jade; a menina estudiosa, que foi criada por avó, que era cristã, que frequentava a igreja frequentemente. Eu não costumo  fazer essas coisas, na verdade nunca me aventurei com quase nada na vida, e eu não estava me queixando, eu gostava da forma em que eu era. Não sei o que me levou a abrir a porta , e ficar estatalada do lado de fora, sem coragem de ir em direção ao carro. Acredito eu que o motorista também sabia que, se dependesse de mim ficaria estacionado a noite toda. O mesmo homem que me agarrou pelo braço na boate e me meteu nessa confusão desceu de terno preto. Seus olhos eram enigmáticos, não revelavam nada.
- Senhorita Jade ? Poderia me acompanhar por favor?
Andei em direção ao carro enquanto ele abria a porta traseira para que eu entrasse. O carro era espetacular, sofisticado  e caro. Bem caro. Pesquisei na internet pelas descrições, e o Google me informou que aquele era um Bentley Flying Spur Hybrid 2020. Revestido de couro com três cores diferentes e console central com acabamento em verniz, o carro era conforto puro. Uma garota podia se acostumar a isso. Fiquei tanto tempo admirando os detalhes luxuosos que nem percebi estarmos em movimento.
- Qual é o seu nome , senhor ?
Seus olhos me olharam através do retrovisor, e ele nada respondeu.
- Senhor ? Eu ficaria mais confortável se eu soubesse o seu nome.
- Não dou meu nome a ninguém, srta Jade. Você pode me chamar de Lamar.
- Quem se chama Lamar , pelo amor de Deus?
- Poderia evitar falar esse nome aqui ? Atrai má sorte.
- Qual nome? Lamar ? Então porque eu devo lhe chamar desse nome se você não gosta?
- Deixe pra lá, ok? Apenas... aprecie a vista, ou faça alguma coisa que vocês fazem, hum.. 
Lamar teve uma crise de tosse, mas logo passou. Sua face ficou vermelha, e ele me olhou como se pedisse desculpas.
- Você é estranho,Lamar.

AndrasWhere stories live. Discover now