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Cheguei em casa e orei a Deus, ajoelhada no chão do meu quarto. A culpa ameaçava me engolir inteira. Em 24h naquele lugar, fiz coisas que nunca imaginei que teria coragem. Primeiro, dormi na casa de um homem que eu mal conhecia; várias coisas poderiam ter acontecido comigo. Segundo, não apenas beijei um pessoa, mas me entreguei naqueles beijos, e só não evoluiu porque ele não quis. Um gerente ou dono de uma boate que existia uma área inteira destinada ao sexo. Outra coisa, mesmo que a boate seja bem sucedida, um gerente não ganha tudo isso para ter um apartamento luxuoso e nem um Bentley que custava não fazia nem ideia. Será que Andy era traficante? Mil e uma possibilidades assaltavam minha mente. Eu estava ferrada. Terminei a oração prometendo a Deus que eu iria sair daquela situação, e na próxima sexta, não iria beber nada do bar, nem comer nada. Iria ficar sentada vendo as pessoas dançando, e iria dormir as 22h. Pronto, era isso! Precisava fazer algo dentro da normalidade, então estourei umas pipocas, e fui ver filme de romance.

No domingo, me arrumei e fui para a igreja. Como o padre Colin estava fora, seu substituto era o padre Michael. Seus cultos não eram tão bons, mas eu precisava ouvir a palavra de Deus. 

Após a missa, encontrei com Kayla na porta da igreja . Iria fingir que não a vi, ainda estava bem chateada com ela, mas ela parou bem na minha frente.
- Oi Jade. - Kayla estava com um moletom do Texas, e dessa vez suas tranças eram cor de rosa.
- Oi.
- Nossa, não precisa me tratar no seco.
- O que você quer, Kayla?
- Arg! Tá bom , tá bom . Jade me desculpe . Fui uma grande vadia quando dei a entender que você era culpada pela situação, sendo que quem começou a briga foi Brad.
Fiquei encarando Kayla. Sério que era só isso que ela tinha para me falar ?
Kayla fez cara de desespero quando viu que eu não iria ceder. Se tem uma coisa que sou é ser rancorosa, mesmo sendo boba muitas vezes.
- Amiga é sério, me desculpe mesmo, de verdade. Eu estava com medo, e disse muita coisa sem pensar. Você sabe que o meu mecanismo de defesa é meio engraçado as vezes.
- Não foi pelo o que você falou, Kayla. Foi pelo o que você sugeriu.
- Sim, eu sei, e me arrependo muito por isso. Me perdoa, de verdade. Por favor?
Soltei um grande suspiro. Como disse, sou boba, e mesmo guardando isso, resolvi perdoar. - Ok Kayla, mas tente não fazer mais isso tá? Me magoou.
Kayla me deu um abraço, esmagando minhas costelas. - Nunca mais vadia, eu juro.  O que você vai fazer? Vamos almoçar lá em ca...
Meu telefone fez um barulho estridente, interrompendo o que Kayla estava falando. Era vovó.
- Oi vó! - atendi depressa. Eu já estava cheia de saudades.
- Oi querida! Eu liguei pra você ontem para avisar que cheguei bem, mas o seu celular estava dando desligado. O que houve ?
Desligado? Fiquei sem entender, até porque não lembro de ter visto nenhuma chamada de vovó, e fiquei com o celular o tempo todo enquanto estava na boate.
- Eu não vi, vovó, desculpe. Deveria estar sem sinal. - Kayla estava me olhando com grande expectativa.
- Olha Jade, espero que você não esteja saindo enquanto não estou com aquela sua "amiga" destrambelhada, ou até com... homens.
- O QUE?! Vó, o que a senhora quer dizer?
- Você saiu ou não, Jade?
- Er, hum, claro que não vovó. Fiquei vendo tv e depois fui dormir.
Depois de uma pausa, vovó disse : Eu espero que você não esteja mentindo. Jesus ficaria decepcionado com você querida. Tenho certeza que você será a próxima escolhida a passar pelo Rito.
- Fica tranquila vó, eu não estou mentindo. - Quando é que eu tinha começado a mentir? - Me conta da viagem vó. Aí é bonito ?
- Ah sim querida, é lindo. A Basílica parece o próprio céu. Gostaria muito que você estivesse comigo. Já ganhamos muitas almas para Deus.
- Amém, que Deus seja louvado!
- Você está se alimentando Jade ?
- Vó? A senhora foi na sexta, hoje ainda é domingo e eu estou me alimentando muito bem.
- Que bom querida, que bom. Bem, aqui já são 21h da noite, e eu vou descansar. Amanhã temos um longo dia pela frente. Adeus querida.
- Tchau vovó, eu te amo.
- Eu também te amo.
Desliguei o telefone e o coloquei dentro da bolsa.
- Pode começar a falar agora! - Kayla estava quase berrando.
- Falar o que ?
- Quer dizer que ontem você não estava em casa ??? Como assim ?
- Você não me escutou falar ? Meu telefone deveria estar sem sinal.
- Ah Deus do céu!!! Você foi até lá?
- Até lá aonde?
- Jaaaaadeeee, me conta tudo.  Como ele é? Ele beija bem ?
Não me contive e minha boca torceu em um sorrisinho.
- EU SABIA! - Agora ela estava gritando. - Você vai me contar tudo, sem perder um detalhe. Que loucura, Jade; quem diria hein?
- Para de falar alto, as pessoas estão olhando!
- Oookay, mas você vai almoçar lá em casa, querendo ou não!
Comecei a rir. - Tá bom, vamos.

                                 ~🐍~

- Jade Jordan?
- Eu !
- Judy Smith?
- Aqui.
O professor seguiu fazendo a chamada. A segunda feira estava chuvosa e fria, e eu não via a hora para ir pra casa, me enfiar debaixo das cobertas. Era o primeiro tempo de matemática, e eu detestava aquela matéria. O professor estava com um humor azedo, como sempre; ele não gostava de ninguém e ninguém gostava dele.
- Já viu o aluno novo que chegou? - Kayla disse aos sussurros para que o professor sr azedo não escutasse.
- Não. - Respondi também sussurrando. Quando?
- Hoje. O professor vai apresentar ele. Dizem que é lindo amiga. Ele é meu, já que você está namorando.
- Para de loucura, Kayla. É apenas a segunda vez que vejo Andy.
- E já está gamada, pelo o que parece.
- Você é incorrigível.

- Silêncio, por favor! - Sr azedo chamou nossa atenção. - Apresento a vocês o seu novo colega de classe, Joshua. Sei que ele será muito bem recebido por vocês.
Uma beleza angelical entrou na sala. Seus cabelos eram encaracolados e loiros, rente ao pescoço; os olhos de um azul límpido, da cor do céu. Alto e de porte atlético, quando Joshua entrou na sala, não teve uma cabeça que não tenha virado para acompanhar seus passos. Joshua tinha uma beleza serena, sua postura transmitia paz e confiança, enquanto Andy era um completo predador que fazia apitar nosso radar de perigo.
- Eu não disse que ele era lindo? - Disse Kayla, arrumando suas tranças e levantando os seus seios dentro do sutiã.
- Para Kayla, você é maravilhosa. Burro ele se não te notar. - E ela era mesmo.
Aparentemente eu falei com a parede, porque Kayla estava chamando a atenção dele.
- Oi! Senta aqui com a gente.
Joshua olhou para ela, sorriu, e veio andando em nossa direção. O único lugar que estava vago era do meu lado. Ele se sentou e pendurou sua mochila no encosto da cadeira.
- Olá! É um prazer conhecer vocês. - Sua voz era de menino, mais angelical do que ele.
- O prazer é todo nosso. Eu sou a Kayla, e essa é minha amiga, Jade.
Joshua pelo o que parece também era cristão, já que usava uma correntinha prata com uma pequena cruz pendurada em volta do pescoço.
- Obrigada por me chamarem. Sabem como é, o aluno novo, em uma cidade nova... até se enturmar é difícil.
- Claro, claro. E de onde você veio ? - Eu brincava que Kayla deveria seguir carreira no FBI. Quando ela se empenhava em descobrir algo, raramente deixava passar algo.
- Eu sou de...
- Se já acabou o momento celebridade aí atrás, querem por favor prestar atenção? - Acho que eu nunca vi o Sr azedo falar mais alto. Ele era sempre entediante.
Joshua deu um sorrisinho como se quisesse pedir desculpas, e virou para frente.
O professor continuou divagando sobre raiz quadrada, que aliás eu e todo mundo já havíamos aprendido a algum tempo.

A

cabou o tempo de matemática, e como eu não tinha nenhuma matéria depois, fui em direção ao meu Voyage para ir pra casa. No estacionamento, escutei alguém chamar meu nome. Era Joshua.
- Me chamou ? - Eu só queria entrar logo no carro. O chuvisco estava começando a virar chuva de verdade.
Joshua veio dando uma corridinha para me alcançar, com os seus 1,85 de altura.
- Desculpe te incomodar. Jade, não é?
- Sim, a própria.
- Ótimo. Que medo de ter errado seu nome, rs.
- Sem problemas se tivesse errado também. Você me conheceu apenas hoje, relaxa.
- Não conseguiria esquecer. Você e seu nome são bem marcantes.
Minha mente ficou em branco. Aquilo tinha sido um elogio?
- Huuum, então; precisa de alguma ajuda?
- Ah,sim. Cara, você me passaria as matérias desse semestre ? Como comecei um pouco mais tarde, não quero ficar mais atrasado do que já estou.
- Oh, é claro. Com certeza. Só que agora não consigo te emprestar, até porque ainda temos aula no resto da semana. Pode ser no domingo?
- O que você acha de sexta à noite? Eu pego o caderno com você, e aproveito para tirar algumas dúvidas, se você puder, é claro.
Senti a cobrinha que tinha marcada entre os seios formigar. Estranho.
- Olha Joshua, infelizmente vou ficar devendo essa. Tenho compromisso na sexta. Posso te emprestar assim que a aula acabar, pode ser?
Uma sombra passou em seus olhos, mas tão rápido que não consegui decifrar o que tinha sido exatamente.  Seria decepção?
- Claro Jade. - Sua voz perdeu só um pouquinho do tom angelical. - Eu pego na sexta então depois da aula. Obrigada pela ajuda.
- Cara, desculpa mesmo; eu detesto dizer não. Mas infelizmente tenho compromisso e não posso desmarcar. Na sexta te entrego, sem falta. Aí nas segundas você me entrega, e vamos fazendo isso toda semana até você pegar tudo o que precisa. Pode contar comigo.
- Muito obrigada mesmo. Outra coisa que queria saber de você . Aqui tem igreja? Não posso deixar de honrar meus compromissos.
- É claro que tem. Você também é cristão? - Eu estava maravilhada.
- Com certeza. Sem o amor de Deus não somos nada.
- Amém meu irmão. Está coberto de razão. Porque você não visita a minha igreja?
- Eu adoraria. Com certeza eu irei. Mais uma vez, obrigada Jade.
- Por nada. Então , até amanhã !
- Até!
Entrei bem rápido no carro para poder fugir da chuva e chegar o quanto antes em casa.

AndrasOnde histórias criam vida. Descubra agora