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A semana se tornou um tédio, bem padronizada. Escola, Kayla falando de Joshua sem parar, casa, comidas de fast food, filmes românticos e melosos.  Me peguei ansiando pela sexta; pela Apófis; por Andy. Eu pensava constantemente em como ele me beijava e nas sujeiras que falava para mim sem pudor; em como sua boca encaixava na minha mandíbula e se acomodava no meu pescoço, em como sua mão era grande e cobria toda a minha bunda. Realmente como vovó dizia, mente vazia, oficina do diabo. Sabia que estava pecando, então fui ler um livro de aventura e fantasia, meu gênero preferido. Vovó me ligava todos os dias da semana para saber se eu estava comendo, se estava estudando e se tudo estava em ordem, principalmente se eu estava ficando em casa, me lembrando que Deus enviaria um dia o prometido. Eu sentia falta dela. Me dei conta de que a casa era muito grande sem ela. Nem no meu quarto eu queria dormir mais; dormia no sofá da sala.
Estava cochilando no sofá, a televisão estava ligada no canal de receitas preferido de vovó, em volume baixo. Sonhava que estava em um conto de fadas; encontrava meu príncipe,vestido igual aos príncipes da Disney, sentado  em um cavalo branco. Seu sorriso era inebriante e ele falava palavras doces e gentis. Eu olhava encantada para ele, porém quanto mais eu focava, sua figura ia alterando gradativamente. O cavalo se transformava em um lobo negro como a noite. O príncipe por sua vez, se tornava um homem nu com a cabeça de uma coruja. O cenário não era mais um conto de fadas, e sim Sheol, o ambiente  caótico de Apófis. Homens e mulheres faziam sexo ao redor do homem, enquanto outros brigavam uns com os outros. Esse homem coruja me olhava intensamente,  como se pudesse ver minha alma. Estranhamente, não senti medo.  Despertei em total sentido de alerta. Todos os meus sentidos alertavam perigo. Levantei, abaixei totalmente o volume da televisão, e fui conferir se tinha trancado todas as portas. Mesmo estando na sala, fui à cozinha primeiro, verifiquei a porta e peguei uma faca.  Eu estava apavorada, mas me sentia um pouco mais segura armada. De volta a sala, depois de ver que a porta dali também estava trancada, fiquei um pouco mais calma. Olhei a janela, trinco fechado. Não devia ser nada, acho que acordei daquele jeito por causa do sonho. Estava fechando a cortina quando vi um movimento no jardim de vovó. Um vulto passou muito rápido em direção a rua; parecia estar fugindo. Meu coração apertou de forma angustiante. Alguém sabia que eu estava sozinha em casa e com certeza não tinha boas intenções. Liguei para a polícia, relatando bem nervosa o que tinha acabado de ver. Vinte minutos depois, o inspetor Carl estava parado na minha porta, depois de ter revistado todos os cômodos da casa. Logicamente não achou nada de estranho, nem encontrou marcas de pegadas no jardim. Como aquilo era possível? 
- Então o suposto elemento estava se escondendo no jardim da sua vó ? - Tinha perdido as contas de quantas vezes ele havia me feito aquela pergunta.
- Sim inspetor.
- E o que ele queria?
- Olha, não deu tempo de perguntar a ele. - Eu já estava sem paciência. Quem tinta que descobrir o que a figura queria era ele.
O inspetor apertou a ponte do nariz, claramente estressado.
- Senhorita Jade, isso tudo é muito estranho. Um estranho estava no jardim de sua vó, estava te vigiando, e não deixou nenhuma pegada? A senhorita sabe que tem terra além de flores  no jardim, não é?
- Com todo respeito, inspetor, mas quem deveria achar uma lógica para isso é o senhor. - Ele estava tentando sugerir que inventei toda a história?
- Senhorita, sua vó está fora em uma viagem, certo?
- Sim, e aí?
- Talvez você esteja sofrendo com a sua ausência. A nossa mente é fantástica; cria coisas que só existem para a gente. Sugiro que a senhorita descanse, e se você se sentir mais confortável, durma na casa de uma amiga. Certamente você tem uma.
- O senhor não vai fazer pelo menos uma ronda no quarteirão? Não vai perguntar a um vizinho se viu alguém?
- O que irei fazer não é seu cabimento, senhorita. Se me der licença...
O inspetor Carl já estava se virando em direção ao seu carro, com aquela barriga protuberante, andando como quem rema.
Soltei um longo suspiro, e tranquei a porta. Depois de conferir as portas e janelas novamente, me enrolei no sofá com minha manta da Corvinal. Por mais que eu tentasse, não conseguia dormir mais, e estava receosa o bastante para isso.

AndrasWhere stories live. Discover now