3 - Louco

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Julian

—Juanito, eu já te falei da minha nova vizinha? —Perguntei assim que cheguei no restaurante dos pais dele.

Eu trabalho como garçom, junto com o Juanito no Raices colombianas.

—Já, papi. Um milhão de veces.

—É sério, eu acho que agora eu tô apaixonado.

—Usted está mentindo.

—Não tô não, ela é linda, tem olhos grandes e azuis, parece uma Barbie. E ela tem cheiro de bala de uva. —fechei os olhos, só de lembrar me dava saudade. —Tô apaixonado.

—Loco. Você no sabe o que é Pasión.

Talvez o Juanito tenha razão, eu acho que realmente não sei o que é estar apaixonado de verdade, acho que nunca estive.
Mas tô muito afim de aprender.

—Eu falo sério, ela parece incrível. —insisti.

—Usted está me diciendo, que está enamorado por uma chica que lhe tratou mal? E que só viste una vez?

—É, Juanito. Pode me chamar de louco, eu não ligo!

—Loco.

Afinal, que graça há na vida sem loucuras?Sinto que dessa vez vai ser diferente.

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No final do expediente, quando eu já estava indo pra casa, recebi uma ligação que há muito tempo eu não recebia.

Meu pai.

—Julian, você me ligou ontem. Eu estava ocupado, o que você queria?

—Como sempre ocupado...

—Não tenho tempo pros seus chiliques, você não é mais um adolescente. Haja como homem.

Eu ri, mas não tinha nenhum pingo de humor.

—Já que estamos falando de agir como homem, vamos falar sobre o motivo da minha ligação. Bom, ontem o meu avô estava precisando de um remédio pra dor, e eu não tinha nenhum centavo, o remédio é caro, e eu queria que você depositasse o dinheiro pro SEU PAI ter o remédio dele, mas você estava ocupado sendo homem... Bom, então o moleque aqui teve que pedir um adiantamento pros chefes, pra poder comprar o remédio, e esse adiantamento só existiu porque eu sou amigo da família, se não, o meu avô estaria travado na cama nesse exato momento.

—Dinheiro não é o problema, passa sua conta no meu e-mail que eu mando.

—É impressionante como você nunca entende.

Houve um silêncio na ligação, esperei por alguma desculpa esfarrapada, mas nem isso teve.

—Como ele está? -perguntou mudando de assunto.

—Bem. E ainda pergunta sobre você, o tempo todo.

—Ah é? Diga a ele que nas minhas férias eu vou passar por aí pra dar um alô pra ele. Agora eu tenho que desligar, o dever me chama.

O trabalho vem antes da família.
O trabalho dele vem antes de tudo.

—Oi Neto, como foi o trabalho? —Meu avô perguntou assim que cheguei em casa.

—Corrido. O restaurante está fazendo sucesso, e só o Juanito e eu atendendo não está sendo o suficiente. —eu disse colocando sobre a mesa a comida que ganhei da mãe do Juanito. —A mãe do Juanito mandou Arepas pra você, velhinho.

—Ah! Como eu amo a Colômbia! —comemorou.

Os pais do Juanito vieram para o Brasil há um pouco mais de 2 anos, e fundaram o Raices sem muitos recursos, os dois são chefes de cozinha, e pessoas boas de verdade, e adoram o meu avô.

Quando eu estava indo pro banho, uma pergunta que sempre me fere chegou.

—Tem notícias do seu pai, neto? Eu ligo pra ele várias vezes, só que ele nunca atende.

—Ele ligou hoje. E... Mandou um abraço, disse que vem aqui te ver nas próximas férias.

Me senti muito mal por ter mentido, mas aquilo valeu o sorriso do meu avô, que ficou tão contente que não conseguia disfarçar.

—Sabe quem ligou mais cedo? Sua mãe.—Meu avô disse.

Minha mãe é uma mulher bondosa. Não merece o homem que escolheu pra ser seu marido e meu pai.

Eles só se vêem finais de semana e nem são todos, por conta do trabalho dele.

Ela diz não se importar com isso, mas eu tenho certeza que se importa.

—E o que ela disse? —perguntei.

—Queria saber como estávamos. Eu disse a ela que bem, e que você cuida bem de mim, neto.

—Claro que cuido, você é meu velhinho preferido. —eu abracei meu avô.

—Não sou velho, sou experiente.

—Claro, claro.

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No dia seguinte, mais uma vez eu me surpreendi com a Kira.
Quando eu vi ela no ISC, pensei que fosse o destino agindo ao meu favor.

—Miss simpatia, você por aqui? —perguntei assim que reconheci o seu rosto angelical.

—Estou procurando a turma do mestre Tácio, conhece?

E ela insiste em me chamar de Juliano, não vou dizer que não gosto porque estaria mentindo e muito.

—Muay thai?! Como eu não suspeitei...

A cara de brava, a marra, a força e o corpo definido. Era óbvio que ela lutava.

Fiz questão de mostrar o caminho, já que eu tinha bastante tempo até meu treino começar.

—Ouvi dizer que o mestre Tácio é o mais rígido dos professores. —Comentei.

E de fato, a fama dele não é boa no colégio, apesar de ser bom no que faz.
Ouvi boatos de teve alunos dele que desistiram de lutar por conta dele, e já vi casos de alunas que saíam chorando da aula dele.

—Se ele me tornar uma estrela, não tenho medo nenhum. —disse decidida.

Ela tem o mesmo pensamento que eu.

O meu treinador é muito rígido, mas se ele me tornar grande, eu não me importo com a arrogância dele.

Kira estava nervosa, ela garantiu que não, mas seu corpo dizia que sim.

Ela estava tremendo, e com a mente em qualquer outro lugar menos na nossa conversa.

Quando a deixei na sala dela, resolvi ficar lá e espiar pela janela pra ver como ela se saíria.

Estava tudo indo bem, até que o Mestre Tácio propôs uma luta entre novatos e veteranos.

A mulher que ele colocou pra lutar com a Kira, era mais alta, e com certeza mais pesada e forte que ela além de ser mais velha.
Tinha cara de quem não gostava de humanos.

—Ela vai massacrar o meu docinho, tenho que fazer alguma coisa. —eu disse tão baixo, que parecia pensamento, mas não foi.

—Julian, desça já daí. —A voz do inspetor nas minhas costas me fez tomar um susto.

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ImprováveisWhere stories live. Discover now