44 - Você não entende, Julian

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Julian

O olhar assustado do meu pai cruzou com o meu por alguns segundos. Ele parecia tão surpreso quanto eu, mas a única coisa que ele fez foi agir como se nunca tivesse me visto na vida.

—Venha Maitê. Obedeça sua mãe. —Ele disse com voz autoritária sem tirar os olhos dos meus e garotinha foi embora rapidamente.

Nem eu entendo o motivo da minha surpresa, esse cara sempre foi um merda com minha mãe e diversas vezes eu disse para ele se divertir com "sua outra família" na hora que eu sentia a mais pura raiva que meu coração conseguia suportar, essa era a forma que eu encontrava para tentar ofendê-lo, mas saber que ele realmente têm outra família mexeu com a minha criança interior que ainda implora pela atenção daquele cara, e mexeu com o filho que protege a mãe como leão.

A minha mãe não merece ser enganada dessa forma.

Minha cabeça ficou tão atordoada com o que acabara de acontecer que eu nem percebi que a Kira me balançava para eu sair dos meus pensamentos.

—Tá tudo bem, Juliano? —Ela me olhava com os olhos arregalados.

—Não, mas vou ficar. —Suspirei.

—Aquele era o ...—ela hesitou.

—Meu pai. —Sorri sem humor— Parece que ele mantém a tradição de trazer a família em hotel fazenda.

—Você quer voltar pro quarto? —ela perguntou enquanto me abraçava forte.

—De jeito nenhum. Esse merda não vai estragar nossa viagem. Ele ignorou a minha presença, eu também posso fazer isso. Ele foi bem claro, sem dizer nenhuma palavra. —Passei a mão sobre minha cabeça na tentativa frustrada daquilo retirar todos os pensamentos ruins que vieram em seguida. —Vamos ver os outros animais?

Kira tentou me distrair de várias formas. Eu não queria pensar no que acabara de descobrir, mas era quase impossível, não dava pra ignorar que o meu pai estava enganando minha mãe e a mantendo refém desse falso relacionamento por todos esses anos. Eu não posso voltar como se nada tivesse acontecido, mas também não queria estragar esse momento com a Kira, então consegui ignorar os meus pensamentos impulsivos durante o resto do dia e não fui procurá-lo, só para não afetá-la.

Depois de tudo, eu não precisei procurar por ele, porque quando estávamos voltando pro quarto, fui surpreendido com a silhueta do meu pai encostado na parede próximo a nossa suíte. Ele fumava um cigarro tranquilamente.

—O que está fazendo aqui?—pergunto frio.

—Quero conversar com você, Julian. —ele soltou a fumaça lentamente.

—Vocês querem que eu vá dar uma volta? —Kira perguntou.

—Não, amor. Nós é que vamos conversar lá fora. —eu a beijei. —Descansa um pouco.

Kira assentiu com a cabeça.

O meu pai seguiu andando na frente em direção a saída, e Kira me deu um abraço apertado.

—Pense bem antes de agir. —Ela disse.

Eu beijei a testa dela e caminhei atrás dele.

—É uma bela moça. —Ele disse assim que chegamos do lado de fora do hotel e sentamos em bancos ao ar livre. —Sua namorada?

—Corta o papo furado. —eu disse sério. —Há quanto tempo está enganando minha mãe?

Ele sorriu, mas não parecia ter achado a minha frase engraçada. Ele tragou mais uma vez seu cigarro.

—Acho que você quis dizer há quanto tempo estou com a Stella. 5 anos é a resposta. A idade da Maitê.

—Impressionante a naturalidade com que você diz isso, não sente vergonha?

—Na verdade não. Por que eu deveria me envergonhar?

—Por que não deixa minha mãe viver em paz?! Viva sua vida com sua nova família e esqueça que nós existimos, isso não vai ser tão difícil pra você, tenho certeza. Por que ainda não se separou?

—Porque eu amo a sua mãe, Julian.

—Conta outra, você a trai há 5 anos, isso é amor pra você?! A minha mãe não merece isso. Eu sou a prova viva do quanto ela ainda te espera e acredita fielmente nas suas mentiras sobre estar trabalhando o tempo todo, você me dá nojo, cara. Seja homem, não estou pedindo para que me ame, e seja o pai que nunca tive, estou pedindo para que seja honesto ao menos uma vez com a mulher que você diz amar.

—Você não entende, Julian...

—Não entendo mesmo, Você tem outra mulher, uma filha e uma nova vida. A única coisa que eu quero é que deixe minha mãe livre. Ela não merece isso.

—Sua mãe é livre, Julian. Mas ela não quer a liberdade.

—Como você explica ela ter fugido e aparecido lá em casa daquela vez? Você obrigou ela a voltar, chama isso de liberdade?!

—A sua mãe parou a minha frota de caminhões só pra me fazer voltar pra casa, ela sabia que fazendo isso, me veria em menos tempo.

—Eu não acredito no que estou ouvindo. —sorri sem humor, tentando controlar a vontade de dar um soco na cara dele.

—Você é tão inocente a esse ponto para acreditar que sua mãe nunca desconfiou que tenho outra? Não seja ingênuo, filho. Você mesmo dizia pra eu me divertir com minha outra família. A sua mãe não suportaria uma separação, a verdade é essa.

Escondi meu rosto na palma das minhas mãos.

—Uma vez sua mãe encontrou mensagens da Stella no meu celular, fotos nossas juntos e ela não fez absolutamente nada. A realidade é que sua mãe não quer perder a boa vida que eu proporciono pra ela, dei a ela o cargo de controlar minha frota de caminhões e ela ganha uma boa grana com isso. Eu amo a sua mãe ao ponto de não deixá-la desamparada. Você deveria me agradecer, se não você teria que sustentar além do velhote, a sua mãe. Eu duvido que conseguiria com aquele salário mixuruca do restaurante.

—Cala a boca, eu não quero mais te ouvir.

—Eu nunca me esforcei pra esconder nada dela. Ela só finge não saber, filho. Ela me ama, o que eu posso fazer?

—Não me chame de filho.

—Pense bem no que fará quando voltar pra casa.

—Nem sei porque estamos tendo essa conversa. —Eu me levantei e fui embora.

Kira me esperava aflita, andando de um lado para o outro no nosso quarto. Receber um abraço dela foi um alívio instantâneo, e só ali naquele abraço, eu consegui chorar.

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