006. Casa Japonesa

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Andamos por alguns metros antes de chegarmos em frente a um portão cinza de chave, que depois de destrancado, revelava um corredor não muito longo pelo qual deveríamos seguir. Lá no fundo havia uma porta de entrada para a casa, que de longe era possível ver a luz da sala de estar acesa. Por estar de noite eu não consegui reparar muito bem nos detalhes externos da moradia, mas era perceptível que ela não era muito grande e nem muito pequena — vista por fora, parecia mediana.

Ao fundo era possível escutar alguns burburinhos de conversa vindo de dentro do local, sinal de que tinha um grupo de pessoas lá. Junto com o barulho de conversa, era possível escutar, ainda, o barulho de motores de aviões, mais ainda do que na garagem de ensaio da banda na qual estive anteriormente. A casa do Alberto ficava a poucos metros do condomínio Parque Cecap, que ficava logo do lado do aeroporto de Guarulhos. Ali tudo acontecia ao mesmo tempo, nitidamente. Mesmo que eu amasse aviação, provavelmente não conseguiria morar perto dali por conta do barulho intenso. Enfim, assim que adentramos o portão principal e o garoto o fechou, ele se virou para mim portando uma expressão ansiosa e disse:

— Eu já falei de você para a minha mãe, mas... Me deixa entrar primeiro? Acho que os meus irmãos estão aqui e não quero que eles tomem a sua presença como repentina.

— A casa é sua e eu sou a convidada, não é? Vai na frente e faz o que achar melhor!

Eu percebi neste momento que ele estava muito tenso. Talvez não esperasse que os irmãos estivessem por ali, e sendo sincera, eu entendo completamente essa preocupação toda em levar alguém diferente a sua casa, principalmente sabendo que não se mora sozinho. Você nunca sabe o que pode encontrar ao chegar da rua. Ali parecia apenas uma reunião de família, mas eu definitivamente não queria ser o motivo de fazê-lo ficar nervoso em um momento como esse. E claro que isso tinha que começar pela educação que eu recebi dos meus pais. Ele foi caminhando na frente e me indicou o caminho para segui-lo. Logo um pouco antes da entrada eu percebi que havia uma espécie de prateleira, que a princípio eu deduzi que seriam para colocar os sapatos sujos da rua e cheguei à conclusão de que era isso mesmo quando o vi retirando o seu tênis e o colocando ali. Esse era um dos costumes que eu e a minha família tínhamos, então a primeira coisa que eu sempre fazia ao chegar na minha casa ou na casa de alguém era tirar os sapatos e colocá-los na entrada. Devido a isso, quando o vi colocando os seus sobre a prateleira, eu já estava descalço segurando a minha sandália. Em seguida eu a deixei no cantinho mais isolado e escondido para que não atrapalhasse ninguém.

Ele entrou na sua casa após isso e cumprimentou os seus familiares, logo depois voltou para a entrada e olhou na minha direção, que estava "escondida" ainda perto da prateleira. Em seguida fez um sinal que me indicava que eu já podia o acompanhar para dentro, e eu o fiz tentando ser o mais discreta possível. Entretanto, no momento em que coloquei os meus pés lá dentro, todos cessaram a conversa que estavam tendo anteriormente e voltaram os seus olhares à mim, um gesto que me deixou extremamente desconfortável e fez com que eu me sentisse uma intrusa ali, na verdade. Quem quebrou o silêncio e de certa forma até me serviu de tranquilizante foi o Alberto.

— Gente, essa é a Ahri — ele não parecia mais ansioso como estava antes ao me apresentar para a sua família naquele momento. Agora a sua voz esbanjava confiança. — A garota que falei agora à pouco para vocês.

Se eu não soubesse muito bem que entre famílias com tradições japonesas as pessoas costumam esperar que o terceiro se pronuncie logo após ser apresentado, eu morreria de vergonha quando voltei a ser o alvo dos olhares dos irmãos do guitarrista. Meus pais me ensinaram a reverenciar a todos com um sorriso no rosto quando chegar em um ambiente novo, e foi o que eu fiz. Isso é um sinal de respeito e educação entre amarelos.

Também para mostrar sinal de respeito, um a um dos irmãos dele foi se levantando e me reverenciando também. No total, eram três meninos parecidos com o Alberto que estavam ali antes de chegarmos. Assim que eles se sentaram novamente, uma senhora de meia idade surgiu da cozinha segurando uma panela. Ela era baixinha, o seu cabelo era curtinho e preto com alguns fios brancos e os seus olhos também eram puxadinhos. Por não ser mais tão nova, a sua pele possuía algumas marcas da idade, como as pálpebras mais cheias e linhas de expressão em volta dos olhos, os que os faziam parecer ainda menores do que naturalmente eram. Foi eu bater os olhos nela que adivinhei que era a mãe do Alberto, ele era exatamente a cópia dela. E ela foi muito simpática, também. Ao me ver, sorriu para mim, colocou a panela no centro da mesa de jantar que já estava organizada e veio me cumprimentar pessoalmente com uma reverência frente a frente.

Playing Against Time | Bento Hinoto [SENDO REPOSTADO]Where stories live. Discover now