Frottement

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atrito(s.m.): que tem atrição, pesaroso da presença do pecado; resistência que um corpo desenvolve ao se mover sobre outro; fricção entre dois corpos, atração brusca que leva um corpo a colidir no outro; impacto; dificuldade de entendimento, ausência da verdadeira compreensão.

"Do atrito de duas pedras chispam faíscas; das faíscas vem o fogo e do fogo brota a luz." - Victor Hugo

Camila transbordava interrogações. A cada passo que dava sem rumo pela rua, era uma pergunta sem resposta em sua mente e as incertezas apenas se acumulavam, pesando em seus ombros arriados. Ela se sentia uma verdadeira criança tentando se equilibrar no mundo dos adultos sempre abarrotados de suas verdades e razões, jogando pra ela migalhas dos fatos, apresentando somente o que achavam que ela poderia saber. Mas Camila não era mais uma criança e não aguentava mais ser tratada como uma.

Talvez Normani a entendesse, na verdade, ela era a única que parecia lhe entender. Mas a única pessoa disposta a agraciá-la com a verdade, desta nada sabia. Deus não dava asas à cobra, não é mesmo? Camila estava cansada de brincar desse pique esconde, estava cansada de Keaton a controlando e ainda mais cansada de todo esse vaguismo que rondava sua relação com Lauren.

Lauren era tão cheia de vagos que tentar entendê-la era como dar um tiro no escuro. Quanto mais chegava perto, mais vazios encontrava e a cada momento que se passava tinha medo de que, no fundo, seus sentimentos fossem vazios também, por mais que se recusasse a pensar dessa forma. Era impossível que a missy não sentisse nada, seria desprezível demais de sua parte brincar assim com Camila, ainda mais sabendo que a garota realmente sentia algo intenso. Mas, mesmo cheia de dúvidas, Camila sabia que Lauren também sentia. Amaram-se de forma extremamente intensa para que no fim tudo dentro da missy fosse vazio. Não era, Camila sabia que não era.

Camila sabia que Lauren sentia, mas havia algo que a fazia hesitar em sentir. E era esse algo que todos sabiam menos ela. Lauren havia algo grande dentro de si que a impedia de se deixar levar pelo o que sentia, como se quisesse se prender em sua própria gaiola, vivendo através das grades com medo das consequências de deixá-las. O pior é que esse algo podia ser qualquer coisa e a garota não fazia ideia do que podia ser. Talvez tivesse a ver com a maldita da ex-mulher, mas se tivesse, Keaton estaria tão preocupado dessa forma? Ou Normani poderia estar certa e ela realmente era uma prostituta... Não dava pra entender, mesmo que forçasse sua mente ao máximo, era impossível de decifrar pois nada sabia.

O céu já estava escurecendo no seu tom arroxeado e Camila parou subitamente sua caminhada ao perceber que estava de frente à gloriosa Catedral de Amiens. Ela havia andado um bom pedaço. De todo aquele seu tempo na cidade, nunca havia parado para visitar a tão famosa Catedral, que aos seus olhos era o que sempre imaginou de um palácio indiano com algumas cruzes aqui e ali. Na fachada era imagem que não acabava mais e isso a deixou um tanto quanto perturbada, nunca pensou que pudessem existir tantos santos assim e isso a fazia remeter ainda mais o politeísmo indiano. Se bem que ela não conhecia nada do catolicismo, muito menos da Índia. Mesmo assim, resolveu entrar. Sempre fora agnóstica, e encontrava muito conforto em seu pai do céu. Talvez um tempo dentro da Igreja fizesse bem para sua mente, afinal, diziam que a Igreja era o colo de Deus.

Curvou-se e fez o sinal da cruz por hábito, maravilhando-se com os inúmeros vitrais  coloridos que davam enchiam de vida aquele lugar tão antigo. Sorriu involuntariamente, Kais e sua equipe fizeram um ótimo trabalho. Ainda com os olhos presos aos vitrais, acomodou-se num banco no meio da Igreja, sentando-se encolhida e voltando sua atenção ao altar, onde no alto jazia uma imagem de Jesus cruscificado. Assentiu para ele como se fosse uma verdadeira pessoa e soltou um suspiro, olhando ao redor antes de pensar em suas preces e vendo as diversas pessoas espalhadas pelo lugar, entregues às suas orações. Até que seus olhos pararam em uma específica, de joelhos numa das primeiras fileiras.

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