Sablier

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ampulheta (s.f.): artefato de medir o tempo constituído por um recipiente de vidro divido em dois compartimentos simétricos, geralmente cônicos, que se comunicam pelo vértice, através do qual cai, aos poucos, certa quantidade de areia muito fina (ou água ou mercúrio), e cujo esvaziamento total da parte superior equivale a um período de tempo predeterminado.

As mentiras e omissões fazem da vida uma ampulheta, onde a verdade é a areia que escorre, e se não for notada em tempo, soterra tudo que está pela frente.

Camila havia dormido no sofá para não acordar Anne outra vez. Seu humor estava péssimo, suas costas doíam e seu rosto estava inchado por conta das lágrimas da noite anterior, não se lembrava da última vez que havia acordado tão emburrada. Nem se deu o trabalho de levantar cedo, não sairia de casa nem que fosse convocada pela Beyoncé em pessoa, não estava com saco para nada nem ninguém, só queria ficar sossegada e confortável em seu canto, envolta pelas várias cobertas no estofado e uma tigela de cereal na mão.

-Bom dia, flor do dia! -Keaton apareceu radiante na sala, abotoando sua blusa social e sorrindo como nunca. Camila revirou os olhos e aumentou a televisão nem abrindo a boca para respondê-lo.- Hm, bem humorada... -Ele sorriu de deboche.- Me diz uma coisa, estou pensando em dar uma pausa no gel, o que você acha do meu cabelo assim?

Camila rolou preguiçosamente os olhos na direção do rapaz e pressionou os lábios para conter o riso. Keaton tinha o cabelo loiro no estilo menino de dezesseis anos, boi lambeu, numa franja que chegava nas orelhas e quase lhe cobria os olhos. Ele arqueou uma das sobrancelhas na espera de uma resposta e ela negou com a cabeça.

-Parece a minha mãe.

-Cruzes! Você já me respeitou mais. -O loiro disse num gritinho esganiçado e ofendido, enfiando a mão no pote de gel para ajeitar seu topete.- Se bem que eu posso me aproveitar desse semelhança e entrar no papel de sua progenitora inquisidora para te perguntar porque não foi trabalhar hoje.

-Não é da sua conta. -Camila respondeu com indiferença e ele arqueou as sobrancelhas, fitando a amiga emburrada com curiosidade.

-Não é porque você namora uma das donas que pode fazer seu próprio horário.

-Lauren não é minha namorada. -A resposta veio seca e Keaton estranhou o tom, largando o que fazia e indo em direção a amiga, sentando-se na poltrona ao lado.

-Você vai me contar o motivo dessa revolta agora ou depois?

-Eu já falei que não é da sua conta.

-Eu te conheço desde as fraldas, Karla Camila, teu joguinho duro não funciona comigo. -Ele cruzou os braços e inclinou o corpo para frente, aproximando-se da garota de semblante fechado.- Pode me contando o que aconteceu entre vocês duas.

-Você era a pessoa que menos queria que ficássemos juntas, já pode parar de fingir que se importa.

-Você tem sorte de eu ter sido abençoado com o dom da paciência porque é foda lidar contigo, viu? Não venha jogar merda pra cima de mim porque eu já me desculpei e joguei tudo nas suas mãos, não tenho nenhuma parcela de culpa no que seja o diabo que aconteceu entre as mocinhas mas se estou aqui, me prestando a conversar com você mesmo com esse seu humor de leoa no cio em tempos de caça, é porque eu me importo.

-Lauren tem um caso com outra garota. -Camila disse por fim sem tirar os olhos da televisão, num tom de tédio arrastado para disfarçar a tristeza que Keaton conhecia muito bem.

-A Lauren o quê? -O loiro perguntou num riso incrédulo. Conhecendo a missy bem como conhecia sabia que era impossível.

-Eu não vou repetir, você já entendeu.

Spring AwakeningOn viuen les histories. Descobreix ara