Psychofreak

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"Não é estranho o tanto que as pessoas podem mudar?"
Assim começou Celeste cantando Strange nos meus fones, enquanto eu terminava minhas eternas planilhas.

Incrível como a música é capaz de me transportar para lugares que eu não queria ir.

Não queria ir a aquele sorriso largo e sapeca; muito menos queria lembrar do cheiro de pêssego dela, ou como sua voz sobe muito no agudo quando ela está animada. Não queria relembrar aquela risada anasalada, ou o tanto de "you know" que ela põe nas frases.
Mas a cada acorde no piano, a cada letra,  me transportava direto para Camila.

Nos últimos dias, qual música não me transportava até ela?

"Não é estranho o tanto que as pessoas podem mudar? De estranhos a amigos, de amigos a amantes, de amantes a estranhos de novo". A música continuou.

Camila ainda é ela mesma, eu ainda sou eu; a única diferença é que agora Camila e eu temos memórias uma com a outra. É triste compartilhar memórias com um estranho, porque não há como rir delas com ele, afinal, não há intimidade mais.

Eu não me arrependo de ter criado essas memórias, talvez me arrependa de ter acabado com elas.
E o telefone dela chamou mais uma vez, indo para a caixa postal. Quase um mês após nossa discussão e eu não tinha notícias dela.

Dinah entrou na minha sala, jogou sua bolsa na mesinha e deitou no sofá. Será que ela estaria deitada tão tranquilamente se soubesse o que Camila e eu fizemos ali?

— E ai, Pinoquita, novidades?

Dei de ombros. — Camila não me atendeu e estou mesmo bloqueada de todas as redes sociais dela.

— Eu perguntei por novidades.

— E fui ao trabalho, ela pediu conta. Fui no apart dela, ninguém atendeu. Será que ela se mudou?

— Será que você virou uma stalker?

Revirei os olhos. — Não virei uma stalker, se eu tivesse me tornado uma, teria ido ao outro trabalho do teatro.

Dinah tirou um pacote de biscoitos e começou a me olhar desconfiada enquanto comia. Ela tinha razão em desconfiar, fui ao teatro, não me deixaram entrar ou falar com a Camila, alegando que estavam "batendo texto".

— Talvez, apenas talvez eu tenha me tornado uma stalker, ok? Um pouquinho só.

Dinah cruzou os braços atrás da cabeça e riu enquanto enchia meu sofá de biscoito. — Ual, a menina te deu um chá mesmo.

— Vai se fuder, Dinah! Eu só quero falar com ela, me desculpar. Ah, é foda, ela não atende a porra do telefone por nada. Onde eu vou ela não tá ou não posso falar com ela.

— Então vamos sair hoje, sextou!

— Hoje é sábado.

— Então vamos sabadar. Não importa, eu quero beber e você precisa tomar uma também. Vamos no "Miss Movin' on" e tudo se resolve.

Olhei alguns segundos para minha amiga, claro que ela me chamaria para ir na casa de shows em que conheci a Camila. — Sua filha da puta! Você tem conversado com ela. Como fui idiota! Vocês se tornaram amigas, é claro!

Ela manteve o tom calmo. — Também sou sua amiga. Não esqueça disso. Nós fomos a um show, só isso. Mas saiba que também não estou nas redes sociais dela. Vamos lá, você vai gostar.

— Ela estará lá?

— Com certeza eu acho que não sei, mas provavelmente esteja.

— Então vou pra casa escolher uma roupa. Mas saiba que você vai me explicar essa merda direitinho.

Intersex - a história  de LaurenWo Geschichten leben. Entdecke jetzt