I - Amanda Scott

57 10 12
                                    


Naquele dia o tempo não estava chuvoso, frio ou ensolarado. Apenas se via das imensas janelas do escritório da empresa, situado na Rua 21.ª, um aglomerado de nuvens espessas que tornavam o tempo estranho.

Era mais um dia dentro daquelas imensas estruturas espelhadas cheias de movimentações constantes e monótonas, dia após dia, semana após semana. Sons de telefone, clipes de papéis, máquinas fotocopiadoras expelindo folhas recém copiadas, murmúrios, cadeiras arrastando sobre rodinhas e conversas paralelas.

Só o tempo no exterior parecia anormal.

Já na parte interna, tudo parecia na mais perfeita ordem em mais um dia de trabalho para Amanda Scott. Ela nem prestava atenção às nuvens do exterior, se fazia calor ou frio, o ar condicionado climatizava o interior e fornecia uma temperatura constante bastante agradável. As suas rotinas prosseguiam sem sobressaltos. Atender ligações, anotar recados, marcar reuniões, as tarefas típicas de uma secretária de alta direção. Basicamente, auxiliar o chefe em seu enfadonho e infernal dia naquele escritório com um persistente e enjoativo aroma a flores proveniente do desinfetante. Ela odiava o cheiro, mas já tinha encontrado uma forma de ignorá-lo. As dores de cabeça eram corrigidas com comprimidos e o foco no trabalho distraía-a do odor irritante.

Havia mais de uma hora que Gaio Malone, o seu chefe, estava ao telefone com um cliente, explicando o mesmo assunto pela quinta vez. A moça sentia-se na obrigação de admirá-lo por tamanha persistência, ainda que o homem em si fosse um tremendo babaca. Porquê? Porque a paciência e as boas maneiras só se restringiam aos seus clientes. Os seus funcionários eram presenteados por mudanças repentinas de humor durante o expediente. Exigências, pressões, piadinhas, berros, até insultos. Elogios, nem vê-los...

O telefonema terminou.

– Abigail? – Gaio chamou-a.

– Sim, senhor? – respondeu a moça levantando a cabeça. Era notável como tentava sorrir do melhor modo, porque odiava quando ele a chamava de "Abigail".

Sim, esse era outro motivo porque o achava antipático... O seu nome era Amanda e já havia cansado de repeti-lo vezes sem conta... Chegou até a ser repreendida por estar a chamar o chefe à atenção com certa petulância e ela percebeu que não devia insistir mais. Precisava daquele emprego e quando se precisa de alguma coisa, fazem-se algumas cedências...

Acontecia que o senhor Gaio Malone tinha a mania de inventar nomes para tratar os funcionários, pois dizia que era ocupado demais para se lembrar dos nomes de todos, mesmo daqueles que trabalhavam mais próximos dele – vinte e quatro horas, praticamente. Então, olhava para as caras de cada um e dava os nomes que achava que correspondiam às linhas dos rostos que decifrava. E ela, mesmo que detestasse esse nome por fazer-lhe lembrar uma tia velha que lhe dava beliscões quando a ia visitar para uma tarde de chá com a mãe quando era criança, era Abigail.

Não se podia queixar, pensava ela. Não estava tão ruim assim, apesar de tudo, porque mesmo o trabalho sendo um saco, mesmo precisando daquele posto, ao menos o que Amanda ganhava permitia-lhe ter uma vida confortável, embora socialmente reduzida a pó...

Na lista de motivos para suportar aquele emprego estava, sem dúvidas, a continha semanal recebida e ser chamada por um nome diferente uma vez ou outra não era tão insuportável assim... Mesmo o nome da tia Abigail dos beliscões...

– Hoje ficará até mais tarde – informou o chefe de modo repentino. – Preciso que termine um relatório que vou usar na minha reunião das seis da manhã – exigiu ele desapertando sua gravata, soltando o ar pela boca ruidosamente. Ela escutou a cadeira chiar com o peso dele, que se tinha recostado, provavelmente a pensar no telefonema chato com o cliente.

SentenciadosWhere stories live. Discover now