XIV - Etapa finalizada

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O descanso impunha-se, mesmo depois da paragem no posto de combustível e na loja de conveniência. A hora já era tardia pelo que a escolha para a pernoita passou por um motel. Amanda quis protestar, pois preferia viajar durante toda a noite, chegariam ao seu destino mais depressa se a viagem não tivesse uma interrupção desnecessária para dormir, qualquer que este destino fosse pois, na realidade, ainda não sabia muito bem para onde estavam a ir. Ela sentia-se desperta, com energia, alerta, ofereceu-se para conduzir. Terris não estava pelos ajustes e cortou o protesto ao meio, como faca quente a separar um cubo de manteiga. Eles não podiam esticar as suas forças e as suas capacidades cognitivas. Precisavam de se manter saudáveis para poder debelar eventuais ameaças que pendessem sobre eles, e que iriam existir, para conseguirem continuar a escapar.

Então, o descanso impunha-se e seria naquele motel, onde o automóvel prateado tinha acabado de ocupar um dos lugares do amplo parque de estacionamento. Fim da conversa. Amanda saiu do carro contrariada e encostou-se à porta fechada, à espera, enquanto o cientista fazia o registo na recepção usando os seus nomes falsos. Passado pouco tempo ele saiu com uma chave, agarrada a uma bola de golfe furada que servia de porta-chaves, e foi atrás dele. O quarto era o cento e treze. Ela não gostou muito do número do azar associado ao lugar onde iriam ficar, mas não comentou nada. Terris estava tão contrariado quanto ela.

O quarto era minúsculo. Uma cama de casal, duas pequenas mesas com candeeiros e um telefone analógico, uma secretária, debaixo da janela que se colava à porta, com um banco de madeira. Sobre um aparador, uma televisão em miniatura e o respetivo controlo remoto. No banheiro exíguo havia um duche, um lavatório e um vaso sanitário. Amanda olhava para o compartimento com inegável asco, mas estava a precisar muito de um banho e cogitava se relevava as manchas de bolor e o odor peculiar a humidade entranhada. Fechou os olhos com um suspiro de desagrado. Ao se voltar para o quarto, reparou na única cama e apontou, descontente:

– Nem pense que vamos dormir juntos. Arranja-te com o tapete...

Terris encarou-a surpreendido.

– Somos um casal, temos de agir como tal.

– Serei a senhora Cooper em público, querido. Não pretendo atuar em todos os momentos. Isso é demasiado cansativo e ademais, na realidade, não somos um casal. Não vejo a necessidade de levarmos isto ao extremo. A cama é para mim, onde pensas dormir, é contigo. Até pode ser no carro, não me importo.

– Se eu dormir no carro, pensarão o quê? – observou ele, irritado.

– Vão pensar que o senhor Cooper fez alguma asneira e que a senhora Cooper estará zangada com ele! – Agarrou numa das duas toalhas brancas que estavam dobradas, sobre a colcha. – Vou tentar tomar um banho naquele duche imundo. Só espero que não apareça nenhuma barata a sair pelo cano. Se me ouvires gritar, já sabes...

– Acho que essa atitude não vai ajudar, sabes?

Com uma perna dentro do banheiro, ela olhou por cima do ombro.

– Que atitude? Só estou a mostrar o que sinto em relação a esta paragem!

– Já percebi que querias continuar, mas como te disse, estou cansado. Posso ser um Físico Teórico, um cientista com uma inteligência acima da média, mas sou também humano e preciso de descansar... Amanhã temos mais estrada pela frente.

– Eu conduzia o raio do automóvel! Acho que devíamos ter, pelo menos, saído do estado de Pensilvânia. Continuamos demasiado perto de Nova Iorque, se queres a minha opinião, mesmo depois destes quilómetros todos. Não confias em mim... – terminou com um queixume ao qual não deu a entoação de uma pergunta. Ficou, de repente, muito desanimada.

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