XVI - Paradoxos

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– Percebeste o que aconteceu?

Ele absorvia todas as sensações como se fossem novas e estava certo em sentir-se assim, porque tudo era mesmo uma grande novidade. Renascia para outro mundo e não era a primeira vez que isso acontecia, ele sabia-o. Mas nos minutos iniciais existia sempre alguma confusão e relutância.

Olhou para o pulso e não descobriu o relógio. Pestanejou, inquieto, com uma sensação amarga na boca do estômago. Alguma coisa estava diferente. E, no entanto, ele sobrevivera...

Havia uma segunda presença, alguém que lhe fizera uma pergunta. Inspirou profundamente, enchendo os pulmões novos de ar.

– Não sei muito bem o que aconteceu... Não tenho o meu dispositivo temporal. – Ousou levantar os olhos recém-adquiridos para procurar pela figura que o interpelara. – Foste tu?

E teve um arrepio ao reconhecer, por breves instantes, o outro homem.

Estavam num cenário totalmente branco, como uma camarata de hospital, mas sem qualquer mobília. O espaço parecia enorme, infinito, mas também acanhado e claustrofóbico. Uma caixa que era o que queríamos que ela fosse. Uma prisão ou um campo aberto. Era um limbo, um lugar entre dimensões. Era para ali que ele vinha quando recuperava a sua existência e cruzava o tempo, criando outro universo, outra linha temporal. Havia agora inúmeras alternativas – umas em que ele vivia, outras em que ele morria. Nem conseguia contabilizar muito bem quantas vidas teria criado. Podia continuar eternamente naquele jogo.

Terris O'Brian sentia-se cada vez mais seguro de si. Poderoso e imortal, quando o outro fez um gesto e ele petrificou onde estava. Não se debateu para se soltar daquela paralisia, porque de certo modo sabia que tinha chegado a uma espécie de limite da sua invencibilidade.

O outro, ele reconhecia agora, era o assistente do FBI, Eric Crowe. Tinham-se encontrado numa das agências do Bureau, para uma entrevista com perguntas estranhas. Tinham sido inusitadas para aquele "eu", agora que ele estava naquele limbo e tinha uma perceção global dos acontecimentos, de todos os "eu" que existiram, compreendia que fora mais um dos seus renascimentos depois de ter sido assassinado.

Baixou a cabeça e pediu:

– Será melhor que me contes, Crowe. Neste estágio começo a pensar que estou condenado a repetir gestos, ações e a minha própria morte vezes sem conta. Hei de morrer sempre, uma e outra vez, sem descobrir a solução para quebrar esse ciclo maldito.

– Muito bem, prefiro que sejas humilde e que estejas disposto a escutar-me. A brincadeira terminou, Terris O'Brian. Finalmente consegui que te encontrasses com Hugo Black para colocar um ponto final definitivo na farsa. E na perigosa aventura.

– Finalmente... conseguiste? – estranhou o cientista. – Então... és tu o chefe do Black?

O sorriso de Crowe foi mínimo. Tinha os braços cruzados e observou-o durante alguns minutos.

– Sim, sou eu. O seu chefe direto. Existem outros arquitetos, com um alcance mais abrangente do que o meu. Limito-me também a seguir ordens. Uma cadeia rígida de comando que não admite sublevações ou questionamentos. Obedecer e fazer. – Houve uma pequena pausa. – Tenho estado a verificar todo o acontecimento fazendo-me passar por um agente do FBI novato. Fui incluído na equipa de John Aldo Poleris, andei a investigar, como o inspetor, o grupo "Sentenciados", andei a seguir todos os passos de Gartix Vog e os teus, Terris O'Brian. Também os passos de Amanda Scott. Resumindo numa única frase, tenho andado bastante atento aos estragos que andas a provocar na dimensão tempo.

– E chegou a altura de parar.

– E chegou a altura de pagares o preço pelo teu crime, meu caro cientista.

SentenciadosWhere stories live. Discover now