LÍGIA TASHIRO ITO - CAPÍTULO XIII

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Lembrar, é viver de novo.

Essa frase não é de nenhum livro, é puramente meu desabafo de hoje. Me sinto frustada. Lembro do orfanato e como eu guardava a caixa documentário como um lembrete de que eu era gente, ou de que pelo menos em algum momento eu havia sido... O orfanato não é gentil com você, ele te faz se dobrar para a vida. Eu não queria estar lembrando disso... Mas é complicado não fazer o que os meus ... Salvadores ... Meus pais, pediam ou esperavam. Afinal, eu devia minha vida a eles. Então, de qualquer modo já não era mais minha vida...

Cheguei na empresa e entrei cumprimentando Tanika a recepcionista e Felipa, minha assistente, e também amiga de longa data. Felipa era do mesmo orfanato que eu, e ela não havia sido adotada, se emancipou aos 18 e eu a ofereci um emprego já que a conhecia bem para saber que ela não aceitaria dinheiro sem trabalhar ou sem achar que me devia. O salário dela é o mais alto de todos. Ela gostava de me esperar na porta quando sabia que eu estava indo, segundo ela, no espaço até a minha sala dava para ela me adiantar tudo que de sério eu tinha de resolver e assim quando, finalmente, chegássemos na minha sala, ela poderia ser menos profissional. Isso só fazia sentido na cabeça dela, mas tudo certo. Felipa era ruiva, quase tão alta quando eu e era um poço de alegria e extroversão. Eu a amava muito.

— Bom dia, senhorita Lígia - falou irônica e suavemente

- Bom dia, senhorita Felipa - respondi a altura, como sempre fazia

Ela riu e começou a andar ao meu lado.

— A senhora Samir está se divorciando e quer que o projeto da casa seja refeito. O empreiteiro da obra do porto está precisando da sua assinatura para o seguimento 2 do projeto. A licitação da praça de eventos termina o prazo nessa sexta e ainda não apresentamos nossa proposta. O escritório Lamar, está com uma nova jogada de marketing e estão procurando podres de todos os escritórios de arquitetura para jogar na mídia, mas não temos que nos assustar apenas ajudar o escritório da família Morraori a se defender dos ataques. - a essa altura já havíamos subido de elevador para minha sala e estávamos entrando. Minha sala era toda de vidro, espaçosa e com uma decoração em marrom, branco e azul escuro quase preto. - os amigos do seu pai de Kioto querem fazer uma visita. E é isso, fim! - ela disse jogando a papelada que segurava sobre minha mesa, eu a atravessei indo para minha cadeira. - e como está Anely? - disse por fim se sentando em minha frente

- Tenho um almoço marcado com a senhora Samir daqui a pouco... Não quero ir sozinha, pode me acompanhar? - perguntei esfregando a ruga entre minhas sobrancelhas - eu não estou com cabeça para trabalho hoje, sabe bem onde está minha cabeça, não é? - lamentei

- Amiga... - puxou a cadeira a minha frente sentou-se, era raro, mas as vezes acontecia - essa história da Isabelle doar um rim para sua mãe é uma loucura... Dona Aisha é a mulher mais saudável que eu conheço... Até agora estou sofrendo com essa notícia...

- Acreditei tanto que esse era o momento certo para mim e Anely, esperei tanto para finalmente tê-la de volta, Lipa- bufei frustada - não posso mais demostrar interesse nela, e nem tentar encontrá-la... Tudo por causa de um erro meu, tudo por causa do meu ciúme e da minha raiva desmedida

- Olha, Lígia, não é sua culpa achar que o relacionamento deles era o que ela queria para a vida, não é sua culpa, você só não a conhece mais como achava que conhecia, naquele dia você levou um fora e achou que era finito, mas talvez ela só quisesse tempo para entender... Tudo... Pra você, ela é o amor adolescente que pretendes resgatar... Para ela, você é uma pessoa totalmente nova... Que entrou na escola dela agora e sta confundindo os sentimentos dela. Tenha paciência com a Anely que ela é hoje. Também precisa considerar que talvez a sua Anely não exista mais.

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