Capítulo III

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Transcorrida uma semana desde que aportara em St. Andrews, George se aproximava de uma decisão importante na vida. Não havia pensado chegar tão cedo àquilo, mas Elizabeth o levara a caminhar por aquela estrada. Por si, antes de conhecê-la, ficaria sozinho pelo resto de seus dias, navegando por mares distantes e conhecendo o prazer na cama de mulheres de diferentes culturas. Queria ser livre e uma mulher era o total contrário de liberdade.

Elizabeth, no entanto, era diferente. Era filha de um almirante, portanto, conhecia a vida de um marinheiro, além disso, sonhava com o mundo lá fora. Tinha aquele olhar amendoado travesso, um sorriso sempre pronto a armar-se apenas para desarmar quem o recebia. Ela era, em suma, seu perfeito contraste. Enquanto ele era grande e corpulento parecendo mais velho, ela era pequena com o corpo magro. Ele parecia um homem selvagem e autoritário enquanto ela exalava graça e elegância. Era toda sua metade e George decidira tomá-la para si.

"Senhorita Mackenzie, posso acompanhá-la no passeio?", ele perguntou com gentileza quando conseguiu alcançá-la na entrada do jardim de Kenbridge.

"Claro, capitão! Seria um prazer", assentiu sorrindo e pousando a mão no braço que ele oferecia para que caminhassem juntos.

"Estava esperando por uma oportunidade de lhe falar a sós, Elizabeth", apesar de uma pequena ansiedade que tentava tomar-lhe os sentidos, a voz do homem não falhava, porém, adquirira, apenas para aquela ocasião, um tom mais brando, mais sereno.

"E eu estava esperando uma ocasião para ficar a sós com você, George", ela respondeu sem o olhar, mas havia provocação e travessura na voz dela.

"Imagina o que tenho a lhe dizer?", inquiriu também sem fitá-la nos olhos, pois eles, aquele par quase dourado de olhos, o distraía.

"Tenho uma vaga sugestão, mas precisamos seguir certas formalidades. Na verdade, meu querido capitão, o senhor precisa seguir um certo protocolo", comentou num sussurro parando e permitindo que George desse mais dois passos antes de se postar na frente dela.

"Eu realmente nunca deixarei de me surpreender com você, Elizabeth...", sussurrou George em meio ao um riso divertido enquanto tomava a mão dela entre as suas e a beijou.

Naquele exato momento, ouviram-se gritos chamando por George. Eram fortes e pareciam se aproximar cada vez mais. Ao voltar sua atenção para a direção da casa, o capitão Stanfield viu Jack, seu ordenança, correndo sem sua direção.

"Com mil diabos", soltou uma maldição baixinha enquanto beijava novamente a mão de Elizabeth. "Já retorno para nossas pendências, Elizabeth", disse e logo foi de encontro ao homem com um semblante insatisfeito. "O que é?", sua voz era forte com o marinheiro que vacilou dois passos para trás antes de estender ao seu superior uma carta. Tinha o selo e o brasão Milford, era o brasão de seu pai. Ele hesitou.

"Há uma carruagem o aguardando, milord", o ordenança informou a meia voz enquanto George tirava a carta da mão dele e rompia o lacre com violência.

Stanfield Manor, 15 de julho

George,

É com pesar que devo informar que Will nos deixou, sucumbindo a uma febre de quarenta dias. Volte e venha assumir seu lugar como meu herdeiro. A noiva de William, lady Agnes Branson, espera para conhecê-lo e prosseguir com o compromisso para com nossa família.

Até breve,

Lord Edward Stanfield

Duque de Milford e seu pai

"Maldição!", resmungou George passando os dedos pelo cabelo enquanto amassava o papel da carta. "Que maldição!", e como um animal nervoso passou a andar para lá e para cá. "Mil vezes maldito seja, William!", murmurou desgostoso virando-se para onde havia deixado Elizabeth, que se aproximava. "Vá, Jack. Vá e arrume minhas coisas", ordenou sem olhar para seu assistente. O jovem partiu sentindo-se aliviado por não ter que aguentar o mau humor do patrão.

"Aconteceu algo", ela não perguntou. Elizabeth intuiu assim que pôs os olhos em George. Ela podia sentir a frustração dele sem precisar se aproximar muito. Havia um brilho de tristeza no fundo dos olhos dele que fez seu coração doer. "Vamos", sua voz soou doce enquanto se aproximava dele. "Divida comigo", ela tentou sorrir, mas, por um motivo desconhecido, não pôde.

"Meu irmão morreu. Tenho...tenho que partir para assumir seu lugar de herdeiro...", havia raiva na voz dele. Algo que Elizabeth nunca poderia entender. Afinal George acabara de perder o irmão como podia ter raiva?

"Sinto pela sua perda...", suspirou mordendo o lábio e com os olhos enternecidos, tomou uma mão dele como se assim pudesse confortá-lo. "E sinto que tenha que deixar a Marinha..."

"E terei que deixar você, Elizabeth", disse olhando aquela criatura. Foi a vez dele tomar-lhe as mãos e beijando-as, aproveitando para sentir a maciez de seus dedos. "Will, meu irmão, estava noivo. E meu pai não deseja desfazer o compromisso. Eu não quero...", hesitou.

"Mas é o seu dever, meu querido", soou a voz controlada de Elizabeth enquanto tomava com as mãos o rosto daquele homem que havia se instalado no seu coração e o acariciou sentindo a pele áspera sob seus dedos. "É o seu dever, George", repetiu para si mesma enquanto sentia a barba espessa fazendo cócegas nas suas mãos.

"Eu a quero...", ele confessou com um ar de menino com os olhos tão desesperadamente tristes que tudo o que Elizabeth pôde fazer foi correr. Certamente engasgaria num choro se dissesse a ele o quanto ela o queria, portanto, seu mais íntimo dizia para terminar com aquilo logo e sair da vista dele. Correu sem rumo entrando pelo bosque e se afastando já com as lágrimas reprimidas descendo pelo rosto. As palavras estiveram ali na ponta da língua, mas ela não pôde. Iria confundi-lo e ela sabia que um homem nobre sempre deveria cumprir seu dever. O de George agora era ser herdeiro e se casar com uma bela nobre. O de Elizabeth era rezar para que ele fosse feliz e ela pudesse encontrar um homem para ter uma família.  




O azul dos olhos teusWhere stories live. Discover now