Capítulo XV

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Ao contrário de Ayton, que era sóbria e um tanto escura, Kenbridge era uma propriedade que ficava sob uma planície e recebia luz do sol e os ventos do oceano todo tempo, mesmo nas estações mais frias, aquela propriedade era melhor iluminada e agradável como um suspiro de fim de tarde. Desde a morte do Almirante Mackenzie, a elegante residência de tijolos vermelhos servia de residência de verão dos Graham, cuja matriarca era a única filha do falecido proprietário. A posição levemente elevada da sede da propriedade permitia uma visão do lago Ken, ao norte; a leste, o bosque Kenwood; a oeste, as criações da família e ao sul, a estrada.

Naquele dia de verão cuja brisa abrandava o calor, lady Graham esperava seus convidados cujas as carruagens podiam ser vistas se aproximando a toda velocidade pela via de cascalho que trazia até o pátio de entrada.

A primeira carruagem parou logo em frente a baronesa e dela desembarcou uma senhora rechonchuda e pequena com rugas que denunciavam seus muitos anos de vida.

"Essa travessia toda ainda há de acabar com minhas costas", resmungou lady Dungarvan assim que abraçou a sobrinha. "Oh, Lizzie, finalmente, criança! Ao menos está bem saudável, é o que vejo", observou com argutos olhos âmbar. "Não irei esperar os Stanfield desembarcarem. São muitos e preciso me sentar. Quero ver meus meninos!", a viscondessa falava alto num tom musicado como se chamasse as crianças. Logo, sua voz mansa morreu no interior da casa e Elizabeth voltou sua atenção para os demais veículos, que se aproximavam.

Assim que a segunda carruagem parou, George desembarcou e ela não pode esconder uma expressão preocupada. A aparência do duque não poderia ser pior. Tinha um ar cansado, os olhos, envelhecidos e os cabelos desgrenhados. Quando este pousou os olhos na figura da baronesa, viu nela seu descanso. E isto fez lord Milford esboçar um sorriso e cumprimentou-a com a cabeça.

"Lady Graham", sua voz rouca se dirigiu a ela naquele tom reservado apenas aquela figura que ainda, mesmo depois de tanto anos, lhe enternecia o coração.

"Milord", respondeu junto com uma reverência curta, mas polida.

Logo, a baronesa ouviu uns resmungos infantis e sua atenção se deteve na presença de uma criada carregando um embrulhinho nos braços. A visão do bebê órfão de mãe e, segundo o que tia Dungarvan dissera, com uma fome insaciável fora o bastante para quase por Elizabeth em pranto, mas esta o segurou enquanto se aproximava para ver o rosto da pequena.

"Olá, pequena. Como se chama, querida criança?", perguntou beijando-lhe a fronte enquanto a menininha capturava seu coração com um olhar azul tão poderoso quanto o do pai.

"Permita-me, milady, apresentá-la a lady Elizabeth Augusta Stanfield...", a voz de George veio de detrás de Elizabeth. "A sua afilhada...", anunciou com um tom mais baixo.

Assim que ouviu aquelas palavras, a baronesa se virou para o duque e este pôde ver nos olhos da mulher o maravilhamento e a perplexidade no qual ela estava mergulhada no momento. Havia também repreensão chispando naqueles olhos amendoados, ele observou.

"Elizabeth. A pequena Ella", e dizendo isto de maneira solene, ela se virou novamente para a criada e o bebê. "Eu cuidarei de você", suspirou lançando um olhar a criada que deixasse a menina vir para seu colo.

O duque de Milford não poderia pedir cena mais terna ao ver suas duas Elizabeth juntas pela primeira vez. A baronesa tinha um sorriso que era todo da filha caçula. Havia um segredo naquele sorriso, um mistério travesso que aquelas duas mulheres, a maior e a pequena, trocavam silenciosamente.

"Obrigado por nos receber", lord Milford disse trazendo o olhar dela para si.

"Faria o mesmo por mim", ela respondeu com um aceno de cabeça gentil.

Da última carruagem, saltaram três meninos, dois tinham cabelos castanhos espessos com caracóis desarrumados e olhos azuis; um, o mais velho, tinha os cabelos claros como os da mãe, e, por fim, uma menininha com os mesmo cabelos escuros do pai. Os quatro Stanfield mais velhos pareciam muito magros e pálidos. Excetuando William, todos estavam quase trêmulos de medo. Aquela imagem das quatro crianças juntinhas e meio encolhidas fez doer o coração da baronesa.

"Sejam bem-vindos, pequenos", a anfitriã usou um tom maternal de voz e tinha um sorriso acolhedor que parecia quase um abraço confortável, pensou o duque. "Estão com fome?", ela perguntou olhando cada um dos meninos. "A senhora Fitzgerald vai mostrar a vocês onde poderão se fartar com o sanduíches que fizemos", a baronesa apontou para a alta e esguia governanta que surgira logo no hall de entrada. Num silêncio sepulcral, os quatro infantes seguiram a criada até sumirem da vista dos adultos.

"Vá com eles enquanto coloco a pequena numa roupa mais confortável", indicou lady Graham ao duque quando já estavam entrando por uma porta. "Não irei me demorar", ela disse voltando toda sua atenção para a bebê em seus braços. "Hora de uma boa refeição, querida", sussurrou apenas para sua afilhada.   

O azul dos olhos teusWhere stories live. Discover now