Capítulo XIV

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Passada uma semana do funeral da duquesa de Milford, a família Stanfield se instalou Stanfield Manor, em Norfolk. Não era a maior residência que o duque de Milford possuía, mas tinha verde e calma suficientes para um momento de luto que George desejava para sua família. Além disso, era o melhor lugar para que as crianças pudessem ficar ao ar livre. Todavia, apesar das tentativas paternas, nada fazia com que os pequenos saíssem explorando pela vastidão daqueles domínios. A verdade era que, se não visitasse a ala infantil, George veria as crianças apenas durante as refeições.

Mesmo a pequena Elizabeth, com quem passava horas caminhando de uma parte outra, voltara ao mau humor e ao choro dos primeiros dias. E fora numa dessas cenas da contrariedade da pequena que lady Dungarvan foi introduzida no recinto pelo mordomo.

"Milord!", exclamou a dama impressionada com a cena de um homem daquele tamanho e posição tendo que lidar com um bebê chorão. "Cheguei em hora imprópria..", lamentou a mulher com um sotaque cantado e um olhar de curiosidade.

"Não, milady...", mentiu George enquanto tentava segurava a menina que parecia se contorcer toda.

"Veja só! Este chorinho é de fome!", a voz macia da mulher se fez ouvir e logo, ela despiu as luvas e se aproximou do pai e da criança com agilidade. A viscondessa-viúva de Dungarvan era uma senhora pequena que tinha doçura em todo seu ser e as rugas que tinha no rosto eram dos sorrisos com os quais brindava a todos no mundo. "Por certo, esta mocinha linda está sem comer direito", a velha dirigiu-se a menina que parou com a choradeira. Sem nenhum aviso, ela pegou lady Elizabeth dos braços do pai sem vacilar e tomou a menina nos seus braços rechonchudos.

"A ama dela disse que não há mais leite", confessou George aproveitando que havia uma presença feminina lúcida por perto. Afinal, sua vizinha, a viscondessa, era conhecida por sua discrição.

"Que provação o senhor deve estar passando, milord", suspirou enquanto tirava risinhos da menina ao fazer gracinhas e cócegas para aliviar o desconforto da menina. "Ao menos, os maiores não parecem dar trabalho. Mal se ouve o som de crianças na casa".

"Madame, sei que posso contar com sua amizade e sabedoria", suspirou George passando a mão pelos cabelos, sentindo-se realmente cansado. "Portanto, devo confessar que preferiria que aqueles quatros estivessem correndo por ai, mas vivem na ala infantil sem o menor sinal de que estão vivos".

"De certo, sentem a falta da mãe", a viscondessa comentou com delicadeza enquanto se sentava numa poltrona. "Mas ao que vejo ao menos o senhor está tentando", o tom usado foi elogioso e George ganhou um sorriso condescendente da dama.

"Isto é muita bondade de sua parte, milady", o tom não era de agradecimento pelo elogio, mas de lamento pela própria condição. "Todavia sinto que meu trabalho não têm rendido. Meus filhos não têm comido direito e esta pequena suga até a alma de sua ama e não se vê engordar uma libra que seja".

"O falecido visconde dizia que quando a formiga olha apenas para o trabalho do dia deixa de ver o tamanho do seu esforço do mês", havia algo de sábio na voz de lady Dungarvan ao dizer aquelas palavras. "Este não é um trabalho imediatista, milord. Ser pai é moldar o caráter de um outro ser humano, guiar seu espírito para o bom e o justo e mostrar as consequências de tudo o que é desprezível. Isto não é trabalho de umas poucas semanas, mas de uma vida", ao terminar aquele pequeno discurso com sua voz doce e melodiosa, a velha dama indicou que a pequena Elizabeth estava adormecendo. "Nada como o sotaque irlandês para fazer uma crianças pegarem no sono", comentou com um arzinho travesso.

"Eu lhe beijaria as mãos se não estivessem ocupadas, milady", o pai comentou com um sorriso de alívio. Afinal, nada partia mais seu coração do que Elizabeth chorando.

O azul dos olhos teusWhere stories live. Discover now