Capítulo XVIII

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Ao longo dos dias, uma pequena inversão se operou, observou lady Dungarvan. O duque passou aos poucos assumir a liderança dos eventos da casa com alguma naturalidade e até passou a ser a figura que as crianças procuravam para resolver suas intrigas tanto os filhos quanto as crianças Graham. Ele já não inspirava medo, mas tinha ganhado o afeto dos pequenos que se sentiam mais a vontade na sua presença grande e corpulenta. Elizabeth, por sua vez parecia ter adotado em seu coração as outras cinco crianças ao guiá-las no dia-a-dia como se fossem suas sem exceder os mimos ou as repreensões, percebera a viscondessa. Quando juntos, a sobrinha e o duque se completavam nas ações. Durante o dia, se revesavam, quando um estava com os meninos em atividades externa, o outro estava na casa. Após o jantar, este guiava os meninos ao quarto pessoalmente enquanto ela ia ter com as pequenas junto com Alexandra. Ou então, na forma de repreender. Ela lançava um olhar duro e ele completava bronca com um tom grave e sério, mas sem elevar a voz.

"Funcionam como um casal", lady Dungarvan verbalizou alto seus pensamentos durante um chá com a sobrinha.

As duas mulheres estavam no caramanchão florido de Kenbridge. Uma mesa de chá foi posta ali para que as duas damas pudessem assistir a partida de críquete entre os meninos Stanfield e os Graham. Elizabeth olhava para o gramado que se descortinava a sua frente. As crianças riam e corriam sob supervisão do duque, que servia de juiz e professor.

"Perdão, titia?", disse a baronesa inquiriu ainda distraída com o jogo.

"Você e o duque, criança...", lady Dungarvan disse baixinho.

"O que tem nós dois?", Elizabeth voltou a questionar sem entender direito o que a tia queria dizer. Sua atenção estava não no jogo exatamente, mas na segurança das crianças.

"Você e o duque funcionam um casal", repetiu a viscondessa com certa impaciência.

Lady Graham levava a xícara a boca, mas, diante daquele comentário, parou no meio do caminho entre o píres e a boca e, finalmente, voltou seu olhar para a dama ao seu lado com uma expressão de choque.

"Por que a surpresa, menina? Não disse que o são", tia apressou-se em dizer remexendo-se na cadeira. "Mas que funcionam como. Sobretudo quando se trata das crianças".

"Ele já não teme tanto ser pai e as crianças descobriram que o adoram", Elizabeth usou toda a casualidade que possuía para tratar do assunto.

"E ele é um homem muito bonito...", a tia parecia falar consigo mesma com um pequeno sorrisinho encantador. "Tem um rosto muito sério e maduro para a idade, mas faria um bom par..."

"Lord Milford não é um homem feio, de fato", Elizabeth rezava para não corar diante daquele assunto. Afinal, era sua tia falando e ela, a baronesa, ainda era uma viúva.

"Ora, Lizzie, ele não é apenas 'não feio'", resmungou a tia. "É um homem muito bonito, eu diria. Logo que sair do luto, se tornará o partido mais cobiçado do país, guarde minhas palavras. Principalmente quando descobrirem que o garoto é um doce e as crianças são adoráveis"

"Não tenho dúvidas disso", murmurou entre os dentes aborrecida que o assunto se encaminhassem para aquilo.

"Ele olha para você, sabia?", disse, de repente, a viscondessa em tom de confidência. Ao observar os dois num mesmo recinto, lady Dungarvan viu não apenas uma vez o olhar do duque vagar pela sobrinha. Não era um olhar sem sentimento ou sem interesse. Havia um calor naquele olhar, algo profundo que a velha não conseguia dimensionar, mas sabia que havia algo.

"Ele não é um homem cego", brincou a baronesa com uma piscadela.

"Estou de pleno acordo. Ele não é cego a sua beleza, Lizzie", retrucou a tia com docilidade.

"Oh, titia!", escandalizou-se lady Graham, afinal, a tia não era dada a ser casamenteira.

"Apenas estou dizendo os fatos", a dama comentou encolhendo os ombros, mas logo distraiu-se batendo palmas para William que rebatera a bola para longe.

Elizabeth calou diante daquela informação. Na verdade, muito impressionava que a tia chegara aquela cogitação de um mundo onde ela, Elizabeth Graham e seus cinco filhos, e George Stanfield, com seus cinco rebentos, poderiam ser uma família ou simplesmente que aqueles dois corações enlutados pudessem ser um casal. A ideia era um total absurdo, principalmente fazendo tão pouco tempo que James e Agnes houvessem deitado em sono eterno. Não, Elizabeth e George, na mente da baronesa, era uma possibilidade deixada no tempo da juventude e uma perspectiva sem nenhum futuro.

Todavia, ela seria uma mentirosa, caso negasse, toda vez que seus olhos encontravam os do duque, ela fervia por dentro. Não podia explicar como ou o que a levava aquilo, mas lady Graham sentia todo seu mundo parar por um par de instantes quando os olhos de George liam o mais profundo pensamento que tinha. Era uma ligação que havia experimentado apenas com ele no passado e, agora, lá estava tão forte, acesa e dilacerante quanto ferro em brasa, como se nunca houvesse sido suprimido pelo sentimento cordial e confortável de estar com James. Aquilo tudo, toda aquela profusão de sentimentos e lembranças fervia brandamente, sufocada pelo dever com os filhos e para com o legado do marido. Uma vez mais, ela pensou, o dever separa o sentimento.  

O azul dos olhos teusDonde viven las historias. Descúbrelo ahora