Capítulo XXII

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A noite não poderia ter sido mais cansativa para Elizabeth. Ao senhor Burton se seguiram, lord Hereford, seu anfitrião, lord Kendal, o almirante Leigh e o capitão Stanley. Todos quiseram uma dança e depois uma longa conversa da qual não se completava, pois um outro chegava para exigir sua vez. Se fossem todos ao menos dotados de alguma elegância ou discrição, ela teria dançado satisfeita, mas, com exceção do anfitrião, todos os cavalheiros não passavam de homens muito tolos e fúteis.

Juntando todos, não daria meio George, pensou enquanto tratava de sair de fugir do salão de bailes para tomar algum ar. Nenhum daqueles homens a dominava como o olhar de George fazia. Eles se deixavam subjulgar pela sua beleza ou seria por sua fortuna? Fosse o que fosse, havia apenas um homem em todo salão capaz de cumprir o papel como companheiro de uma conversa inteligente e sagaz, mas este, ao menos da última vez que ela verificara com o olhar, se encontrava cercado de senhoras que pareciam visivelmente interessadas nele.

"Finalmente consegui te achar, criança", disse uma muito esbaforida lady Dungavan ao encontrar a sobrinha a caminhar pelo lado menos iluminado do salão. "Pensei que nunca mais seria liberta por aqueles homens odiosos", suspirou num tom dramático.

"É sempre assim aqui?", inquiriu a baronesa ajudando a tia a se sentar numa cadeiras que as punham atrás de uma enorme coluna, que as escondidam da curiosidade alheia.

"Certamente que não, você causou uma comoção e tanto!", afirmou a tia acomodando-se ao lado da baronesa. "Ouvi uma ou duas mães lamentando o seu retorno visto que olhos bem importantes se voltaram com interesse para você"

"A senhora não está sugerindo novamente que...", ela hesitou e prosseguiu. "Que eu deva..."

"Que você deve se casar?", interrompeu a viscondessa com seu tom sereno de falar. "Sim, estou. Ora, menina, você poderia ainda fazer um bom casamento para garantir ter um bom homem com quem dividir o leito pela noite"

"Tia!", era impossível não corar ante aquele comentário. Ela sabia que era verdade, claro. Afinal, por três anos, ela vinha sendo apenas a mãe e a senhora de Ayton, subjulgando qualquer carência que o corpo sentia. Havia vestido o manto de viúva séria, fria, dedicando-se apenas aos filhos e esquecendo-se do próprio coração.

Enquanto sobrinha e tia conversavam sobre disposições físicas do matrimônio e a falta destas na condição de viúva, o duque de Milford se livrava das garras das mães casadouras pelas mãos de um conhecido, lord Alton, um dos solteiros mais convictos de toda a Inglaterra. Com a desculpa de discutir negócios de governo, os dois homens se retiraram do salão e foram desfrutar de uma conversa em outro recinto mais calmo.

"Já selecionou uma noiva para si, Milford?", ironizou Alton assim que se sentaram num canto mais afastado de um salão onde pequenos grupos jogavam cartas. "Tinha um punhado interessante a sua volta quando eu o salvei".

"Deus, não. A safra está terrível", resmungou George impaciente. "Só há tolas e fúteis. Não tenho tempo e ânimo para ser tutor de uma esposa".

"Vê? É por isso que não casei. Desfruto das mulheres sem precisar dessas amarras legais", o outro comentou com o tom relaxado. "Para isto, existem as mulheres mais doces do mundo, que são as viúvas e, nesta temporada, há uma safra interessante de viúvas", o sorriso do conde de Alton foi sugestivo o suficiente para deixar seu interlocutor inquieto.

"E tem alguma em vista?", inquiriu o duque num tom mais baixo. Não costumava perguntar das aventuras do amigo, mas algo lhe dizia que tinha com o que se inquietar com aquela específica.

"Fico satisfeito que você tenha perguntado, Milford. Talvez você possa me ajudar a fomentar esse idílio, caso não esteja tirando proveito de sua posição privilegiada e próxima...", Alton disse com um brilho faminto no olhar.

"E de quem estaríamos falando? Por que não estou tirando proveito de nenhuma situação", resmungou um nada humorado duque de Milford.

"Da baronesa-viuva Graham, a mais deliciosa viuvinha que Londres jamais viu, meu amigo", o outro respondeu como se fosse óbvio que a única viúva a ser olhada era lady Graham. "As ruivas sempre me atraíram e sobretudo uma de espírito tão forte e beleza tão deslumbrante", Alton suspirou como se estivesse diante do objeto de sua atenção e lord Milford sabia que aquele homem pensava em Elizabeth junto a si. O rosto dele denunciava que ele imaginava um contato mais íntimo com a baronesa e aquilo era enervante para o duque. A mulher, física e espiritualmente, deveria lhe pertencer e não a um libertino que sonhava coisas torpes com ela, mas antes que George pudesse expressar qualquer horror as intenções de Alton, este seguiu falando. "Sei que é protetor dos filhos dela e seu conselheiro mais antigo, Milford. Ah, meu bom amigo, só peço que me apresentes a ela e prometo ser um bom menino", pediu ele num tom dramaticamente suplicado que irritou George ainda mais.

"Acha que seria conivente com você, senhor, diante de tais planos?", inquiriu o duque com um tom ameaçador e baixo na voz. "Acha que seria responsável por entregar a viúva respeitável do melhor dos amigos a um libertino?"

"Ora, meu bom Milford, meus planos são pacíficos. E não precisa ficar tão alterado por causa de uma viúva. Deverias ter te aproveitado da proximidade com ela...agora que não o fez deixe o caminho livre", disse o conde com um tom contrariado . "Se não vai me ajudar, hei de apelar a tia da baronesa. A velha irlandesa sempre foi com a minha cara", antes mesmo que George pudesse impedi-lo, seu companheiro irritante já havia partido. E mais uma vez na vida, lord Milford viu alguém passar na frente de si no caminho até Elizabeth.  



O azul dos olhos teusWhere stories live. Discover now