Capítulo Sessenta e três

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Entre chuvas e lágrimas


Definitivamente eu odiava os dias de chuva. Se já não bastasse o fato de ter perdido meus pais em um dia como aquele, agora também teria que conviver para sempre com o fato de ter perdido a mulher da minha vida em um dia semelhante. Ela já havia saído do alcance dos meus olhos mas eu permaneci ali no mesmo lugar, imóvel. Tudo ao meu redor girava sem parar. Aos poucos meus sentidos pareciam abandonar meu corpo me levando a um universo onde não existia nada além do vazio e o som das gotas da chuva caindo sob o telhado faziam com que aquele momento fosse ainda mais agoniante ao ponto de eu não conseguir nem ao menos ouvir os meus próprios pensamentos. Por mais que o que eu mais quisesse naquele momento fosse encontrar uma forma de trazê-la de volta e consertar o que eu havia dito, naquele instante eu só queria que aquela droga de chuva parasse.

Entrei em casa levando ao chão tudo que havia pela frente. Derrubei a mesa da sala com o vaso chinês que se espedaçou por todo o chão, em seguida fui para a sala onde a destruição em massa começou. Sem nem ao menos pensar arranquei um dos quadros da parede e o arremessei contra o armário de vidro que explodiu em milhares de pedaços. Fragmentos de vidro voaram contra meu rosto e meus braços me fazendo sangrar imediatamente mas aquilo não me fez parar. Nada mais me importava, meu coração estava sangrando por dentro em uma hemorragia que só terminaria quando não restasse mais nada de mim,  sangrar por fora então era apenas uma consequência do meu trágico fim.

Arremessei uma cadeira contra a mesa de jantar com toda minha força. Do que me adiantava ter voltado para aquela droga de mansão? Eu tinha tudo que uma pessoa desejaria conquistar no auge de suas vidas mas aquelas coisas caras ao meu redor não traziam sentido algum para minha existência, pelo contrário, naquele momento eu sentia como se tivesse perdido absolutamente tudo e não tivesse mais nada. Foi quando notei uma garrafa de Whisky que havia caído da prateleira no chão mas não havia se quebrado. Fui até ela. A apanhei em meio aos cacos de vidro. Me lembrei de como o efeito do álcool havia me feito esquecer da minha existência na última vez que eu o havia consumido. Era exatamente aquilo que eu precisava. Esquecer que eu estava vivo. Sem pensar virei a garrafa inteira goela abaixo de uma só vez.

Após bebê-la por completo, arremessei a garrafa contra a parede fazendo-a explodir em milhares de pedaços e continuei a destruir tudo que estava na minha frente na intenção de que o barulho das coisas se quebrando ocultassem aquele som insuportável de chuva. Meus olhos agora estavam coberto de lágrimas.-Seu idiota!- Eu gritava comigo mesmo sem parar. -Por que você deixou ela partir?- Eu continuava a destruir minha casa, mas ainda era possível ouvir o maldito som da chuva.

Foi quando olhei na direção da lareira e avistei jogadas ao chão as cartas que Sarah havia me escrito. Fui até elas. Completamente tomado pela raiva e sob o efeito do álcool apanhei todas nas mãos e sem pensar duas vezes joguei todas no fogo. Ainda com os olhos tomados pelas lágrimas sentei no chão em frente a lareira e observei enquanto elas queimavam lentamente.

Por um instante eu realmente havia pensado que tudo daria certo. Que o amor que Sarah e eu sentíamos um pelo outro surgiria novamente e que o nosso para sempre seria retomado de uma vez por todas, mas num piscar de olhos tudo havia desmoronado tão sutilmente quanto um castelo de cartas diante de um sopro. Eu sabia que poderia me arrepender mais tarde por queimar todas aquelas cartas pois eram a última lembrança que ela havia deixado comigo, porém naquele momento nada mais importava, e foi diante daquele som do papel sendo consumido pelas chamas que por fim consegui distrair meus ouvidos com outro som que não fosse o som da chuva.Encostei minha cabeça na parede ao lado da lareira e por fim adormeci.

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