Capítulo 1 - Ao entardecer

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Meus pensamentos... um turbilhão! A razão dizia: Prenda-a! Então, por que não conseguia dar um passo?

Parei de respirar - e não sei exatamente por quanto tempo fiquei sem ar - vendo aquela bela jovem de cabelos ruivos brilhantes, que formavam cachos até sua cintura fina, dançando de forma sensual e enigmática, dando voltas em torno daquela pedra pontiaguda. Ela estava com seus olhos fechados... Como não tropeçava e não batia naquela pedra? Parecia estar em transe, totalmente imersa no que fazia.

Meu coração batia forte e descompassado, deixando-me envolver naquele doce som que saía de sua flauta, como se meu espírito deixasse meu corpo e se juntasse a ela. Por um momento senti que pertencíamos um ao outro, que algo estava predestinado a nós. – Isso é loucura! Pensei. Não conseguia me concentrar em mais nada, a não ser naquela doce, delicada e frágil mulher à minha frente.

Ela não podia ver-me, pois a árvore que estava a minha frente me cobria e a distância consideravelmente longa entre nós me livrava do perigo de ser descoberto.

− Ela é tão linda!

Seu corpo fazendo movimentos graciosos e circulares, ao ritmo daquela música suave e envolvente me hipnotizava. O suor começou a escorrer pelo meu rosto e minha boca estava seca, dificultando ainda mais a minha respiração.

Estava sozinho. A pequena tropa ficou no acampamento não muito longe dali. Olhei para trás, me certificando de que não fora seguido por um deles, pois tinha dito que precisava evacuar o javali que tínhamos caçado na noite anterior à minha chegada.

Muito bem. Somente nós dois, eu e ela, naquele frenesi todo.

O vento frio daquele início de inverno ajudou-me, pois meu corpo - de repente - ficou quente demais. O suor escorria em gotas da minha fronte, sobre meus olhos. Passei a enxugar meus olhos freneticamente. As folhas caídas estavam úmidas e escorregadias, mas os tons variados de verde das árvores e plantas ainda eram vívidos, tornando aquele ambiente ainda mais belo.

O sol, ao entardecer, fazia seu espetáculo. Entre as colinas, colorindo o céu de dourado, fez-me cego por um instante. Sua luz tocava o corpo dela e um pequeno nevoeiro a envolvia, tornando aquilo ainda mais enigmático. Por um momento, pensei que minha mente estava pregando-me uma peça. Ela seria real?

Em meus quase quarenta anos, bem vividos, tinha visto mulheres belíssimas, mas a mulher bem a minha frente não se encaixava em nada com as que conheci.

Enquanto meus pensamentos viajavam, de repente o som da doce flauta cessa, fazendo com que toda minha atenção se voltasse para ela. Sentou-se abaixo da pedra repousando suas costas, contemplando o pôr do sol e seus raios amarelados batiam em seu rosto - fazendo-o brilhar. Neste momento, pude perceber o quanto era realmente bonita: parecia um anjo. Então, ela sorriu. Uma imagem que parecia mais uma pintura, o qual levaria comigo para onde quer que fosse. Seu vestido - verde musgo e que tinha mangas longas - cobria seus pés e deixava apenas suas delicadas mãos à mostra.

Sentia minhas pernas formigarem por estar naquela posição em pé e parado, por um longo tempo, observando-a. Precisava me mover, foi então que um esquilo assustado saltou em mim e mordeu minha mão que estava apoiada na árvore. Um "ai" inevitável saiu da minha boca.

– Droga! – praguejei baixinho, refugiando-me ainda mais atrás da árvore.

Ela se virou, e por pouco, me viu! Meu coração quase parou, temendo ter sido pego. Esperei por um pouco de tempo e voltei a espiá-la com cuidado. Ela já havia levantado e agora descia o monte, me deixando ali, feito um adolescente apaixonado – perfeito imbecil.

Certamente iria para junto de sua tribo, que tentamos há meses fazer contato. Isso me fez voltar completamente ao estado normal e ao motivo de estar ali.

Caminhei de volta para o acampamento, atordoado.

Precisava organizar meus pensamentos. Ela fazia parte de um povo pagão e o próprio Imperador me incumbiu de civilizá-los, para que o Cardeal pudesse fazer sua parte.

Eram selvagens. Bem, aquela moça não parecia assim tão selvagem... Mas por que não quero falar dela - e do que tinha presenciado - para meus soldados? Ela só pode ter lançado algum feitiço, ela é uma bruxa, e tem que ser exterminada!

Meu coração nesta hora gritou: Não!

Mas o que há comigo? O que aquela bruxa infeliz fez comigo?

− Kizar... recomponha-se! – censurei-me.

A Luz e o Herdeiro (Completa)Where stories live. Discover now