05 | Sorte no azar

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"As rachaduras não vão se consertar e as cicatrizes não irão desaparecer

Acho que eu deveria me acostumar com isso"

— Always, Gavin James.

Eu estava ciente do que o dia de hoje significava. E, levando em consideração o olhar acalentador que minha amiga me lançava vez ou outra, ela também sabia.

Eu geralmente não marco datas, tampouco o significado de cada uma delas.

Mas essa em particular era difícil de esquecer. Eu já havia tentando.

Já se passaram dois anos, mas as memórias ainda estão grudadas em minha mente como malditas sanguessugas; presas em minha carne, vivendo à mercê do meu sangue.

Cada mísero e doloso detalhe me faz sangrar.

A forma como seu corpo balançava ao ser pendido pela corda grossa e resistente. O tormento que preenchiam seus olhos, mesmo que esses não carregassem mais nenhum resquício de vida. O nó minuciosamente posto em prática, tendo sido perfeitamente feito para que não se desfizesse quando ela parasse de se apoiar no pequeno banco de madeira e passasse a ter todo o corpo sustentado pela corda enrolada em seu pescoço.

— Nós vamos hoje, certo? — Cora me trouxe de volta à realidade. Seu tom de voz era baixo e receoso.

Ela havia sido convidada para uma "pequena" festa em uma fraternidade e insistia para que eu a acompanhasse. Eu sabia qual era o objetivo real dela. Ela queria me distrair e ocupar minha mente o suficiente para que eu não pensasse em mais nada.

— Certo — confirmei.

Eu precisava mesmo me distrair e, fingindo não saber os verdadeiros intuitos da minha amiga, eu a deixaria fazer isso por mim.

[...]

— O vermelho ou o azul? — Cora segurava cada vestido em uma mão, os balançando.

— O vermelho.

Ela concordou e sorriu, começando a se despir e colocando o vestido vermelho escuro.

— Você vai usar o quê?

Dei de ombros. Não costumava ser muito seletiva com roupas e nem estava animada para tal coisa hoje.

— Um short jeans, uma blusa...

— Nem que a vaca tussa! — Cora me interrompeu.

Ela me lançou um olhar repreendedor, parando para pensar antes de sair do quarto. Quando voltou, alguns minutos depois, trazia consigo um vestido cinza cintilante de alças finas.

— Esse deve servir.

Após muita insistência vinda de Cora e muita resistência minha, coloquei o vestido. O tecido se ajustou perfeitamente ao meu corpo e ia até o meio das minhas coxas. Meus cabelos estavam soltos e o rosto livre de qualquer tipo de maquiagem.

Depois de muita discussão, convenci Cora de aceitar o fato de que eu usaria o meu querido e confortável all star invés de saltos finos que encheriam meus pés de bolhas. O vestido já estava de bom tamanho.

— Vou te esperar lá embaixo — falei, cansada de ficar sentada na cama enquanto Cora dava, em suas palavras, os retoques finais.

Por Deus! Ela está enfurnada no banheiro há dois séculos.

Crossroad (EM REVISÃO) Onde as histórias ganham vida. Descobre agora