07 | Desafio

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"Você tira seus sapatos no banco de trás do meu carro

Minha camiseta fica tão bem quando está pendurada sobre suas costas

Ela disse: use suas mãos e o meu tempo livre"

— Sex, The 1975.

A paisagem virava borrões conforme mais velocidade o carro ganhava. O banco de trás era macio e o estofado cheirava a cigarro de hortelã. Sentei-me no banco, atraindo a atenção do moreno. Seus olhos encontraram os meus pelo retrovisor. Sentia o efeito do álcool ganhar forças conforme ele se espalhava pelo meu corpo, embriagando o mesmo.

— Por que bebeu desse jeito? — As palavras pareceram escapar de seus lábios, tornando os seus pensamentos audíveis.

Dei de ombros.

— Por que você se importa?

Foi a sua vez de dar de ombros, seus olhos focados na estrada agora.

— Na verdade, não me importo.

— A pergunta certa é: por que você não bebeu? Estávamos em uma festa.

— Festa não é sinônimo de alcoolismo.

— Mas é sinônimo de diversão — pontuei — Dá no mesmo.

Ele negou, um sorriso malicioso ganhando forma em seus lábios avermelhados.

— Ah, Docinho — seus olhos me encontraram pelo retrovisor outra vez quando o carro parou em uma sinaleira -, há outras formas de se divertir.

Revirei os olhos e, talvez pela quantia exagerada de álcool que corria em minhas veias, resolvi entrar no seu joguinho.

— Eu sei. Tenho alguns brinquedinhos que me auxiliam nisso — mordi o lábio inferior. — Mas eles não são muito eficazes.

Um brilho de diversão serpenteou seus olhos azuis, porém, antes que ele dissesse algo, uma buzina alta fez com que ele tivesse seus olhos voltados para frente outra vez, notando o sinal verde e acelerando.

— Você vai perder.

— O quê? — Perguntei, sem entender.

— Esse joguinho. Eu o jogo há muito tempo e, acredite em mim, eu sempre ganho.

Soltei uma risada amarga, aceitando seu desafio indiretamente proposto.

— Jogo? — Fingi confusão. — Eu não estou fazendo nada.

Uma alça do meu vestido fora escorregada pelo meu ombro, deixando, dessa forma, a pele do meu busto exposta. O cinza do vestido cintilando. Não demorou muito para que seus olhos fossem focados em mim outra vez, sua mão apertando o volante com força. Aproximei-me dele e deslizei minha mão pelo sua coxa coberta pela calça jeans preta.

— Você parece tenso — sussurrei, me esticando para alcançá-lo do banco de trás.

Uma de suas mãos saiu do volante para segurar a minha que, por sua vez, seguia em direção ao seu membro.

— Não me provoque se não for ir até o final — advertiu.

— Até o final eu não sei — soprei as palavras. — Mas se você pôr com jeitinho...

Ri, voltando a me deitar no banco de trás. Minha cabeça latejava e meu corpo implorava por descanso.

— Conseguiu se livrar da multa?

Ele arranhou a garganta, tentando se livrar da rouquidão em sua voz.

— O quê? — ele questionou, não querendo, de fato, saber sobre o que eu falava.

— A recepcionista...

Ah — mesmo não conseguindo ver seu rosto, eu sabia que o mesmo sorrisinho presunçoso de sempre perdurava seus lábios. — Essa foi fácil.

Balancei a cabeça negativamente, soltando um riso nasalado.

— Você é um babaca.

— Fico surpreso que consiga intitular as pessoas tão bem mesmo bêbada — ele ironizou.

Bufei.

— Eu precisava beber Hunter, eu...

— Estou te dando uma carona porque moramos no mesmo prédio, isso não é um convite pra que você se abra pra mim — ele me cortou. — Não estou nem aí, Alyssa.

Mil vezes babaca.

Era como se ele tentasse não se importar e, quando percebia que isso não estava acontecendo, tentava não demonstrar que estava se importando. Esconder sentimentos é ridículo, sejam eles quais forem. Então sim, um tremendo babaca.
Se importar com as pessoas é bem menos pior do que agir de forma rude.

O que há de errado em deixar as pessoas saberem que você tem um coração?

— Tem razão. Eu não me abriria pra você, de qualquer forma — respondi à altura.

Pois bem, Hunter, eu também sei ser rude.

— Você é incrivelmente insuportável.

— Fico surpresa que consiga intitular as pessoas tão bem mesmo tendo o cérebro do tamanho de uma azeitona — debochei.

Ele riu.

A verdade era que eu não sabia porque eu me irritava tão facilmente com suas alfinetadas e más respostas. Não éramos amigos, tampouco colegas, não existiam porquês para eu me afetar tanto com suas provocações. Talvez fosse o fato de eu saber que existia muito mais por trás de toda a sua pose de "eu não ligo para ninguém além de mim mesmo".

O carro fora estacionado em frente ao prédio e eu não hesitei em saltar do veículo, ficando de pé no solo que parecia balançar sob meus pés. Hunter saiu do carro logo depois, batendo a porta do mesmo com força. Seus olhos me analisaram atentamente, suas orbes escorregando pelo meu corpo em um estudo minucioso. Ele bufou, levando a mão até os olhos e os apertando com força enquanto chacoalhava a cabeça.

Dei às costas para ele, pronta para entrar no prédio, porém, me virei em sua direção uma última vez e disse:

— Aliás, Hunter, eu prefiro ficar por cima.

E então eu finalmente entrei no edifício.

Mesmo sendo impossível, já que uma grande quantia de álcool enchia meu corpo, eu me lembro perfeitamente dessa noite. Da noite em que eu resolvi te provocar de volta, jogando com você da mesma forma que você jogava comigo. Da noite em que eu me senti orgulhosa por conseguir surtir algum efeito em você, achando que você nunca conseguiria causar nenhum outro efeito em mim além da inegável atração.

Mas você tinha a droga de um coringa em mãos e blefava tão bem quanto um jogador de poker, Hunter.

Eu entrei nesse jogo de mãos vazias, querendo apostar todas as fichas inexistentes e, provavelmente, esse fora o meu segundo erro; apostar em um jogo onde a derrota já era garantida.

Crossroad (EM REVISÃO) Where stories live. Discover now