Road Kill

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Era com os faróis acesos que o carro encontrava seu caminho na escuridão. Já passaram das vinte e duas horas da noite, toda a faculdade Pendleton permanecia num silêncio mórbido. Talvez, pelas regras rígidas de "Nenhum estudante perambula por aí a noite, não no meu turno!" - dadas pela chefe de segurança do local, Reese, o motivo de a calmaria ser tão grande. O carro, como um rato discreto, um verdadeiro gatuno, percorria não rapidamente pelo trajeto de asfalto preto como breu que servia para traçar os caminhos de um prédio ao outro da faculdade, passando por entre eles. Estamos em Pendleton College, uma das mais prestigiadas instituições de ensino superior do estado de Ohio. A primavera que deixou a noite agradável, nem muito quente ou muito fria, era perfeita. O jovem motorista temia acelerar demais o carro enquanto passavam pelo amplo pátio, onde a única coisa que lhe permitia ver os grandes prédios antigos, que mais se pareciam com catedrais góticas à sua volta, eram as luzes dos postes que enfeitavam Pendleton, as mesmas luzes que revelavam as silhuetas das árvores espalhadas pelo gramado raso, exibindo suas sombras. O colégio, que parecia estar dentro de uma cúpula vivendo em seu próprio mundo, sendo sua própria "cidade" de certo modo, era uma barreira impenetrável ao mundo afora. Mas, isso não vinha ao caso, já que o problema, ainda desconhecido aos seus estudantes, estaria vindo de dentro. O jovem casal conversava dando risadas bobas comentando sobre o filme que acabaram de ver no cinema. O garoto que dirigia, não tinha mais que vinte anos. Jaqueta de couro, cabelo volumoso e de jeito simples. Seu nome é Carl, atento à sua volta, só para o caso de não haver nenhum membro da segurança pronto para confrontá-los com discursos intermináveis sobre como já está tarde e que isso não é hora de chegar. A menina no banco do passageiro, loira, solta e extrovertida, com QI acima da média é Genevieve, mais conhecida como Gigi, que volta e meia desviava sua atenção do celular para continuar o papo:

- Foi ridículo! Fala a verdade, Carl, admite. Você também acha que foi ridículo. -Sorriu em deboche, não acreditando na opinião de seu namorado sobre o filme que acabaram de assistir no cinema.

- Ah... -Mostrou-se indeciso ao expressar sua verdadeira opinião, jogando a cabeça para o lado, fazendo bico. Não entendia praticamente nada de cinema. Para ele, monstros gigantes e lutas bem encenadas já eram motivos de aplausos. - Não achei ridículo. Na verdade, fiquei até assustado.

- Ah.. Por favor. Um fantasma que brinca de cabra cega? Você deve estar me zoando.

- Afff... -Suspirou o rapaz. - Lá vamos nós de novo. O que há de errado desta vez, cinéfila, crítica de cinema, Gigi? -Terminou sarcástico, já esperando pelo sermão que a namorada fanática por filmes de terror costumava dar.

- Bem, pra começar, não zombe de mim. Estou tentando enfiar um pouco de cultura nessa sua cabeça.

Carl revirou os olhos discretamente ao ouvir o "Pra começar". Isso significava duas coisas. Primeira: Ela só estava começando, o que o lembra de longas, verdadeiramente longas discussões sobre filmes que ele não entende. E segunda: Que ela faria de tudo para convencê-lo, mesmo ele não estando por dentro de nada do que ela dizia, e que no fim de tudo não saberia opinar. Iria apenas acenar com a cabeça e fingir que concordou com toda a ladainha.

- Vamos ver... -Pigarreou a mocinha, como uma verdadeira professora, pronta para ensinar o aluno mais burro da classe. - Assistimos "Invocação do Mal", que, supostamente é baseado numa história real. Coisa que eu não engoli por nem um segundo. E sabe por quê?

- Por quê? -Indagou em tom desmotivado, ainda que tentando disfarçar seu desinteresse.

- Olha só... Não teve nada de novo naquela birosca. Para falar a verdade, foi o filme de terror mais clichê o possível! Uma família se muda para uma casa assombrada. Tem cem filmes assim, mas este não é exatamente um problema, até porque isso não é um clichê, é uma fórmula e subgêneros costumam ter sua própria fórmula. O que me deixou com raiva foram os clichês, as tentativas bobas em que a narrativa tentava criar surpresas, surpresas essas que não funcionam porque a gente consegue ver elas vindo a quilômetros. Sem contar das "Tropas" do terror que se apresentaram ali batendo continência e tudo, não oferecendo nada de novo. A criança é a primeira a notar coisas estranhas e logo vira brinquedinho da assombração, de novo, tem cem filmes assim. Depois, o filme começa a apelar pra um drama familiar pra dizer "Sim, esse roteiro tem coração, não é só um filme de terror", coisa que, de novo, todo santo filme de casa assombrada tenta fazer e pra falar a verdade, quando o povo sai do cinema nem se lembra do nome da família. Eram os Smith ou os Fellers? Viu? Ninguém se importa, por mais que eles tentem. Depois, temos a cena do fantasma brincando de cabra cega... Patético. E falando nisso, esses fantasmas que ficavam pulando toda hora na frente da câmera só pra dar um susto com barulho alto, isso era só para evitar que o público dormisse durante a sessão? Tipo, os vilões em qualquer história, não só de terror, tem que oferecer uma ameaça aos protagonistas. E qual a ameaça que esses fantasmas oferecem? Eles só aparecem do nada e assustam. Qual o objetivo? Eu tenho que ter medo deles só porque são fantasmas? Se não há ameaça verdadeira, não há o porque de se preocupar. Lá pro final, até teve uma tentativa de criar uma ameaça, mas o problema foi resolvido tão facilmente que faz até a gente questionar se a assombração do filme sequer tirou "Diploma" na escolinha do terror. E eu detesto essa mania que o terror sobrenatural tem de sempre apelar pro gospel. Parece até sessão de descarrego de igreja evangélica, não há surpresas nem criatividade, tudo sempre acaba em reza ou oração. Que isso? Terror gospel? Respeitem "O Exorcista", gente. Ah, tenha dó. Outra coisa, é que as primeiras atividades paranormais vinham todas do closet do quarto da menininha... Ahm, hello??? Nunca viram POLTERGEIST - O FENÔMENO? Chega de closet assombrado gente, cansou. POLTERGEIST fez isso primeiro e foi ótimo, mas depois dele.. A coisa só ficou cansativa com tantos filmes tentando imitar. Sem contar o plágio né, porque de criatividade, esse filme não teve é nada. Sabe aquela cena em que aparece o fantasma de uma mulher com os pulsos cortados gritando: '"Olha só o que fulano me fez fazer!!", então, no filme "O SEXTO SENTIDO", que aliás é um ÓTIMO filme de terror, você devia ver, tem uma cena IGUALZINHA onde um fantasma de uma mulher aparece do mesmo jeito, com os pulsos cortados e tudo, gritando a MESMÍSSIMA frase! Sério, isso é plágio cara! E depois, a entidade lá quer possuir a mãe da família, sobe em cima dela na cama e vomita um treco nojento na boca dela e pronto, ela começa a manifestar a "Possessão". Desculpe, mas aquela cena foi OBVIAMENTE copiada de "Arraste-me Para o Inferno" há uma cena igual lá e a mesma coisa acontece com a personagem, que até começa a apanhar do demônio no filme. Gente, criatividade zero e ainda tem gente que vai ficar apavorada acreditando que essa coisinha mequetrefe foi um caso real? Sem contar que, tem tantos fantasmas no filme, sem motivo algum. Para que tinha o fantasma daquele garotinho? Para que tinha o fantasma daquela senhora de pulsos cortados? Pra que tinha aquela gorda mal maquiada no ato final? Para nada! Eu te falo o porque, só pra poder dar um susto besta no público... Aqueles fantasmas não servem de nada para a história e estão lá só pra assustar as adolescentes que vão histéricas para o cinema, Jesus Cristo.. Tem outras cenas ali que também foram copiadas de outros filmes, um deles é "A Casa das Almas Perdidas", dos anos noventa, se você assistir aquilo, vai ver o tamanho da cara de pau de "Invocação do Mal". Tem outros filmes também que ele copiou mas se eu falar todos, vou passar a noite aqui nesse carro com você.

Scream - Survival 2Where stories live. Discover now