38 Rendição

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Luca

Fiquei anestesiado, como se tudo fizesse finalmente sentido. Fechei os olhos. Enrico...

Andei pela casa quase sem sentir meus pés no chão. Desci para a areia, me sentei ali, apertando o celular entre os dedos.

Como eu não conseguia me lembrar? Como era possível?

⸻ Luca, está ouvindo? ⸻ ouvi a voz de Beatriz.

Apertei os olhos. Não sabia há quanto tempo estava ali, não sabia se conseguiria falar se eu precisasse.

⸻ Gi... ⸻ ouvi sua voz aflita.
E em seguida, meu celular começou a tocar.

Olhei do mar para a tela dele, a foto de minha Brasiliana ali. Linda... Perfeita, como se nem fosse de verdade.

Atendi colocando o aparelho em viva-voz para continuar olhando para ela.

⸻ Luca... Amor, você está bem? Fala comigo.

Engoli em seco ⸻ Beatriz... Você está... Segura?

Ouvi seu suspiro de alívio do outro lado da linha ⸻ Eu estou bem, amor, Gi me escondeu na igreja. Aconteceu o que você disse, tem uma guerra aqui.

⸻ Onde estão todos?

⸻ Deixei Rafaella no salão da igreja, Enrico e seu pai estavam no meio da multidão, eles não irão até aí. Assim que as ruas se acalmarem, eu volto para te ver, tá bom?

Ouvi sirenes de polícia ao fundo, ouvi gritos e o que pareciam ser tiros.

⸻ Giacomo. ⸻ falei quase em desespero. ⸻ Proteja Beatriz por mim. Não a deixe até que tudo se resolva.

⸻ Tem minha palavra, Luca.

⸻ Amor, fica em casa, eu já estou indo, tá?

Senti meu peito se apertar ⸻ Eu te amo... Bea. ⸻ sorri levemente por usar aquele apelido idiota, e desliguei.

Me levantei para tomar o caminho de volta para casa, mas antes de entrar, vi faróis ao longe, descendo em direção a minha casa. Esperei ainda na areia, antes de subir.

Vi meu pai descendo do carro que ele nunca costumava dirigir, imediatamente, meus olhos foram para suas mãos, senti minha espinha gelar achando que ele pudesse estar armado. Depois de tudo o que houve, não seria estranho ele tentar me matar. Eu havia destruído tudo o que ele construiu a vida toda, em uma única noite. E daquela vez, era mesmo o fim, e até ele sabia.

Ele ergueu as mãos se aproximando devagar, vendo minha postura acuada.

⸻ O que o senhor quer aqui? ⸻ perguntei trêmulo.

Ele continuou caminhando para mim, e instintivamente dei passos para trás.

⸻ Está tudo acabado, Luca... Seu irmão está morto, Rafaella... Não sei dizer... ⸻ disse chorando. ⸻ Saquearam nossa casa, nosso templo...

⸻ Sua casa, seu templo! Ou se esqueceu que disse com todas as letras, que nada daquilo me pertencia mais?

⸻ Você fez tudo isso... Você... em tão pouco tempo...⸻ ele baixou a cabeça e sorriu. O medo daquele sorriso gelou minha espinha. ⸻ Você é um verdadeiro Donatti.

⸻ Não! Eu não sou, o senhor sabe que nunca me encaixei nessa família. Eu nunca concordei com o que vocês faziam, e não só comigo, com todos ao redor de vocês! Voltar para cá só me fez ver o quanto tenho nojo de vocês.

Ele se aproximou ainda mais, mas desviou seu olhar para o bangalô como se não tivesse me ouvido. ⸻ Esse era o lugar favorito do mundo para a sua mãe... Ela passou praticamente a sua gravidez inteira aqui. Ela devia saber que era a melhor forma de gerar um filho... Longe de nós. Você nasceu portando toda a bondade e a gentileza de sua mãe... Enquanto Enrico puxou toda a parte ruim de mim.
Eu sei que é tarde demais para reconhecer o meu erro, para dizer que eu nunca o tive como filho... Eu nunca te conheci de verdade...

Infame Where stories live. Discover now