Tini

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Jamie passava uma toalha molhada por entre os machucados que cobriam grande parte do meu corpo, o choque do tecido gelado com a minha pele me fazia arrepiar.  A toalha passou de uma cor branca marfim para um vermelho claro, resultado do sangue que vinha dos hematomas. Mantive o saco de gelo no meu rosto que ainda ardia pelos tapas depositados nele, o corte na minha boca estava formigando com o toque frio do gelo. Consegui parar de chorar por um tempo, mas as lágrimas sempre voltavam. Eu estava morrendo de medo.

O dia iria clarear logo, da poltrona central na sala de Jamie eu podia ver os raios invadir seu apartamento, mas era um amanhecer violento. Tudo o que havia na minha cabeça eram flashbacks da noite passada, quando as coisas realmente desandaram. Me sinto culpada por ter deixado as coisas chegarem tão  longe, sinto raiva de mim mesma por não ter sido forte o suficiente. Sentia ainda mais raiva de ninguém ter percebido o quanto eu estava definhando. Eu morri milhões de vezes nos últimos meses e ninguém notou. Nenhuma bendita alma me viu desmoronar. Quem tem esses amigos precisa de inimigos?

— a gente devia ir na delegacia? - o garoto finalmente abre a boca.

— por que? Eles não podem me ajudar. - digo com o último fino de voz que me restou.

— como assim Martina? Temos que denunciar esse covarde.

— lembra da Kesha? - começo. —Ela foi abusada não só psicologicamente, como também sexualmente pelo seu empresário. O tribunal decretou que ela deveria continuar trabalhando com ele. Johnny Depp espancou a Amber e mesmo com as provas ele foi inocentado, além de não só colocar os fãs contra ela mas como também fez parecer que ela era culpada. - continuo. — Não vamos esquecer do Chris Brown que não só saiu impune como faz sucesso até hoje. É muito fácil dizer para uma mulher que ela deve denunciar seu agressor, mas eu sei que vou ser questionada por diversas pessoas e vou ser crucificada só porque sou uma mulher.

— eu sinto muito Tini. - sinto as lágrimas descerem novamente, era algo incontrolável.

— eu também sinto Jamie, ainda mais por nenhum de vocês terem notado. - ele me abraça como um pedido de desculpas, não sei se estou pronta para perdoar mas ele é o único estendendo sua mão para mim. Estive no chão por tanto tempo que preciso de ajuda.

— o que eu posso fazer para te ajudar? - ele pergunta

Eu peço para o mesmo ir até a residência dos Holland pegar algumas trocas de roupas, não seria algo difícil já que não desfiz minha mala. Implorei para ele não contar nada e nem mencionar aonde eu estava e o porque deu ter desaparecido tão de repente. Era melhor fazer parecer que era só um drama da menina que quer chamar a atenção, eles ultimamente só me viam assim, isso quando me viam. Na maior parte do tempo eu era invisível. Eles eram tão culpados quanto James por eu chegar a esse estado, estou machucada fisicamente e mentalmente por ambos os lados.

Retiro minha roupa rasgada e ensaguentada, jogando-a no pequeno cesto de roupas que ficava em um canto do extenso banheiro. Abro a ducha, e o vapor sobe instantâneamente, indicando o grau da temperatura da água. Para mim estava ideal. A água quente desce meu corpo nu queimando toda a pele morta que restou, os ferimentos doem a medida que o líquido passa por eles mas não me importo, estava anestesiada pela dor interna. O coração partido doía ainda mais. Me sentia extremamente irrelevante para todo o mundo, o vazio tinha sido minha única companhia e de certa forma eu pertencia a ele.

Fora do banho visto uma blusa qualquer do guarda roupa de Jamie, sei que ele não vai se importar. Afinal ele era como minha melhor amiga, só que no corpo de um homem gay. Sua casa foi o primeiro lugar para onde pensei em vir depois do ocorrido, não pela distância apesar desse fato ter ajudado, mas pela amizade que tínhamos de bem antes da fama. O conheço desde criança, fui eu que o ajudei a sair do armário para a família. Fui sua primeira namorada quando ele fingia ser hétero, óbvio que era um romance fake mas me sentia bem em poder ajudar. Foi a minha pior atuação, confesso, mas eles não duvidaram em nenhum momento. Por isso sabia que ele não viraria as costas para mim nesse momento.

Deito no enorme estofado cinza que cobre grande parte da sala, fecho meus olhos para descansar um pouco já que teria que ter muita energia e disposição para enfrentar a grande calamidade que estava prestes a chegar. Mas quando finalmente relaxo no sofá, com a mente composta apenas por pensamentos positivos, ouço batidas fortes vindas da porta. Não parecia só um visitante, era como se a pessoa quisesse literalmente invadir o lugar.

—Martina eu sei que está aí. - era James, sua voz de ódio me faz pular do sofá. De repente estou encolhida no chão, na tentativa falha de me esconder. — ABRA ESSA PORTA AGORA!!! - sentia um grande terror escutar aquela maldita voz de novo, saber que ele estava á metros de mim me deixava apavorada. James gritava alto em um tom de ordem. — Martina não me faça arrebentar essa porta!

Eu não digo nada, não queria dar a ele a conclusão definitiva de que estava aqui. Apesar deu não saber como ele me encontrou. Estava perdida, não me restava nenhum segundo de paz. Quando pensava que tudo tinha se aliviado, ele voltava. Cruel. Sedento por outra briga, outra chance dele provar para si mesmo que estava no controle.

— Martina Camilo eu não vou pedir de novo. - ele chama meu nome diversas vezes antes de ser interrompido por uma outra voz, também conhecida por mim.

— é melhor o senhor ir embora. - a voz está abafada mas a reconheço, era Albert o porteiro do prédio. — Já chamei os seguranças, você está atrapalhando a ordem dos moradores.

— eu só vou embora depois que essa vadia falar comigo. Tá escutando Martina? - ele grita novamente.

— não tem ninguém aqui com esse nome, esse apê é do senhor Jamie Star.

— eu sei que o viadinho mora aqui, por isso sei que ela veio para cá. - o garoto é nojento e preconceituoso em suas palavras. O que eu vi nele, Jesus?

— se o senhor não for embora agora eu vou chamar a polícia para te acompanhar. - Albert ameaça.

— Okay, eu vou. Mas escuta bem Tini, eu vou voltar. E torça para eu não te encontrar pois dessa vez vou tirar bem mais do que sangue do seu rosto. Te prometo. - sua promessa é selada com sua saída, ouço o elevador chegar no nosso andar e respiro aliviada por ele ter ido embora.

— tá tudo bem, senhorita Camilo? - Albert pergunta se aproximando da porta.

— sim Albert, obrigada.

— conte sempre comigo. - ele diz.

F.R.I.E.N.D.S - Tom HollandWhere stories live. Discover now