Dez

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    Ali, caminhando para a morte eu me senti forte mas oco, uma força que pedia para sair pelas veias e músculos, me senti pronto e meu espírito se elevou, eu já não sou mais um garoto órfão assustado, me chame de Vênus.
      
                                ***

  Minha mala está sobre a cama, Lucas fingiu que eu não existia a manhã inteira, na verdade a escola toda fingiu, talvez isso faça parte desse ritual esquisito, mas isso me cansou.
Pego minhas malas e saio do quarto, todos estão na aula, e tenho vantagem.
Os corredores parecem mais longos e as escadas mais cansativas, mas logo chego a porta, e sem cerimônias, abro a mesma sentindo o frio daquela manhã.

— Aonde pensa que vai?— Erick segura meu braço me puxando para dentro com força me fazendo cair e um eco percorrer a escola.

— Para o inferno, quer carona?— Assim que termino, Erick se joga encima de mim e se prepara para o soco, para minha sorte, Kira surge gritando para que Erick pare, logo os alunos começam a surgir fugindo das salas para ver a confusão.

— Isso não vai trazê-la de volta.—  Lucas puxa Erick de cima de mim, maz ele ainda quer meu sangue.

— Você diz como se fosse culpa minha.— Digo me levantando.

— Mas é.— Erick exclama ainda imobilizado por Lucas.

— Não! Não é.— Digo olhando ao redor e vendo a roda de alunos formada ali.— É culpa do Henrique, ele a matou, eu não estava aqui e caso não saibam, vocês são todos cúmplices, apoiam essa merda, como se fosse normal, veneram um monstro doente, respeitam alguém que não merece ser respeitado.— esclamei para toda a escola.
— Você não tem que ter raiva de mim, eu não a matei, não me culpe por seus erros Erick.— Disse agora mais perto do rosto de Erick.— Você matou sua irmã, e não quer aceitar isso.—

Um grito rasgante saiu da garganta de Erick, seus olhos soltaram as lágrimas que ele segurava e ele fez força para se soltar de Lucas, seu corpo novamente estava sobre o meu.

— Você não sabe de nada!— Erick gritou encima de mim segurando meus braços esticados.

— Solte-o agora Erick — Na escada, Henrique disse escorado com os cotovelos no corrimão, minha tia estava bem ao seu lado, com a cara fechada e o nariz em pé, ela não manda aqui, e nem se importa com isso.

Erick me olha mais uma vez, como um aviso de que aquilo não acabou e se levanta saindo dali.

Saio do chão e pego minha mala e minha mochila velha, logo os alunos se dissipam voltando para as suas salas, vou em direcão a porta e apenas a abro.

— Você não vai embora.— Sinto a voz de Henrique atrás de mim e sua respiração batendo em meu pescoço.

— Você não pode me empedir, não sou como os outros, você não pode ameaçar tirar minha vida, por que eu não tenho medo de morrer.— Me viro e encaro Henrique nos olhos, mas ele não se sente afetado e isso me assusta, ele com toda certeza tem um plano.

— Você não tem medo da morte Vênus, mas tem empatia, sofreu por uma garota morta que você nem conhecia, imagine oque vai sofrer caso Kira, Lucas ou Jonathan morram por sua ignorância.— Henrique sorriu, e minhas orelhas queimaram.
Meu coração acelerou e meus olhos arderam, Henrique jogou sua semente maligna em mim agora ela vai crescer rasgando tudo por dentro.

Ele se virou e me deixoi ali, sozinho com meus ecos sombrios.

Não posso deixá-los aqui, se alguma coisa acontecer vai ser culpa minha, mesmo que eu negue e tente culpar Henrique, não posso deixa-los só.

Devagar, caminhei para o meu quarto novamente, hoje eu não vou a aula, não estou bem para isso, ontem eu pensaria que minha tia viria me encorajar a mudar de vida, mas ela é o contrário do que pensei que ela fosse.

Fiquei deitado, por horas até o sinal do almoço, coloquei os fones e desci, alguns alunos aproveitam para comer nos quartos, outros ficam no refeitório, Henrique está rodeado por Kira, Lucas, Jonathan e a loira que persegue o mesmo como uma sombra, ela está agarrada em seu braço e sua cabeça está no ombro dele.

Encaro Henrique que não disfarça o ânimo maligno de me ver ainda aqui.
Caminho até ele e ignoro todos a sua volta.

— Preciso falar com você.— Ele está com uma maçã na mão, e a faz passar de uma para outra, até morder a mesma com vontade assim que eu termino de falar.

— Vênus!— Jonathan exclama se levantando ao me notar bem ali, em pé ao seu lado.— Achei que tivesse ido embora.— Ele logo se arrepende de sua atitude ao perceber que todos na mesa o olham com estranhesa.

— Podemos conversar?— falo novamente para Henrique, que se levanta.

— Agiu bem Vênus, agiu bem.— Ele cochicha quando passa ao meu lado e eu o sigo.

Ele caminha a minha frente, está com um colete preto jeans e sem camisa, percebo que trocou de roupa pois não é a mesma que ele usava quando nos falamos pela última vez, está com uma calça junguer de couro também preta e vanz xadrez.
O observo, e percebo três pequenas gotas de sangue um pouco abaixo do seu cotovelo, tremo mas continuo seguindo.

Subimos as escadas mas viramos á esquerda, ao invés da direita que é onde fica meu quarto, ele caminha um pouco e vira de novo, só que para a direita, as luzes daqui são iguais, o clima é o mesmo amarelo, mas as portas desse último corredor, são todas pretas, e todas começam com 0.
Henrique entra na 3, com um 03 em prata e maçaneta da mesma cor.

Henrique tira uma pequena chave do bolso com um chaveiro de adaga com uma pequena pedra vermelha e brilhante, ele encaixa a chave a vira lentamente fazendo com que a porta se abra.
Há uma cama de casal na parede a esquerda, a minha frente há uma janela e uma cortina de tecido duplo branca e cinza, há um abajur ao lado da cama e um guarda roupas na parede enfrente a cama, uma porta de madeira ao lado guarda roupa e um tapete branco no chão.

Ele foi até a cama e pegou o mesmo papel de ontem, me entregando junto com uma caneta.

— Assine.— Disse me entregando.— Pode usar a mesa.— Ele apontou para a mesa perto da janela.

Coloquei a folha sobre a pequena mesa de madeira e senti minhas mãos tremerem.

"Entrego meu corpo e minha vida, me responsabilizando pela dor e por minha morte, caso ela aconteça. Prometo seguir as regras impostas por meu governante e pelo governante do meu clã, seja ele: Terra, Água, Sangue ou Fogo."

Apenas isso, apenas essa pequena frase e um espaço para minha assinatura, nada mais.

— Pode assinar.—Henque disse enquanto eu lia repetidas vezes aquele pequeno texto.

A caneta dançou rabiscando o papel em branco, o esboço trêmulo do meu nome, surgiu aos poucos no papel e em poucos segundos, senti que já não era mais o mesmo.
Arranquei minhas vestes e me lançei sobre as rochas, renascendo como uma Fênix em chamas.

Me Chame De Vênus Where stories live. Discover now