Capítulo 11

200 30 1
                                    

Ontem foi a primeira vez que eu me abri com alguém, com Fynn, mais especificamente. Contei pra ele minhas dores de cabeça, como parece que tem árvores crescendo dentro dos meus pulmões e é por isso que não consigo respirar direito. Contei como a minha alma amarela foi pintada cruelmente de roxa, como eu não consigo espantar os morcegos que ficam voando no meu coração e como eu sinto minha pele descascando. Disse pouco, porque é difícil descrever as coisas que eu sinto sem deixar as pessoas perdidas. Elas não entendem.
Fynn não disse nada, ele apenas me ofereceu seu ombro quando eu comecei a chorar e ficamos naquilo até meu choro sumir aos poucos e tudo que restasse no quarto fosse silêncio. E, quando o silêncio chegou, ele foi embora. Mas eu estava me sentindo bem, agora eu não sei como me sinto. Questiono se foi mesmo uma boa decisão contar à ele, desabafar com ele, ou melhor, desabar na frente dos seus olhos.
Eu só não contei para Fynn que na noite em que ele me ligou, eu estava preste a meter uma bala na minha cabeça.
E, falando nele, o avisto de longe porque vocês sabem, ele é gigante. Quando me aproximo mais, vejo que ele não está sozinho. Fynn está conversando com uma garota que eu nunca vi na vida e ela era bonita. Quer dizer, se o padrão de beleza é bonito pra você então ela é incrível. Cachos loiros, olhos azuis, pele branca e belas pernas de fora da saia. Uma Barbie. Bem, quem sou eu pra falar alguma coisa? Minha aparência é um completo desastre.
Fico parado observando e no tempo em que faço isso, sem conseguir entender sobre o que estavam conversando, lembro-me que Fynn é bissexual e isso me faz começar a ficar incomodado com a conversar, porque eu estou disposto a corresponder os sentimentos de Fynn mas eu disse que não estava. E, talvez eu não esteja, porque mesmo que eu queira, não posso. Como eu vou amar alguém e como alguém vai me amar se eu não amo a mim mesmo?
Quando a garota Barbie finalmente vai embora eu me aproximo.

— Quem era aquela? — pergunto e me arrependo imediatamente. Era para ter soado como uma pergunta normal mas saiu soando em um tom raivoso. Eu não acredito que estou sentindo ciúmes.

— Lily — ele respondeu, como se não tivesse notado meu tom de voz e eu espero que realmente não tenha notado. — Temos um trabalho de biologia pra fazer juntos.

Ah, é claro, um trabalho. É assim que todo romance bom e clichê começa. O mocinho e a mocinha são obrigados a fazerem um trabalho juntos e no meio do processo eles vão se conhecendo melhor e acabam se apaixonando. E aí, chega a entrega do trabalho mas eles continuam andado juntos, até rolar o primeiro beijo. Depois vem o pedido de namoro e alguns anos mais tarde estarão casadas com belos filhos. E eu? Bem, eu vou ficar para trás porque a minha vida se resume em ficar para trás, ficar por último e ser deixado no escuro.

— Você já está se sentindo melhor? — Fynn perguntou, me tirando daqueles pensamentos um tanto deprimentes.
Balancei a cabeça em um sim rápido e o sinal tocou. Quando tocou, apenas sai sem me despedir.
Eu queria nunca ter atendido aquela ligação, ter respondido aquele "alô?" ou se quer aceitado o convite pro baile idiota.

Observei Lily, que eu prefiro chamar de garota Barbie se sentando no lugar onde eu costumo sentar no Fiat vermelho de Fynn. E então, ele deu partida e saiu do estacionamento da escola. Provavelmente eles estão indo fazer o tal trabalho.
Dei meia volta e sai do estacionamento. Não me ache tão ciumento, ou coisa assim, é que Fynn sempre me oferece uma carona. Bem, de qualquer forma, eu não acho que ia gostar de entrar no carro com eles dois e quando Fynn estacionasse na frente do meu apertamento e eu tivesse que descer e saber que o próximo rumo era que eles dois iriam ficar juntos o dia todo. Eu sei, é só um trabalho e a vida não é um filme clichê, eles não vão se apaixonar por causa de um maldito trabalho escolar mas eu acho que vão sim, porque eu sempre penso no pior. Você já me viu sendo positivo?
Não, eu não acho que posso ser melhor que ela, eu acho que sou pior que ela, em tudo, literalmente. Na verdade, eu acho que sou pior que todo mundo, resumidamente, me vejo como um erro, como uma mancha suja em um lugar todo branco e sujo. Eu só simplesmente não deveria estar aqui.
Parei de caminhar e olhei em volta, tinha várias pessoas andando pelo corredor. Alunos da manhã indo para suas casas e alguns alunos da tarde que tinham acabado de chegar. Nenhum deles está prestando atenção em mim mas eu sinto que estão, e eles não estão pensando coisas boas. Acelero o passo porque sinto uma enorme vontade de chorar, e eu não choro na frente de ninguém, só na frente de Fynn porque ele me abriu.
Talvez eu o ame um pouco, mas isso realmente importa? Não posso deixa-ló se aproximar porque se não ele vai cair nesse poço e ele não merece. Talvez ele mereça aquela garota que se parece com a Barbie, porque ela é bonita, parece não ter nenhum problema, apesar de eu saber que todo mundo carrega um peso nas costas, o peso do mundo, no caso, e ele pode te esmagar. Quando eu descobri que o mundo podia esmagar alguém? Quando ele me esmagou.

Alô?Where stories live. Discover now